Bolsonaro retrata agricultor como jagunço e revolta o setor rural

Governo mostrou um homem armado com espingarda como representante do trabalhador rural

Foto: Secom

Em pleno Dia do Agricultor, o governo Jair Bolsonaro provocou um mal-estar generalizado entre trabalhadores e empresários rurais. Tudo porque, para celebrar a data, uma publicação da Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) da Presidência nesta quarta-feira (28), no Twitter, usou a imagem não de um agricultor, mas, sim, de uma espécie de jagunço.

Na ilustração, em vez de mostrar um trabalhador com uma enxada, uma foice, um equipamento agrícola ou mesmo uma colheita, o governo preferiu exibir um homem armado com uma espingarda no ombro. Embora a legenda da foto mencionasse “trabalhadores que não pararam durante a crise da Covid-19 e garantiram a comida na mesa de milhões de pessoas”, o tiro da tal espingarda bolsonarista saiu pela culatra.

Em nota, a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares) não passou recibo para Bolsonaro e cobrou respeito. Segundo a entidade, a “melhor homenagem” que a categoria merece é o “reconhecimento ao seu importante papel na produção de alimentos e no desenvolvimento do País”. A gestão Bolsonaro, porém, promove “uma ‘homenagem’ totalmente desrespeitosa, com a imagem de uma pessoa no campo segurando uma espingarda”.

Conforme a Contag, o Brasil tem 15 milhões de agricultores familiares que, com seu trabalho, “contribuem com a soberania e segurança alimentar e nutricional da população, produzindo 70% dos alimentos que chegam diariamente à mesa da população brasileira. São alimentos saudáveis, produzidos de forma sustentável, com mais sabor, potencial nutritivo e preservando os hábitos alimentares locais, o meio ambiente e a cultura local”.

A gafe também irritou o agronegócio, que apoiou Bolsonaro em peso nas eleições presidenciais de 2018. O jornal Valor Econômico lembrou que atualmente, devido à crise de credibilidade do País sob a gestão Bolsonaro, “o agro brasileiro procura melhorar sua imagem no exterior”.

Não à toa, a homenagem “miliciana” da Secom “desagradou a praticamente todas as alas do agronegócio brasileiro, mesmo as mais conservadoras”, e irritou o setor rural. Segundo o Valor, “absurdo’, ‘inacreditável’, ‘revoltante’, ‘lamentável’, ‘sem noção’ e ‘vergonha’ são algumas das definições que circulam no setor sobre o post”.

O tom de contestação no Congresso foi igualmente geral. “Só a um governo adorador da morte, pregador da violência e do extermínio, pode ocorrer homenagear os agricultores com a imagem de um homem armado. Não é dia do miliciano para fazer apologia ao crime”, registrou, em suas redes, o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP).

“Trocar a enxada por uma arma mostra bem a intenção desse desgoverno de criar milícias rurais”, disse o deputado federal José Guimarães (PT-CE). “Bolsonaro negou o auxílio emergencial para o campo que aprovamos no Congresso. Prefere investir na violência no campo.”

No Twitter, em reação à postagem oficial, os termos “agricultor” e “jagunço” apareceram no “trending topics” – o ranking dos assuntos mais comentados na rede. Internautas denunciaram que a foto pode ser encontrada em bancos de imagens como o Getty e o iStock, nos quais o retrato é descrito como “silhueta de caçador”. Além disso, o homem armado sequer é brasileiro, já que a fotografia foi tirada na África do Sul.

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