São Paulo tem quase 4 mil crianças e adolescentes vivendo nas ruas

Fenômeno de crianças trabalhando na noite parecia erradicado, mas voltou com tudo com redução de investimentos em programas sociais, escolas integrais e a crise social e econômica.

Criança ganha dinheiro fazendo malabares com limão em avenida movimentada de São Paulo

Quem frequenta a noite paulistana já percebeu um velho novo fenômeno dos bares: crianças vendendo balas. Curiosamente, todas as crianças chegam as mesas brincando, fazendo graça, numa atitude alto astral cativante. Não são mais aquelas crianças tristonhas contando uma histórica dramática sobre a família. Outra curiosidade é que todas elas carregam uma bolsinha carteiro, sempre igual, onde guardam o dinheiro. O uniforme é como se tivessem sido organizadas por alguma “empresa” para isso.

A novidade pós-emergência sanitária coincide com o anúncio da Prefeitura paulistana de que, em 15 anos, a população de crianças na rua dobrou, tendo contado 3.759 indivíduos, metade na faixa de 12 a 17 anos. As crianças alegres e brincalhonas trabalhando na madrugada dos bares parece ainda mais nova que isso. Na última pesquisa do tipo, realizada há 15 anos, eram 1.842 crianças e adolescentes nas mesmas condições.

O censo foi realizado em maio pela Smads (Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social). Do total, segundo o levantamento da prefeitura, 2.749 (73,1%) representam a volta com força do trabalho infantil mais cruel, em que crianças ficam vulneráveis a todo tipo de violência, riscos sanitários, assédio e aliciamento no horário em que deveriam estar dormindo. No início deste século, o trabalho infantil foi praticamente erradicado das ruas com fortes políticas sociais e legislação avançada, mas as crises econômicas dos últimos anos, e os constantes cortes de programas sociais direcionados e investimentos em escolas integrais parecem começar a fazer efeito.

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A pesquisa conta ainda que 401 (10,7%) pernoitam nas ruas e 609 (16,2%) são atendidos nos Serviços de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes (Saica) e em Centros de Acolhida Especial para Famílias.A maioria é de meninos, que representam quase 60% do grupo. Pardos e pretos representam mais de 70% dos casos.

A região com maior concentração de crianças e adolescentes em situação de rua é a República, que tem 8% do total (309), o que equivale a pouco mais de 300 jovens, seguida dos distritos da Sé (202), Santa Cecília (196), Tatuapé (161) e Pinheiros (152). Juntos, estes cinco distritos concentram 23% do total de casos. Também são bairros com intensa vida boêmia. Outra novidade é a notificação de 11% dessas crianças vivendo nas ruas de bairros periféricos.

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