Paralisação da reforma agrária deve gerar reintegrações e despejos

Governo Bolsonaro admite ao STF paralisia da reforma agrária, com acúmulo de recordes negativos. Segundo Ademir de Lucas, há 413 processos paralisados no Incra. “Eram processos de desapropriação, que já estavam encaminhados para a Justiça e às vezes em negociação com os proprietários das terras”

O governo zerou a edição de decretos de desapropriação e fez a menor aquisição de terras com essa finalidade desde 1995 – Foto: Codevasf/CC

Em fevereiro de 2021, o governo admitiu ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma paralisia do processo de reforma agrária. As informações do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), órgão responsável pela reforma, indicam que o governo zerou a edição de decretos de desapropriação e fez a menor aquisição de terras com essa finalidade desde 1995. Nunca houve um orçamento tão baixo para aquisição de terras, de acordo com dados registrados a partir de 2011. 

Ademir de Lucas, técnico superior do Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Esalq, que trabalha há 30 anos com agricultura familiar, afirma que Jair Bolsonaro discursava contra a reforma agrária já em pré-campanha. No primeiro mês de mandato, Bolsonaro decretou a suspensão da reforma agrária, mas recuou após repercussão negativa. Entretanto, em março de 2019, o presidente suspendeu as vistorias de terra, o que travou todo o processo das reformas.

Reforma agrária no Brasil

Segundo Lucas, há 413 processos paralisados no Incra. “Eram processos de desapropriação, que já estavam encaminhados para a Justiça e às vezes em negociação com os proprietários das terras”, comenta o técnico. “Quando esses processos foram suspensos, os proprietários passaram a requerer a reintegração de posse dos imóveis e o despejo das famílias que estavam lá”, acrescenta.

A pandemia de covid-19 evitou que muitas famílias fossem desalojadas, mas Lucas afirma que o despejo “é uma questão de tempo”. O técnico também comenta que a reforma agrária é dever do Estado, já que está prevista na Constituição. O Ministério Público Federal investiga o Incra por omissão devido à redução de 90% no orçamento do instituto. A denúncia está em julgamento no STF e pode fazer com que a União seja obrigada a retomar os 413 processos paralisados. Dessa forma, uma decisão da Justiça pode ser a luz no fim do túnel para essas famílias, que vivem em situação precária.

Mobilização da sociedade

Ademir de Lucas ressalta que os responsáveis pela reforma agrária são pessoas com interesses ruralistas, declaradamente contrários à reforma. Por isso, é necessário que haja mobilização da sociedade para defender um processo importante. “Quando o assentamento se estrutura, ele realmente contribui para o desenvolvimento econômico regional e local”, finaliza. 

Edição de entrevista à Rádio USP

Autor