Lula está “absolutamente correto” no ataque aos juros, diz Nobel de economia

Segundo Joseph Stiglitz, taxas de juros altas “colocam o Brasil em desvantagem competitiva e estrangulam as empresas brasileiras”

O comentário que segue não é de nenhum integrante da base do governo – mas deixa claro por que o presidente Luiz Inácio da Silva (PT) abriu uma cruzada contra o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto: “Há um custo enorme em ter taxas de juros altas. Isso coloca o Brasil em desvantagem competitiva, estrangula as empresas brasileiras, enfraquece a economia do país. Então o presidente Lula está absolutamente correto em estar preocupado com essas questões”.

Quem afirma tudo isso é o vencedor do Prêmio Nobel de economia Joseph Stiglitz, professor da Universidade de Columbia (EUA) e ex-economista-chefe do Banco Mundial (1997-2000). Em entrevista à BBC, o economista rebate o discurso ortodoxo de Campos Neto e desmistifica as teorias em torno das metas anuais de inflação – no Brasil e no mundo.

“A política de elevar taxas de juros – que é a resposta normal para um excesso de demanda agregada – é inapropriada no contexto atual. Isso pode, na verdade, exacerbar as pressões inflacionárias”, explica Stiglitz. “Uma das coisas necessárias para aliviar pressões no lado da oferta é investimento – e taxas de juros elevadas tornam esse investimento mais difícil.”

Segundo ele, “esse argumento serve para quase todos os países que enfrentam inflação atualmente. Na maioria deles, o argumento é até mais forte, porque, na maioria, muito da inflação é importada – ou seja, vem de produtos trazidos ou precificados no exterior”. No caso do Brasil, diz, a situação piora porque a base para justificar juros altos é a manutenção das metas inflacionárias.

Stiglitz afirma que metas de inflação “são tiradas do nada”, uma vez que “não têm base alguma na teoria econômica ou na experiência econômica”. Daí a falta de razoabilidade no discurso de Campos Neto. “Não sei todos os detalhes para o Brasil, mas posso dizer enfaticamente que não há evidência de uma espiral inflacionária nos EUA e, de maneira geral, globalmente”.

A questão ganha relevo no Brasil após a nova edição do Relatório Focus do Banco Central, divulgado na segunda-feira (27). Conforme o documento – que se baseia em projeções de analistas do mercado financeiro –, as estimativas de inflação para 2023, 2025 e 2026 continuam em alta. Nesse ano, a crer no Relatório, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, a inflação oficial do País) deve ser de 5,90%. Há uma semana, o mercado vaticinava 5,89%.

Ato contínuo, os homens do rentismo preveem juros altíssimos, de dois dígitos, até o final do próximo ano. Eles falam numa taxa básica de juros de 12,75% ao final de 2023, 10,0% em 2024, 9,0% em 2025 e 8,50% em 2026.

Stiglitz declara que a conexão entre metas de inflação e juros – ambos em altos patamares – foi posta em xeque pela “pesquisa teórica mais recente”. Diz o Nobel de Economia: “Em momentos de rápido ajuste da economia e mudança estrutural – o tipo de coisa que estamos vivendo no mundo pós-Covid e à medida que rumamos para a transição verde –, uma taxa de inflação mais alta na verdade facilita o ajuste”.

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