Mercado torce pelo descontrole inflacionário, mas governo age para decepcioná-lo

Economista Diogo Santos explica pressão do mercado financeiro por aumento de juros apesar de inflação controlada e mostra o que o governo faz que tem dado certo

Tania Rego/Agência Brasil

O IPCA-15, prévia da inflação oficial, desacelerou em junho, com alta de 0,39%, abaixo dos 0,44% de maio, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 12 meses, a variação foi de 4,06%, acima dos 3,70% dos 12 meses anteriores, mas ainda abaixo das expectativas do mercado, que previa uma inflação mensal de 0,45% e uma taxa anualizada de 4,12% e ainda dentro da meta de inflação estipulada pelo Conselho Monetário Nacional. Com isso, mais uma vez, a imprensa corporativa diz que o mercado (conjunto de agentes financeiros e produtivos do país) se surpreende com uma taxa de inflação ainda em queda, há mais de um ano, apesar de suas previsões pessimistas.

Em entrevista ao Portal Vermelho, o economista Diogo Santos, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), detalha as motivações por trás da pressão do mercado financeiro para que o Banco Central aumente os juros, mesmo com o governo conseguindo manter a inflação sob controle. Segundo ele, o mercado financeiro iniciou uma campanha sistemática de desestabilização desde a reunião de maio do Comitê de Política Monetária (Copom), quando quatro membros indicados pelo presidente Lula votaram por uma redução maior na taxa de juros, que se manteve alta pelos outros cinco membros, incluindo o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

“O mercado financeiro começou a realizar uma campanha para desestabilizar o governo, aumentando suas expectativas sobre a inflação e as taxas de juros cobradas dos agentes econômicos”, afirmou Santos. Ele acrescenta que essa estratégia busca fazer com que o Banco Central mantenha a taxa de juros elevada e que o governo adote um maior controle sobre o orçamento público.

Apesar das pressões, os dados mostram que a inflação no Brasil está dentro da meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional, que é de até 4,5%. Diogo afirma que o mercado financeiro está ignorando a realidade de que a inflação está controlada no Brasil. “Mesmo com a taxa de inflação no Brasil estando em torno de 4%, dentro da banda da meta de até 4,5%, o mercado continua pressionando por manter a taxa de juros elevada”, explica. “A meta de inflação de 3% é muito baixa para a realidade atual do Brasil e do mundo,” acrescentou.

Ele destaca que a “chantagem” do mercado está vinculada aos seus próprios interesses. “O mercado quer que o Banco Central mantenha uma agenda que favoreça seus interesses, o que inclui manter juros altos e controle rigoroso sobre o orçamento público”, acrescenta Santos.

Ouça o comentário do economista Diogo Santos:

A estratégia do governo

O economista também refuta as previsões do mercado de que os gastos do governo federal estariam gerando pressões inflacionárias. O governo tem adotado medidas para manter a inflação sob controle, como melhorar o gasto público e investir em áreas sociais e econômicas cruciais para o crescimento com distribuição de renda. Essas ações incluem a retirada de desonerações desnecessárias e o aumento da arrecadação sobre rendas não tributadas, como as de milionários e apostas.

“Essas estratégias têm funcionado. A inflação medida entre meados de maio e meados de junho foi menor do que no período anterior, mesmo após os desastres no Rio Grande do Sul, que poderiam pressionar os preços”, comenta Santos. O IPCA-15 de junho ficou abaixo das expectativas do mercado, que previa uma inflação maior.

Com essa política fiscal, o governo tem conseguido manter a inflação sob controle, ao mesmo tempo em que promove crescimento econômico e distribuição de renda. “O Brasil mantém uma taxa de crescimento que, apesar de não ser sustentável sem a reação do investimento, é importante para a reconstrução do país”, conclui Santos.

O papel do Banco Central e as expectativas do mercado

Diogo critica a postura do Banco Central de dar um peso excessivo às expectativas do mercado financeiro. “As expectativas sobre a inflação não têm o poder que o Banco Central supõe para determinar a trajetória da inflação real. O mercado está usando previsões inflacionárias pessimistas como forma de chantagem para manter os juros altos”, argumenta.

Ele enfatiza que as previsões do mercado sobre os gastos do governo federal gerando pressões inflacionárias não se confirmam. “A política fiscal do governo não tem pressionado os preços, pelo contrário, tem ajudado a manter a inflação sob controle”, conclui Santos.

A desaceleração da inflação em junho, com alta de 0,39%, foi influenciada principalmente pelos grupos Alimentação e Bebidas (0,98%), Habitação (0,63%) e Saúde e cuidados pessoais (0,57%). Apenas os grupos de Transportes (-0,23%) e Artigos de residência (-0,01%) apresentaram variação negativa.

O governo de Lula continua focado em políticas que promovam crescimento econômico sustentável e distribuição de renda, enquanto enfrenta a resistência do mercado financeiro, que insiste em uma agenda de juros altos e controle rígido do orçamento público.

Essa realidade desafia a narrativa do mercado financeiro e reforça a necessidade de uma abordagem equilibrada e realista na definição da política monetária do país.

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