Aquecimento global aumenta risco de novas epidemias

Devido à elevação da temperatura no Ártico, bactérias e vírus de milhões de anos atrás podem ser libertados dos solos permanentemente congelados.

Foto: Roxanne Desgagnes/Unsplash

A história da civilização humana, pelo menos da perspectiva ocidental europeia que se consolidou ao longo dos séculos por meio da colonização em outros continentes, é uma trajetória de conflito com a natureza. O ímpeto em transformar o desconhecido em algo que possa ser controlado e monetizado avança indiferente aos sinais que o planeta manifesta de perigo. O risco de novas epidemias ligadas ao aquecimento global preocupa cientistas.

Até agora, as evidências apontam para o surgimento do novo coronavírus relacionado a mutação do vírus em um morcego. Outras epidemias poderiam surgir a partir de animais, que são hospedeiros de vírus e bactérias desconhecidos da ciência. As mudanças climáticas desempenham um papel importante no processo, pois, devido ao aumento de temperatura no mundo, elas provocam deslocamento de mosquitos portadores da malária ou da dengue, e o início do degelo permafrost. O permafrost é o tipo de solo encontrado na região do Ártico, constituído por terra, gelo e rochas permanentemente congelados, onde micróbios de outras épocas estão conservados.

“Nosso maior inimigo é nossa própria ignorância, porque a natureza está cheia de microorganismos”, disse à AFP Birgitta Evengard, microbiologista da Universidade de Umea, na Suécia. “Uma verdadeira caixa de pandora”, completou a respeito do permafrost.

Os especialistas no assunto da ONU (Giec) preveem que até 2100 uma parte considerável do território permanentemente congelado pode derreter e liberar dezenas ou centenas de bilhões de gás de efeito estudo.

Em algumas regiões, neandertais, mamutes e rinocerontes encontram-se no degelo. Sem conhecer a data e o motivo precisos da morte, um eventual vírus que causou problemas pode voltar a circular. Não há uma estimativa do número de bactérias ou vírus e a preocupação maior dos cientistas é saber se eles podem de fato prejudicar a saúde humana. Nesse ponto, os pesquisadores estão divididos.

Para Birgitta Evengard, a possibilidade é real. “O antraz prova que uma bactéria pode dormir no permafrost por centenas de anos e ser revivida”. Em 2016, na Sibéria, uma criança morreu vítima de antraz mesmo essa bactéria tendo desaparecido da região há 75 anos. O contágio normalmente é por meio de contato com animais contaminados, mas também pode ser transmitido por inalação.  

É possível que outros patógenos conhecidos, como os vírus da gripe de 1917 ou da varíola, também estejam nos cemitérios árticos onde as vítimas de epidemias passadas foram sepultadas nas camadas de gelo.

O progresso da degradação da natureza e o consequente aumento das temperaturas deve derreter camadas cada vez mais profundas, que chegam até a 2 milhões de anos. Obviamente, as informações sobre o período e potenciais patógenos são praticamente inexistentes e seria uma aposta arriscada ignorar a possibilidade do ressurgimento de alguma doença.

Em agosto de 2020, um rinoceronte lanudo que viveu cerca de 12 mil anos atrás foi encontrado na Sibéria, na região de extração de diamantes Yakutia. Os cientistas ficaram impressionados com o estado de conservação do animal, que tivera todos os órgãos e as partes delicadas – como a presa e a lã- preservadas pelo gelo.

A região siberiana da Rússia está revelando com regularidade crescente novas descobertas nesse sentido. À medida que as temperaturas sobem no Ártico em um ritmo mais rápido que o resto do mundo, grandes regiões bloqueadas há muito tempo pelo gelo permanente derretem.

Doenças tropicais

Não apenas vírus passados podem se beneficiar do aquecimento global. Nos últimos anos, o Centro Europeu de Prevenção e Doenças (ECDC) identificou cerca de 40 casos de dengue entre 2010 e 2019, dois casos de zika na França em 2009 e centenas de chikungunya entre 2007 e 2017.

A epidemiologista da Universidade de Liverpool, Cyril Caminade, acredita que o aquecimento global está favorecendo alguns vírus por proporcionar “condições de temperatura para que o patógeno possa se reproduzir no mosquito”.

Com informações de Exame e CNN

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