Putin condiciona paz na Ucrânia a ruptura com a OTAN

Ao recusar presença russa, cúpula na Suiça demonstra indisposição para o diálogo e deve focar em agregar alianças e recursos para a Ucrânia. Lula não participa.

O presidente Volodymyr Zelensky chega à Suíça em 14 de junho de 2024 para uma cúpula de paz sem a Rússia. (Presidência da Ucrânia)

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, declarou nesta sexta-feira (14) que a Rússia aceitaria um cessar-fogo e entraria em negociações de paz, desde que a Ucrânia abandonasse suas ambições de ingressar na OTAN, a aliança militar de países europeus, e retirasse suas forças das quatro regiões ucranianas reivindicadas por Moscou. Putin afirmou que a Rússia está disposta a garantir a retirada segura das unidades ucranianas para facilitar esse processo.

Putin fez essas declarações na véspera de uma cúpula na Suíça, onde mais de 90 países e organizações devem discutir um possível caminho para a paz na Ucrânia. A Rússia não foi convidada para o evento e descreveu a reunião como uma “perda de tempo”. De fato, a ausência da Rússia é a confirmação da indisposição europeia por qualquer negociação com Putin, o que prolonga o conflito. A China não participa, assim como o presidente brasileiro, que enviou a embaixadora em Berna.

Posições divergentes

A Rússia controla quase um quinto do território ucraniano no terceiro ano da guerra. Enquanto isso, a Ucrânia insiste que a paz só será possível com a retirada total das forças russas e a restauração de sua integridade territorial. Com sua infraestrutura destruída, a Ucrânia só sustenta a guerra a partir dos envios de armas e recursos de aliados como EUA e Europa, que têm interesses contra a Rússia.

Após a fala de Putin, a Ucrânia rejeitou categoricamente as condições de cessar-fogo, considerando-as “absurdas” e acusando o líder russo de tentar enganar a comunidade internacional e minar os esforços genuínos de paz. O Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia descreveu a proposta como “declarações manipuladoras destinadas a enganar a comunidade internacional e minar os esforços diplomáticos para alcançar uma paz justa”.

Mykhailo Podolyak, assessor presidencial ucraniano, disse à Reuters que “não havia possibilidade de encontrar um acordo” dadas as condições apresentadas por Putin. “Ele está oferecendo à Ucrânia que admita a derrota. Ele está oferecendo à Ucrânia que legalmente entregue seus territórios à Rússia. Ele está oferecendo à Ucrânia que assine sua soberania geopolítica”, afirmou Podolyak.

De fato, as condições de Putin são as mesmas do início da ocupação da Ucrânia. No entanto, os termos não evoluíram em favor da Ucrânia devido à total falta de disposição para um diálogo, apesar dos esforços de diversos países para que se resolvesse o impasse, entre eles o Brasil. A Ucrânia também mantém seus termos de se tornar base da OTAN, nas fronteiras com a Rússia, o primeiro motivador do conflito. Mas também quer manter sua integridade territorial, assim como retomar a Crimeia.

O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, em declarações ao canal de notícias SkyTG24, da Itália, comparou as demandas de Putin às táticas expansionistas de Adolf Hitler antes da Segunda Guerra Mundial. “É a mesma coisa que Hitler costumava fazer. (…) É por isso que não devemos confiar nessas mensagens”, afirmou Zelensky, destacando que Putin não cessaria sua ofensiva militar, mesmo que suas exigências fossem atendidas.

As comparações nazistas partem de ambos os lados e acabam esvaziadas conforme o conflito se prolonga. Desde o início, Putin acusa os territórios do leste da Ucrânia de serem militarizados por grupos neonazistas que perseguiam os cidadãos russos, há anos. As denúncias de violência contra sindicalistas, políticos de esquerda e discriminação contra russos se acumulavam e foram usadas por Putin para avançar sobre estes territórios.

Cúpula na Suíça pela paz

Zelensky chegou à Suíça nesta sexta-feira para participar da cúpula sobre a paz na Ucrânia, que acontecerá neste fim de semana com a presença de dezenas de líderes mundiais. Zelensky espera obter apoio internacional para seu plano de pôr fim à guerra desencadeada pela invasão russa em fevereiro de 2022.

“Serão dois dias de trabalho ativo com países de todas as regiões do mundo, com diferentes nações que, no entanto, estão unidas pelo objetivo comum de trazer uma paz justa e duradoura à Ucrânia”, escreveu Zelensky na rede social X.

O evento, que será realizado em Burgenstock, no cantão de Lucerna, contará com a participação de cerca de cem delegações, incluindo 57 chefes de Estado e de Governo. As discussões se concentrarão em questões de segurança nuclear, segurança alimentar e no retorno dos prisioneiros de guerra ucranianos e das crianças levadas para território sob controle russo.

Nas últimas semanas, Zelensky empreendeu uma série de viagens diplomáticas para garantir o apoio da comunidade internacional antes da cúpula. Ele visitou a Arábia Saudita, Catar, Filipinas e Singapura em busca de suporte.

A Rússia foi excluída da cúpula na Suíça, e a China, aliada de Moscou, também não participará. Muitos países enxergam o caráter meramente formal da cúpula, que serve mais para tentar convencer países em dúvida a apoiar a Ucrânia e colaborar para o esforço de guerra contra a Rússia.

Representação brasileira

Somente às vésperas do evento, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva decidiu quem vai representar o Brasil na cúpula da paz. A embaixadora brasileira em Berna, Cláudia Fonseca Buzzi, foi a escolhida para participar do encontro como observadora. A informação de que Cláudia Fonseca será a representante brasileira veio do governo da Suíça, que divulgou nesta sexta-feira (14) a lista de Estados participantes.

Havia a expectativa de que o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, fosse à Suíça para o encontro. Brasília, no entanto, decidiu não enviar representantes do primeiro escalão do governo Lula para a reunião.

Lula havia declarado anteriormente que não consideraria participar de negociações de paz que não envolvessem os dois lados do conflito. Esta postura foi reiterada durante uma reunião bilateral com a presidente da Suíça, Viola Amherd, na última quinta-feira (13), e vem sendo mantida desde o início do conflito. Todos os esforços de Lula, tanto na Presidência do Conselho de Segurança da ONU, como do G20 têm sido para tentar levar para a mesma mesa os dois conflitantes.

“O presidente cumprimentou a Suíça pela organização da Conferência, mas reiterou a posição do Brasil, de que uma solução para a crise demandaria a participação de representantes dos dois lados do conflito. E reiterou o interesse do Brasil de participar e ajudar a viabilizar discussões de paz entre as duas partes”, informou o Planalto em nota.

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