Início do Ramadã adiciona comoção no mundo com violência em Gaza

Em pleno início do mês sagrado, Israel ameaça uma invasão potencialmente devastadora em Rafah, a última fronteira de Gaza. Países árabes escalam tensão com restrições a celebrações do Ramadã.

Uma vista aérea de palestinos realizando orações de sexta-feira entre os escombros da mesquita Al-Farooq, destruída em um ataque israelense em 1º de março de 2024 em Rafah, Gaza.

Com o início do mês sagrado do Ramadã, a tensão na região do Oriente Médio atinge níveis alarmantes. O planejamento para a invasão de Rafah, por terra, acrescenta um ingrediente sangrento ao momento mais sagrado para muçulmanos do mundo todo. Bombardeios no Líbano e violência contra palestinos na Cisjordânia agravam o humor religioso, enquanto os árabes são impedidos de acessar a mesquita Al-Aqsa, em Jerusalém, um dos principais pontos de peregrinação muçulmana do mundo.

Diante das ameaças de invasão a Rafah, a última fronteira onde o governo de Israel dizia que os palestinos podiam ir com segurança, os Estados Unidos manifestam críticas à falta de um plano israelense para proteger civis em uma potencial invasão de Rafah, no sul de Gaza. O contraditório comportamento de Washington tenta criar alguma impressão junto à opinião pública americana, onde a imagem de Joe Biden está desgastada pelo apoio armado e permanente a Israel. No mundo árabe, usa-se a expressão “falar com duas bocas” para se referir a Biden.

O prazo auto-imposto por Israel para a invasão coincide com o Ramadã, ampliando ainda mais as preocupações sobre a segurança dos civis na região. O Departamento de Estado dos EUA afirmou que Israel não compartilhou um plano adequado de assistência humanitária para Rafah, destacando a necessidade de uma abordagem que garanta a segurança dos civis durante qualquer operação militar.

Enquanto isso, ataques israelenses continuam a assolar Gaza, aumentando as tensões e elevando o número de vítimas civis. A UNRWA (Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Oriente Próximo) ressaltou a urgência de um cessar-fogo imediato para evitar mais sofrimento como o flagelo da fome, especialmente durante o período sagrado do Ramadã. De acordo com o Ministério da Saúde, pelo menos 21 crianças palestinas morreram de fome em Gaza nos últimos dias, enquanto as autoridades israelenses continuam a bloquear e restringir a ajuda humanitária.

Incêndio incontrolável

A Jordânia também expressou preocupação com as restrições impostas por Israel ao acesso dos fiéis ao complexo da Mesquita Al-Aqsa, em Jerusalém Oriental ocupada, durante o Ramadã, alertando que essas ações podem levar a uma escalada da situação.

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, afirmou que não vai restringir o número de fiéis na mesquita de Al-Aqsa na primeira semana, mas que isso poderá mudar com base numa avaliação de segurança semanal. Muitos desistem das orações por receio do que podem acontecer com o forte aparato militar nas entradas de Jerusalém.

O Ministério das Relações Exteriores da Palestina afirma num comunicado que “a agressão contínua contra Al-Aqsa é o caminho mais curto para explodir toda a arena do conflito e levá-la para a fornalha de um incêndio difícil de controlar”. O ministério também apela a uma “intervenção internacional urgente e séria” para impedir os movimentos israelenses contra locais religiosos.

Enquanto isso, em Israel, o porta-voz militar para a mídia árabe, Avichay Adraee, divulgou um vídeo de supostos soldados muçulmanos do exército israelense quebrando o jejum no primeiro dia do Ramadã, enquanto a ONU e outras agências humanitárias dizem que Israel está impondo condições semelhantes às da fome aos palestinos em Gaza. Os vídeos de deboche entre soldados e autoridades militares israelenses se propagam viralmente pela internet.

O proeminente jornal francês Liberation publicou uma caricatura zombando de palestinos famintos para marcar o início do Ramadã. Retrata um homem palestino correndo atrás de ratos e baratas enquanto uma mulher o detém, supostamente porque ainda não é hora de quebrar o jejum, enquanto uma criança faminta observa. Uma mão pode ser vista saindo dos escombros de um prédio bombardeado pelos militares israelenses.

O Líbano também enfrenta os efeitos das hostilidades, com relatos de ataques israelenses atingindo o território libanês, em Baalbeck, Aita al-Shaab e Aaqoura, em uma escalada de tensões entre Israel e o Hezbollah.

O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, renovou seu apelo por um cessar-fogo e pela entrega de ajuda humanitária, enfatizando a importância de honrar o espírito de compaixão do Ramadã e garantir a segurança e o bem-estar dos civis na região. “Ao mesmo tempo – e no espírito de compaixão do Ramadã – apelo à libertação imediata de todos os reféns”, disse ele.
“Os olhos do mundo estão observando. Os olhos da história estão observando.”

O Irã, por sua vez, insta os países muçulmanos a usar o período do Ramadã como uma oportunidade para deter o que eles descrevem como “o genocídio e os crimes de guerra do regime sionista do apartheid em Gaza”. O Ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano enfatizou a necessidade de uma ação coletiva para interromper os crimes de guerra perpetrados por Israel na região. “Os desenvolvimentos em Gaza mostraram que a questão palestina é a causa comum dos muçulmanos e está no topo das prioridades do mundo islâmico”, disse ele.


Do lado do Hamas, o chefe do gabinete político do grupo de resistência palestina, Ismail Haniyeh, culpou Israel por não conseguir chegar a um acordo de cessar-fogo antes do início do Ramadã, destacando a necessidade de uma solução que ponha fim ao conflito em Gaza. Israel se recusou a enviar delegados ao Egito para uma negociação com o Hamas.

Na Cisjordânia não tem Hamas

Os militares israelenses afirmam num breve comunicado que mataram um palestiniano da Cisjordânia ocupada que supostamente estava prestes a realizar um ataque.
Identificou o palestino como Muhammad Jaber, um residente de Jenin, e disse que ele foi morto por comandos enquanto carregava armas e munições.
Não publicou nenhuma foto ou outra evidência.


Um vídeo, verificado pela unidade Sanad da Aljazira, mostra como soldados israelenses amarraram um grupo de palestinos e arrastaram-nos com uma corda. Isto aconteceu depois de um ataque à aldeia de al-Issawiya, a sul de Nablus, na Cisjordânia ocupada.

Outra controvérsia envolvendo a Cisjordânia se estende à transferência de órfãos palestinos de Gaza para Belém, gerando controvérsias entre colonos israelenses, que rejeitam o transito dessas crianças pelas estradas da região ocupada.

Pelo menos 31.045 palestinos foram mortos e 72.654 feridos em ataques israelenses em Gaza desde 7 de outubro. O Ministério da Saúde palestino afirma não ter mais condições de notificar com precisão o número de vítimas, devido ao colapso dos hospitais. O número revisado de mortos em Israel nos ataques do Grupo armado palestino em 7 de outubro é de 1.139, e dezenas continuam mantidos em cativeiro.

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