600 mil mortos: “Pesquisa científica e inovação são fundamentais em época de pandemia”, alerta Consecti

Em manifesto contra o corte determinado por Paulo Guedes em ciência e tecnologia, conselho que reúne os secretários estaduais da área diz que decisão do ministro é o oposto do pleito dos estados e do DF.

Foto: Alan Santos/PR

O drástico corte no orçamento do Ministério da Ciência e Tecnologia, determinado pelo ministro Paulo Guedes, vai na contramão das necessidades da área, cuja importância é central, especialmente, em meio à pandemia que já custou a vida de 600 mil brasileiros. O alerta consta de manifesto do Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação (Consecti).

“A recente modificação do PLN 16 realizada pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional a pedido do Ministério da Economia é o oposto do pleito dos Estados e o Distrito Federal que se uniram para o resgate do orçamento e recomposição do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT”, dizem os secretários por meio de manifesto.

No documento, eles destacam que a economia do século XXI é diretamente relacionada à geração de conhecimento e ao fortalecimento dos sistemas nacionais de Inovação, Ciência e tecnologia. “É importante salientar que a pesquisa científica e a inovação são fundamentais em época de pandemia, e que as atividades científicas e de desenvolvimento tecnológico são realizadas basicamente na ponta pelos órgãos estaduais (Universidades, Centros de Pesquisa, e Empresas) com financiamento local e federal (oriundo de instituições como a CAPES, CNPq e FINEP)”, afirmam.

De acordo com os secretários da área, uma redução de 620 milhões de reais por consequência do Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) 16 vai impactar diretamente os orçamentos estaduais através das Fundações de Amparo à Pesquisa que terão que arcar com estas reduções para manutenção de pesquisas em andamento e das bolsas suspensas pelo CNPq.

“O Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação (CONSECTI) expressa aqui sua enorme preocupação com os impactos desta desastrosa iniciativa, que terão consequências gravíssimas para continuidade da pesquisa científica e inovação, não só para o presente, mas para o futuro do país por gerações”, concluem os secretários.

O Consecti atua como órgão de coordenação e articulação dos interesses das Secretarias Estaduais de Ciência, Tecnologia e Inovação dos Estados, do Distrito Federal e entidades equivalentes; contribuindo para o aperfeiçoamento da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. O Conselho também é responsável pela formulação e avaliação dos objetivos e diretrizes, definição de prioridades e alocação de recursos, visando ao aprimoramento do processo de desenvolvimento científico e tecnológico em todo território nacional. SB

No PLN enviado ao Congresso pelo Ministério da Economia em agosto, a Pasta abriu crédito suplementar de R$ 690 milhões para o MCTI. No ofício enviado pelo ministro Paulo Guedes à Comissão, na última semana, ele informa que os recursos serão divididos com outros ministérios, restando somente R$ 89,9 milhões ao ministério.

Sem os recursos, há a ameaça de perda de bolsas da iniciação científica ao pós-doutorado e até suspensão do Edital Universal do CNPq. O orçamento do órgão, que era de R$ 3,14 bilhões, em 2013, foi fixado em R$ 1,21 bilhão neste ano – o menor valor dos últimos 21 anos. O edital tem um custo estimado em R$ 250 milhões, dos quais R$ 200 milhões viriam do PLN 16.  

Em nota conjunta divulgada anteriormente, entidades científicas como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Academia Brasileira de Ciências (ABC), Academia Nacional de Medicina (ANM) e Associação Nacional de Estudantes de Pós-Graduação (ANPG) também criticaram a mudança de destinação de recursos.

“Quando mais precisamos da ciência, a equipe econômica age contra a lei, com manobras que sugerem a intenção deliberada de prejudicar o desenvolvimento científico do Brasil. Além de não liberar os R$ 690 milhões à revelia dos compromissos firmados com setor, cerca de R$ 2 bilhões do FNDCT [Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] seguem pendentes de destinação, em claro descumprimento da Lei Complementar n° 177/2021”, alertaram as entidades. “É incompreensível que o Congresso Nacional permita que suas decisões, manifestadas democraticamente na aprovação de leis para o país, sigam sendo descumpridas por meio de manobras de último momento. É preciso priorizar a ciência. Ciência é vida!”, diz a nota.

Comissão de Educação

Como a medida ainda não foi sancionada por Bolsonaro, mobilizou parlamentares da Comissão de Educação nesta quarta-feira (13/10), durante audiência com o ministro do setor, Marcos Pontes. A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), que integra o colegiado, foi uma das que criticou o corte e sugeriu articulação suprapartidária para impedir a medida.

“A ciência agoniza no Brasil. Há anos não tínhamos visto o crescimento de uma posição tão atrasada de um governo em relação a elementos científicos sobejamente comprovados, como as vacinas. O presidente da República negar-se à vacinação, sua mulher ser vacinada no exterior, sem qualquer preocupação com o exemplo… O que aconteceu nesses dias não há precedentes. O que a comunidade científica espera é uma adesão sua ao conteúdo da nota assinada pelo segmento. O corte impacta nas vacinas que estão sendo estudadas, em tudo o que vem sendo heroicamente mantido nas universidades. Minha sugestão é que temos que ir coletivamente à Comissão de Orçamento pedir que não atenda ao redirecionamento pedido pelo Ministério da Economia, nos colocando de forma uníssona, suprapartidária em defesa da Ciência, Tecnologia e Inovação”, destacou.

Deputada Alice Portugal (Foto: Richard Silva/PCdoB na Câmara)

Segundo o ministro Marcos Pontes, em reunião na terça-feira (12/10) com Bolsonaro e com a ministra Flávia Arruda, da Secretaria de Governo, houve compromisso com a recuperação dos recursos. Pelo Twitter, Pontes havia mencionado que havia sido pego de surpresa e chegou a afirmar que “foi falta de consideração” os cortes dos recursos e que são “equivocados” e “ilógicos”.

Teto de Gastos

Durante a audiência, o ministro chegou a criticar a manutenção de áreas como Educação e Ciência e Tecnologia dentro do chamado Teto de Gastos. A deputada Professora Marcivânia (PCdoB-AP) endossou a crítica e sugeriu que a base do governo deveria apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com a proposta de retirada dos setores do teto.

“Endosso essa sua fala, ministro. Acredito que poderia haver uma PEC que traga isso e poderíamos sair com essa proposta dessa reunião. A gente não vai resolver esse problema [falta de orçamento para investimento em ciência e tecnologia] sem isso. A PEC poderia ser assinada por alguém da base do governo, já que é proposta do ministro, e endossada pela comissão. Caso contrário fica apenas uma fala retórica”, propôs a parlamentar.

Deputada Professora Marcivânia (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

Além dos cortes no orçamento, os parlamentares questionaram a reunião que Pontes teve com a deputada neonazista Beatrix von Storch, que é vice-líder do Partido Alternativa para a Alemanha, e foi recebida oficialmente no gabinete do ministro. Ele afirmou que “não sabia” se tratar de uma deputada de extrema-direita e que ficou “preocupado” quando viu a repercussão na imprensa.

Para a deputada Professora Marcivânia, Pontes deveria se informar melhor sobre quem recebe para reuniões. “Refuto sua tese de divergência ideológica. Divergência é natural, mas uma deputada neonazista foge a isso. É uma cultura de admitir o genocídio e não podemos admitir isso. Faço essa crítica ao recebimento dessa deputada”, condenou.

Com informações do PCdoB na Câmara