Criança negra chamada de macaco em uma escola: que lição estão dando?

Como interpretar uma criança negra com uma máscara de macaco sendo chamada de macaco pelas outras crianças? Por que em tais situações é sempre uma criança negra?

Foto: Reprodução

Em uma escola da rede municipal de São Paulo, na sexta-feira do dia 27/05/2022, uma festa com o tema “circo” envolveu uma criança. Fantasiada de palhacinho, a professora coloca na mesma uma máscara de macaco e as outras crianças ficam cantando “Você virou, você virou macaco”. Depois disso, a mãe revoltada, e com razão, registrou um Boletim de Ocorrência, enquanto a escola apagou comentários criticando a situação e mandou uma mensagem para a mãe no privado, como sempre ocorre em casos assim, foi apenas um mal-entendido. Algumas observações são necessárias.

Primeiro, em nenhum momento a escola se retratou, ao contrário, afirma que não houve racismo e que a imagem foi mal interpretada, como interpretar uma criança negra com uma máscara de macaco sendo chamada de macaco pelas outras crianças? Por que em tais situações é sempre uma criança negra? Mas, se o personagem for um príncipe ou uma princesa, a tradição é chamar a criança mais branca da sala, isso é coincidência ou uma tradição racista no currículo oculto de nossas escolas?

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Segundo, a escola é administrada Associação Evangélica Monte Carmelo. Infelizmente, a posição negadora do racismo é quase unânime nas igrejas evangélicas do Brasil, o apoio a Bolsonaro, racista declarado, também. O posicionamento desses líderes religiosos influenciam o comportamento dos fiéis, inclusive no espaço onde trabalham, além do racismo que pode é aborvido em diversos outros espaços da nossa atmosfera social.

Terceiro, nossa educação tem o racismo em seu DNA, as primeiras faculdades no século XIX leram exaustivamente autores que corroboraram com ideias racistas e, assim, justificaram a organização social existente. A constituição brasileira de 1934 consta que a educação deveria seguir os moldes da eugenia, Monteiro Lobabo, eugenista militante, indicou Anísio Teixeira para ocupar cargos na educação, o qual ficou cercado de eugenistas e transformou as escolas públicas em laboratórios eugênicos. Hoje, as práticas racistas persistem em nossas escolas, mesmo que documentos como a Constituição de 1988, LDB de 1996, e outros mais, orientem ações contrárias.

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Por último, diante da enxurrada de denúncias, resisto a acreditar que algum professor não saiba o que é racismo, até porque não é difícil pesquisar e se informar a respeito hoje em dia, pois, o ambiente no qual esse profissional atua exige um cuidado redobradíssimo acerca disso, o que não ocorreu nem sequer por parte da administração da escola. Será se temos noção do quanto isso pode influenciar na autoestima de uma criança? Será se o mesmo tivesse ocorrido com o filho da professora ou dos que administram a escola seria apenas um mal-entendido? Mesmo antes de ser professor, nunca deixei de reconhecer a importância do papel do professor em nossa sociedade, fato que me faz entender a importância do racismo ser discutido e combatido nas escolas em vez de ser praticado e ignorado, pois ali, futuros adultos terão internalizado o respeito ou a falta de respeito pelo próximo. Práticas segregadoras como essa têm produzido adultos traumatizados, depressivos e até mesmo suicidas. A título de exemplo, cabe lembrar a chacina com 12 mortos que ocorreu em realengo, em 2011, na qual o assassino pôs fim á própria vida, sendo que o mesmo sofreu bullying na escola, e quando o bullying é também racismo? Foi o que aconteceu com esse garoto ao ser chamado de macaco e servir de cruel diversão para o resto da escola, estou curioso para saber se a justiça será justa ou dará mais um exemplo de racismo institucional.

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