53 dias de agonia: troca de prisioneiros segue em meio à Gaza devastada

A trégua se equilibra no fio da navalha, com Israel promovendo ataques e impedindo a ajuda humanitária, além de prender mais palestinos do que liberta. Também abre aos olhos do mundo os escombros da guerra em Gaza.

Uma mulher palestina sentada ao lado de edifícios destruídos pelo bombardeio israelense na Faixa de Gaza, no campo de refugiados de Nuseirat, no centro de Gaza, em 25 de novembro de 2023 Foto: Reprodução

Hoje marca o quinto dia da “trégua humanitária” entre Israel e Gaza, onde a troca de crianças e mulheres por reféns israelenses está em curso. Contudo, este breve período de pausa ocorre após 52 dias desde o início da brutal agressão israelense, que atingiu a já sitiada Faixa de Gaza por terra, mar e ar. Pelo que se fala em bastidores, o governo israelense não quer uma prorrogação além de 10 dias no total, levando a trégua até o final de domingo.

O Hamas libertou o quinto grupo de reféns nesta terça-feira (28), após a extensão da trégua na guerra. Segundo Israel, 12 pessoas foram soltas, sendo 10 israelenses e dois estrangeiros. Em troca, Israel deve libertar 30 palestinos. Também nesta terça, houve um breve confronto entre o grupo armado e Israel. Ambos os lados descreveram o ocorrido como uma violação da trégua.

Apesar dos relatos de que Israel “violou” a trégua, até agora ela está “indo bem”, disse Ghazi Hamad, membro do gabinete político do Hamas, acrescentando que o grupo forneceu provas aos mediadores sobre violações relativas à entrega de ajuda, detalhes sobre libertações de prisioneiros e atividade militar no terreno.

Hamad diz que os direitos do povo palestino deveriam estar “na mesa” das ações diplomáticas relativas a Gaza, no entanto, os EUA “afastam-se” de garantir isso, continuando a apoiar “a ocupação, a guerra e os crimes cometidos contra o povo palestiniano”.

Ele disse que o grupo está totalmente preparado para concluir um acordo abrangente se Israel tiver “sérias intenções” de libertar todos os prisioneiros palestinos.

Números chocantes

“Atualmente existem entre 700 e 900 crianças com amputações de membros em Gaza, algumas dessas crianças tiveram vários membros amputados”, relata o Dr. Ghassan Abu Sitta. Fontes médicas falam em 120 crianças feridas no Hospital Al-Shifa, sem suas famílias, sem que a administração do hospital saiba suas identidades.

O balanço, embora não definitivo, é impactante. Os números baseiam-se nos corpos que chegam aos hospitais, evidenciando a escala da agressão israelense. Desde 7 de outubro, a ocupação resultou em mais de 15.000 mortos e 38.900 feridos em Gaza, enquanto na Cisjordânia, 232 perderam a vida e mais de 2.950 ficaram feridos.

Dentre essas cifras alarmantes, destaca-se o impacto sobre os mais vulneráveis: 6.150 crianças perderam a vida, 4.000 mulheres e 695 idosos foram assassinados. Além disso, 7.000 pessoas permanecem desaparecidas, incluindo 4.700 crianças.

A ministra da Saúde palestina, Mai Al-Keileh, visitou hospitais egípcios para inspecionar o estado dos feridos palestinos, pedindo intervenção urgente das Nações Unidas e organizações internacionais de saúde. Enfrentando uma grave escassez de pessoal médico, especialmente no norte da Faixa de Gaza, ela reiterou a necessidade de permitir a entrada de equipes médicas palestinas e voluntárias.

“Desde os primeiros dias da agressão, equipamos uma delegação médica da Cisjordânia. Pedimos repetidamente a Israel que fosse autorizado a chegar aos nossos hospitais na Faixa de Gaza para apoiar as equipas médicas locais, todos os pedidos foram em vão”, diz ela.

Troca de prisioneiros

No quinto dia da trégua, 30 palestinos, serão libertados em troca de 10 israelenses. Até então, houve a libertação de 50 reféns que estavam sob poder do Hamas na Faixa de Gaza e de 150 palestinos presos em Israel. Além disso, outros 19 reféns, em sua maioria trabalhadores estrangeiros em Israel, foram libertados pelo Hamas à margem do acordo.

Esta iniciativa visa aliviar a situação humanitária, mas também destaca os desafios persistentes e as tensões latentes.

A violação da trégua é evidente, com forças de ocupação israelenses abrindo fogo contra casas palestinas a leste do campo de refugiados de Al-Maghazi.

Domingo à noite e segunda-feira, as forças de ocupação israelenses prenderam 56 cidadãos de várias partes da Cisjordânia. Desde o início da trégua, o regime israelense libertou 117 palestinos das suas prisões e, ao mesmo tempo, deteve 116 novos prisioneiros de áreas em toda a Cisjordânia ocupada.

Apelos Internacionais

Enquanto o som da guerra silencia temporariamente, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, destaca a oportunidade para avaliar as necessidades dos hospitais. Ele enfatiza a urgência de mais suprimentos médicos, combustível e alimentos. “A trégua pôs fim à matança e à mutilação de pessoas de todas as idades. Se as operações militares forem retomadas, o mesmo acontecerá com as baixas, o sofrimento, a escassez drástica de suprimentos e o desespero”, disse o médico.

A pressão internacional é crucial, como enfatizado pelo ministro das Relações Exteriores egípcio, Sameh Shukri, para alcançar um cessar-fogo duradouro e garantir que Gaza receba ajuda adequada. Ministro das Relações Exteriores egípcio, Sameh Shukri: “O volume de ajuda que chega à Faixa de Gaza é muito fraca e um cessar-fogo em Gaza não será alcançado a menos que Israel perceba que é do seu interesse, e isso só será alcançado através da pressão internacional.”

Crimes de Guerra

Líderes internacionais, como Josep Borrell, alto representante da União Europeia, expressam horror diante da expansão de colonatos ilegais em meio ao conflito, destacando que isso não contribuirá para a segurança de Israel. “Estou horrorizado por saber que no meio de uma guerra, o Governo israelita está disposto a afectar novos fundos para construir mais colonatos ilegais, o que não constitui autodefesa e não tornará Israel mais seguro. Os colonatos constituem uma grave violação do Direito Internacional Humanitário e constituem o maior problema de segurança de Israel.”

O ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, está tentando aumentar o orçamento do Ministério de Assentamentos e Missões Nacionais em um montante de mais de 375 milhões de shekels, destinados a encorajar a migração de israelenses extremistas para “cidades mistas com árabes” como Lod, Ramle e Acre.

Enquanto a trégua permanece delicada, especialistas em direitos humanos da ONU pedem investigações independentes sobre possíveis crimes de guerra e crimes contra a humanidade durante a agressão. “Não existe prazo prescricional para crimes de guerra e crimes contra a humanidade, que estão sob jurisdição universal.” A comunidade internacional aguarda, com esperança cautelosa, por uma resolução sustentável, encerrando a agonia de Gaza e restaurando a esperança na região.

O jornalista Anasal-Shareef é um dos únicos jornalistas que restam no norte de Gaza. Ele recebeu ameaças graves e diretas do exército israelense para interromper a sua cobertura jornalística.

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