Países árabes têm plano com condições para criação de Estado Palestino

Netanyahu considera a proposta uma rendição, enquanto árabes, EUA e Europa a defendem como uma oportunidade histórica para a segurança da Israel.

Manifestantes marcham em apoio aos palestinos em Boston, Massachusetts, em 17 de dezembro

Em uma iniciativa diplomática inédita, países árabes, liderados pela Arábia Saudita, finalizaram uma proposta para o pós-guerra na Faixa de Gaza, buscando estabelecer um caminho para a criação de um Estado Palestino em troca do reconhecimento de Israel. O plano, apresentado a Israel pelos Estados Unidos, representa o primeiro esforço conjunto dessas nações para encerrar o conflito e buscar uma solução de dois Estados na região.

A Arábia Saudita, um dos cinco países árabes envolvidos na elaboração da proposta, ofereceu a normalização das relações com Israel como contrapartida à criação de um Estado Palestino. A proposta, ainda em fase de finalização, foi rejeitada pelo governo israelense, que se opõe à ideia de um Estado Palestino e fala, inclusive, em anexar e ocupar a Cisjordânia, e não apenas Gaza.

Em entrevista ao Portal Vermelho na última sexta-feira (19), o secretário-geral da Confederação Palestina Latino-Americana e do Caribe (Coplac), Emir Mourad, defendeu que a negativa enfática do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é consequência da falta de vitória no campo militar, do descrédito na opinião pública israelense e mundial, dos prejuízos econômicos e das divergências com seu maior aliado, os Estados Unidos. “É desespero do governo liderado por esse genocida”, disse ele.

A notícia do plano surge em meio a um novo esforço diplomático liderado pelos Estados Unidos e pela Europa, com o principal conselheiro do presidente Joe Biden para o Oriente Médio, Brett McGurk, chegando à região para discutir a guerra em Gaza e o destino dos reféns israelenses. Autoridades dos EUA e da União Europeia buscam uma solução duradoura para a questão israelo-palestina.

Enquanto o governo israelense espera que os países do Golfo desempenhem um papel fundamental na reconstrução da Faixa de Gaza, os países árabes condicionam sua ajuda à criação de um Estado Palestino. Embora a Palestina seja reconhecida por muitos países como uma nação, trata-se de um território ocupado e colonizado por Israel, sem direito a Forças Armadas. Israel controla o fluxo de pessoas e comércio nos territórios palestinos, e impede o desenvolvimento pleno de sua economia. Com a proposta de um Estado, a Palestina teria autonomia plena sobre suas decisões nacionais, o que Israel tem impedido, com a cumplicidade dos EUA e da Europa, há mais de 70 anos.

Vergonha da rendição

O plano árabe segue um caminho separado das negociações sobre a libertação de mais de 130 reféns israelenses ainda detidos em Gaza. Netanyahu rejeitou uma proposta do Egito, do Catar e dos EUA para encerrar a guerra em troca da libertação dos reféns, argumentando que seria equivalente a uma rendição. Com isso, mantém um conflito que se expande, com o dia mais sangrento para Israel ocorrido ontem (22), com a morte de mais de 20 soldados israelenses.

Familiares dos israelenses cativos tentam aumentar a pressão sobre o governo para aceitar um acordo. Na última segunda-feira, invadiram o comitê de finanças do Parlamento de Israel para protestar contra a demora do governo em negociar a volta dos reféns.

Na entrevista ao Vermelho, Mourad comparou a situação à recente guerra na Ucrânia, em que, da mesma forma que a OTAN cantou vitória, mas agora enfrenta a dura realidade, Netanyahu está agindo de maneira semelhante, prometendo ir até o fim na guerra contra a resistência palestina. “Ele está dizendo que vai até o fim, que essa guerra só vai terminar quando acabar com a resistência palestina, etc… isso é tudo para ele ganhar tempo para se manter no poder. Mas, pelo andar da carruagem, vai ser muito difícil. É uma carta fora do baralho”, avalia.

A normalização dos laços entre Israel e Arábia Saudita, um desejo de longa data por parte de Israel. Segundo fontes com conhecimento das tratativas, a ideia é apresentar o plano a Tel Aviv nas próximas semanas, buscando evitar uma escalada do conflito.

Antes da eclosão do conflito, a Arábia Saudita estava prestes a estabelecer relações diplomáticas com Israel, e o acordo proposto incluiria contrapartidas como um pacto de segurança entre Riad e os EUA e apoio ao desenvolvimento das ambições nucleares sauditas. Além disso, havia discussões menores sobre concessões de Israel aos palestinos. As negociações foram adiadas pela eclosão do conflito.

A iniciativa proposta pode envolver o compromisso de nações ocidentais em reconhecer formalmente o Estado palestino após sua criação e apoiar seu ingresso na ONU. Isso proporcionaria uma esperança real aos palestinos, indo além do envio de ajuda financeira ou da remoção de símbolos da ocupação israelense.

Na quarta-feira (17), o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, descreveu a guerra em Gaza como “dilacerante” e destacou a necessidade de um Estado palestino capaz de colaborar eficazmente com Israel. O conselheiro de segurança nacional dos EUA, Jake Sullivan, afirmou que Washington continua buscando um acordo que leve à normalização das relações entre Arábia Saudita e Israel como parte de seus planos para o pós-guerra.

O ministro das Relações Exteriores da Arábia Saudita, o príncipe Faisal bin Farhan, reiterou a necessidade de paz na região, destacando que isso só seria possível com a criação de um Estado Palestino.

A possibilidade de normalização dos laços com a Arábia Saudita representa uma potencial moeda de troca para Israel, que consideraria esse avanço uma vitória em seus esforços para desenvolver relações com os Estados árabes. A Arábia Saudita, preocupada com uma escalada regional e com a radicalização dos jovens árabes devido à devastação em Gaza, expressou indignação com a ofensiva israelense e instou a um cessar-fogo imediato.

Na quarta-feira (17), Blinken enfatizou que cabe a Israel aproveitar a oportunidade presente, considerando a crise como um ponto de inflexão para o Oriente Médio, exigindo decisões difíceis por parte dos países da região.

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