Brasil impulsiona cooperação internacional em ciência e inovação no Brics
Ministra Luciana Santos destaca avanços estratégicos, como o plano de inovação 2025-2030, centro de transferência tecnológica com a China e agenda comum em inteligência artificial
Publicado 25/06/2025 16:12 | Editado 25/06/2025 21:33

A 13ª Reunião de Ministros de Ciência, Tecnologia e Inovação do Brics marcou um novo patamar na cooperação internacional entre os países do bloco. Sob liderança brasileira e com participação ativa de representantes de África do Sul, China, Índia e Rússia, o encontro consolidou instrumentos conjuntos de pesquisa, inovação e transferência tecnológica, segundo destacou a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação do Brasil, Luciana Santos, em entrevista nesta quarta (25).
Comemorando os 10 anos da plataforma de cooperação científica do Brics , a ministra celebrou os resultados alcançados, incluindo a aprovação do Plano de Inovação 2025-2030, o fortalecimento da agenda em inteligência artificial (IA) e o avanço de uma proposta estratégica para um cabo submarino de dados no Sul Global.
“A cooperação em CT&I é parte de uma política internacional que fortalece a soberania e os interesses nacionais e contribui para a superação de dependências históricas”, afirmou também a ministra em artigo a que o Portal Vermelho teve acesso.
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Dez anos de cooperação ativa e 14 grupos de trabalho em operação
Segundo Luciana Santos, a cooperação no âmbito do Brics vai muito além de reuniões diplomáticas. “Temos 14 grupos de trabalho que realizam chamadas públicas, intercâmbio de pesquisadores e compartilhamento de infraestrutura. É uma construção viva e produtiva, baseada na troca e na confiança entre nossos países”, afirmou.
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A ministra destacou que o foco da cooperação é garantir que a produção científica se transforme em soluções concretas, com impacto social e econômico. “Falamos de produtos e serviços. É disso que trata o plano de inovação: colocar o conhecimento a serviço da população.”
Essas iniciativas abrangem áreas estratégicas como biotecnologia, saúde, fotônica, oceanos, astronomia, computação de alto desempenho, IA, energias renováveis e desastres naturais. “O diálogo só é frutífero quando se traduz em ações concretas que beneficiam os povos dos nossos países”, destacou Luciana.
Plano de inovação 2025-2030: integração de marcos legais e políticas públicas
Entre os destaques da 13ª Reunião, está a aprovação do Plano de Inovação 2025-2030, que prevê maior integração entre os instrumentos de fomento à inovação dos países membros. A ministra citou como exemplos as Leis Brasileiras da Informática e do Bem, a atuação da Embrapii e o Marco Legal da Ciência e Tecnologia.
“O plano é um convite para que os países aprendam uns com os outros. Compartilhamos experiências e ferramentas legais que têm impulsionado a inovação em cada contexto nacional”, explicou Luciana.
Plano de Inovação 2025–2030 e novas chamadas “flagship”
Durante o encontro ministerial, os países-membros aprovaram o Plano de Inovação do Brics para 2025 a 2030, que foca na transformação da pesquisa científica em produtos e serviços. Também foram anunciadas duas novas chamadas: uma voltada para iniciativas de inovação tecnológica e outra para grandes projetos estruturantes, os chamados flagship projects.
Segundo o chefe da Assessoria Internacional do MCTI, Carlos Eduardo Matsumoto, a nova etapa da cooperação traz o desafio de incluir os países recém-integrados ao bloco, como Irã, Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Indonésia. “A ampliação do Brics reforça o multilateralismo, mas exige modelos mais robustos de articulação entre instituições de pesquisa e inovação”, disse.
Inteligência artificial: soberania tecnológica e modelos de linguagem próprios
A agenda de inteligência artificial ganhou destaque entre os temas discutidos. Luciana alertou para o risco de concentração tecnológica e defendeu o fortalecimento da infraestrutura nacional em IA. O Brasil já conta com 11 centros de competência e com supercomputadores como o Santos Dumont, voltado para pesquisa e desenvolvimento.
Um dos focos é o desenvolvimento de modelos de linguagem próprios, sensíveis às culturas e realidades do Sul Global. A ministra citou o modelo SoberanIA em Ar, desenvolvido no Piauí, que já opera com 100 bilhões de parâmetros.
“A IA não pode reproduzir os vieses do norte global. Precisamos de soluções linguísticas que respeitem a diversidade dos nossos povos”, afirmou.
China e Brasil fortalecem parceria com centro de transferência tecnológica
Apesar da possível ausência do presidente Xi Jinping na cúpula de chefes de Estado do Brics, Luciana Santos reforçou que a China segue como parceiro central na cooperação científica. “Assinamos um memorando de entendimento para criar um centro de transferência tecnológica entre Brasil e China. A constelação de satélites CBERS (China-Brazil Earth Resources Satellite) é um exemplo de sucesso dessa parceria”, lembrou.
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A vice-ministra chinesa da Ciência e Tecnologia participou da reunião e reiterou o interesse do país em colaborar, inclusive no desenvolvimento conjunto de soluções em IA.
Cabo submarino do Sul Global: mais dados, mais soberania
Outro avanço estratégico debatido na reunião foi a proposta de estudar a viabilidade de um cabo submarino exclusivo para os países do Sul Global. Atualmente, a maior parte dos dados da internet circula por cabos controlados por empresas e governos do Norte Global, o que representa um risco à soberania informacional das nações em desenvolvimento.
“Dados são poder. Quem controla os dados, controla decisões e processos produtivos. Um cabo Sul-Sul é essencial para garantir autonomia e segurança digital”, defendeu Luciana.
Juventude científica e diplomacia do conhecimento
A realização da 10ª edição do Fórum de Jovens Cientistas dos Brics, em Brasília, e da 8ª edição do Prêmio Jovens Inovadores, também foram reafirmadas como prioridade. Os eventos fortalecem a formação de novas lideranças e incentivam a cooperação científica desde os primeiros anos da carreira.
Com cerca de 150 jovens pesquisadores esperados, o fórum discutirá temas estratégicos como inteligência artificial, diplomacia científica e mudanças climáticas, em sinergia com a COP 30, que será realizada em Belém (PA).
Desafio central: evitar novas assimetrias no domínio tecnológico
Ao final da entrevista, a ministra foi enfática: o maior desafio para os próximos anos será evitar que o abismo tecnológico entre países ricos e em desenvolvimento se aprofunde. “A revolução digital pode aumentar as desigualdades. O Brics tem o papel de buscar soluções conjuntas para que todos tenham acesso aos frutos do progresso tecnológico”, disse.
Ao longo de 2025, o MCTI organizará 13 reuniões dos grupos de trabalho, consolidando uma agenda estratégica comum. Para Luciana Santos, essa mobilização revela o potencial do Brics como “um espaço privilegiado de avanço científico e tecnológico, capaz de enfrentar coletivamente os desafios da humanidade”.
“Estamos construindo um pacto entre países do Sul que respeita as diferenças, promove o desenvolvimento e aposta na ciência como caminho para a soberania, a justiça e a inclusão”, concluiu a ministra.
Com uma carta de intenções robusta e uma agenda ousada para os próximos anos, a reunião deixou claro que o Brics quer ser mais que um bloco econômico: busca ser um polo de inovação inclusiva e soberana no século XXI.