Governo Bolsonaro deixa Brasil sob desconfiança na Cúpula do Clima

País tem retrocessos nas áreas ambientais e governo pede ajuda internacional para cumprir metas

Bolsonaro despreza defesa do meio ambiente - Reprodução da internet

O governo Bolsonaro, após dois anos de desmonte da infraestrutura e com piora nos indicadores de proteção ambiental, pede ajuda internacional de US$ 10 bilhões para acabar com a emissão de carbono até 2050. O assunto será debatido na Cúpula de Líderes sobre o Clima, nos dias 22 e 23 de abril, por 40 chefes de Estado.

A iniciativa da cúpula é do presidente americano Joe Biden, que prometeu durante a campanha eleitoral nos Estados Unidos diminuir emissões de carbono e promoção da “economia verde”. Após assumir a presidência, Biden enviou uma carta a Bolsonaro em 26 de fevereiro cobrando um compromisso maior do governo brasileiro com a proteção ao meio ambiente antes da realização da cúpula.

O site O Globo teve acesso a resposta de Bolsonaro enviada à Casa Branca na última sexta-feira (16). “Queremos reafirmar nesse ato, em inequívoco apoio aos esforços empreendidos por V. Excelência, o nosso compromisso em eliminar o desmatamento ilegal no Brasil até 2030”, escreve Bolsonaro, dizendo que a meta depende de “recursos vultosos e políticas públicas abrangentes”, o que obriga o Brasil a contar com “todo apoio possível, tanto da comunidade internacional, quanto de Governos, do setor privado, da sociedade civil e de todos os que comungam desse nobre objetivo.”

A possibilidade de acordo entre governos sem prévia consulta à sociedade civil foi criticada por povos indígenas, parlamentares brasileiros, ONGs e congressistas americanos. Com base em dados, cortes nos orçamentos e alterações de normas, os movimentos questionam a capacidade do governo Bolsonaro em promover a preservação ambiental.

A decepção internacional com a atuação do Brasil na preservação do meio ambiente levou à exclusão do país da cerimônia no final do ano passado em homenagem aos cinco anos do Acordo de Paris. O evento contou com 80 chefes de Estado e o Itamaraty ainda tentou incluir o Brasil, mas não foi atendido.

Na Cúpula de Líderes sobre o Clima, nos dias 22 e 23 de abril, o governo pretende apresentar o Plano Amazônia 2021/2022, que estipula a taxa de desmatamento de 8,7 mil km² ao final de 2022. Sem informar orçamento e pessoal necessário, o valor é 16% superior à meta estipulada em 2018, antes da posse de Jair Bolsonaro.

Os recursos destinados à preservação ambiental minguaram no governo Bolsonaro. O orçamento do Ministério do Meio Ambiente (MMA) previsto para 2021 é o menor desde o início do século. O Ibama e o ICMBio, essenciais para fiscalização e ações de combate ao desmatamento, também sofreram amplos cortes na verba.

Acordo de Paris

A atuação do Brasil na preservação ambiental é historicamente reconhecida e o país teve participação ativa no Acordo de Paris, celebrado em 2015, quando o Brasil se comprometeu a acabar com o desmatamento ilegal até 2030. Na época, o Brasil foi elogiado pela comunidade internacional ao abrir um canal de diálogo entre os países em desenvolvimento e os desenvolvidos, geralmente em lados opostos no debate sobre a responsabilidade de conservação ambiental.

Em 2019, o Brasil recebeu bonificação de US$ 96,5 milhões do Fundo Verde do Clima (GCF) por controle do desmatamento em 2014 e 2015. O fundo foi criado pelo Acordo de Paris para premiar iniciativas contra mudanças climáticas.

No Acordo de Paris, o Brasil também previu a neutralização das emissões de carbono em 2060. Os EUA e a União Europeia estimam alcançar o objetivo uma década antes e colocaram pressão sobre o Brasil para acelerar o processo. O governo Jair Bolsonaro afirmou que poderia fazê-lo, desde que receba uma ajuda internacional no valor de US$ 10 bilhões. O pedido consta no documento com as metas entregues à ONU, porém não há medidas, prazos, parcerias ou riscos.

O país já conta com doação de recursos internacionais, da Alemanha e da Noruega, alocados no Fundo Amazônia. Os repasses, porém, estão suspensos após o governo extinguir comitês responsáveis pela condução dos projetos. Segundo levantamento do Observatório do Clima, há cerca de R$ 2,9 bilhões parados em caixa desde 2019.

Desmatamento

O desmatamento na Amazônia de janeiro à março deste ano chegou aos maiores valores desde o início da série histórica, iniciada há 10 anos. A área total devastada no período duplicou em relação ao ano passado. Os dados são coletados pelo Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) e foram divulgados na segunda-feira (19).

Só no mês de março foram 810 km² desmatados, o triplo em relação à 2020 e o pior mês de março da história. A área é equivalente à cidade de Goiânia. Segundo o Imazon, 66% do desmatamento ocorreu em áreas privadas, 22 % em Assentamentos e 11% em Unidades de Conservação. Em Terras Indígenas, apenas 1%.

O desempenho desastroso no combate ao desmatamento é um passivo para o governo que pleiteia mais recursos junto à ONU para a preservação ambiental e deve apresentar plano ambiental na Cúpula de Líderes sobre o Clima, nos dias 22 e 23 de abril.

Sem apoio

Após dois anos de ataques às ONGs, comunidades indígenas, instituições de preservação ambiental e comunidade científica, o governo não tem apoio para conduzir políticas de conservação do meio ambiente.

No começo de abril, mais de 200 entidades brasileiras enviaram uma carta à Casa Branca para pedir ao presidente americano que não fizesse um acordo a portas fechadas com Bolsonaro. Na semana passada, senadores democratas enviaram uma carta a Biden pedindo que a Casa Branca só libere fundos ao Brasil para ajudar na preservação da Amazônia se houver um compromisso sério do governo Bolsonaro com a redução do desmatamento e punição a crimes ambientais.

Os governadores também buscam acordos com nações estrangeiras para proteger a Amazônia sem a participação do governo federal, acusado de sabotar ações de preservação.

A classe artística se manifestou e enviou uma carta à Joe Biden pedindo que não feche o acordo com Bolsonaro.

“Ações urgentes devem ser tomadas para enfrentar as ameaças à Amazônia, ao nosso clima e aos direitos humanos, mas um acordo com o Bolsonaro não é a solução”, diz o texto assinado por 36 artistas brasileiros e americanos. Entre os americanos, estão os atores Alec Baldwin, Joaquin Phoenix, Leonardo DiCaprio, Mark Ruffalo e Orlando Bloom, além dos cantores Katy Perry e Roger Waters, entre outros. Do lado brasileiro, assinam Caetano Veloso, Fernando Meirelles, Marisa Monte, Sonia Braga e Wagner Moura

Os empresários também buscam se posicionar contrários à atuação do governo federal. Como revelado pelo O Globo, empresas como Bayer, Braskem, Bradesco, BRF, Ipiranga, Itaú, JBS, Lojas Renner, Marfrig, Natura, Shell, Siemens, Suzano e Votorantim pedem maior compromisso com a neutralização de carbono.

Os empresários estimam que “até US$ 17 bilhões possam ser gerados no país a partir de negócios com base na natureza até 2030” e que “o PIB também pode ter um crescimento vertiginoso com a implantação de práticas de baixo carbono, atingindo um ganho total acumulado de R$ 2,8 trilhões até 2030 em relação à trajetória atual” com investimentos bem planejados na área.

Com informações de O Globo

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