Saúde: inovar é preciso, produzir também

O SUS só será sustentável se aumentarmos a nossa capacidade de produção, pesquisa, inovação e desenvolvimento de produtos, tecnologias e serviços da saúde

Ilustração: Reprodução

A pandemia da Covid-19 escancarou a realidade de alguns países – incluindo o Brasil – de como é crítico e preocupante depender de outras nações para a produção de medicamentos, vacinas e equipamentos. O cenário expôs as fragilidades da produção nacional e mostrou a importância estratégica do Complexo Econômico e Industrial da Saúde (Ceis) brasileiro na superação da nossa dependência e para garantir o acesso universal.

O subfinanciamento do SUS ficou ainda mais evidente: a incapacidade de alocação de recursos orçamentários por parte do governo federal e o déficit da balança comercial do setor saúde, que já era elevado, foi acentuado durante a pandemia. O prejuízo de US$ 5,5 bilhões representou uma alta de 12,5% em relação a 2019. De 2019 a 2020, nossas importações de EPI tiveram um salto de quase US$ 400 milhões. O mesmo Brasil, que se orgulha de instituições como a Fiocruz e o Instituto Butantan, depende de outros países para ter os tão necessários Ingredientes Farmacêuticos Ativos (IFA). Apenas nesse item nossa dependência chega a 90%.

Apesar do percalço e da escassez de insumos no contexto global, o Ceis responde com contribuições nos cuidados com a saúde, com vacinas, kits diagnósticos, EPIs, respiradores, medicamentos anestésicos, entre outros itens produzidos localmente – muitos em regime de parcerias público privadas – e com tecnologias incorporadas por produtores públicos.

O SUS só será sustentável se aumentarmos a nossa capacidade de produção, pesquisa, inovação e desenvolvimento de produtos, tecnologias e serviços da saúde. O Congresso Nacional busca superar esse desafio por meio da Subcomissão Especial do Complexo Econômico e Industrial da Saúde com foco no que pode ser feito pelo Legislativo, Executivo, Judiciário e Tribunal de Contas da União para superar gargalos. Trata-se de uma questão de soberania nacional, desenvolvimento econômico e da garantia do preceito constitucional de que a saúde é dever do Estado e direito de todos e todas.

Foram audiências públicas dos mais diversos segmentos que resultaram em um relatório que apresenta os desafios do Ceis na pandemia: com incorporação de novas tecnologias, o papel das instituições públicas, privadas, gestão das redes de saúde e de regulação e controle, a biodiversidade e conhecimentos tradicionais, rede de pesquisadores em economia e inovação em saúde, o papel dos trabalhadores e trabalhadoras na agenda, a Saúde Digital e o financiamento do Ceis.

Foto: Reprodução/Fiocruz

É o desafio de fazermos um SUS mais forte e com mais qualidade e, ao mesmo tempo, nossa grande oportunidade de fazer parte do mercado público que gera e é o grande chamariz para sustentar o investimento público e privado em produzir no Brasil.

Foi assim quando o Ministério da Saúde incluiu a vacina do HPV e a Eritropetina e viabilizou a transferência de tecnologia para o Butantan e a Fiocruz, permitindo que hoje os institutos públicos possam produzir as vacinas para Covid-19, por exemplo.

O relatório recomenda ao Executivo Federal a recriação do Grupo Gestor do Ceis, descontingenciamento de recursos destinados ao estímulo da produção, mecanismos de definição de preços que estimulem a inovação, desburocratização para realização de pesquisas nacionais e internacionais, política externa que coloque o Brasil como liderança regional da produção na saúde.

Fica cada vez mais claro que o desenvolvimento nacional não acontecerá se não houver investimentos na produção nacional integrada ao conhecimento a serviço das pessoas. O Brasil tem o SUS, plantas industriais públicas e privadas, institutos de pesquisa e universidades, não podemos ser tão vulneráveis e dependentes.

Ainda em 2020, o secretário geral da ONU declarou que a pandemia veio como um raio-X a revelar as fraturas no esqueleto frágil das sociedades que construímos. No caso do Brasil, as fraturas estão expostas e o caminho está dado para reverter o cenário. A recuperação econômica do Brasil passa pela economia da saúde e é desafio do Congresso Nacional, do SUS e da sociedade compor um plano de reconstrução do país para superar a pandemia.

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