Maioria da Câmara é de direita e contra pautas de interesse dos trabalhadores
Pesquisa mostra que 70% dos deputados não apoiam o fim da escala 6×1 e 46% não querem taxar os super-ricos; 45% são de direita, 21% de esquerda e 25% se dizem de centro
Publicado 02/07/2025 15:37 | Editado 02/07/2025 16:54

A maioria da Câmara (45%) é assumidamente de direita, rejeita o fim da escala 6×1 (70%) e a taxação dos super-ricos (46%), agendas claramente contrárias às necessidades da maioria da população e afinadas com interesses da elite. Os deputados de esquerda somam 21% e os que se dizem de centro ficam em 25%. Os dados fazem parte da pesquisa Genial/Quaest, divulgada nesta quarta-feira (2).
Este cenário não é exatamente uma novidade, dado o perfil historicamente conservador do parlamento e o avanço da extrema direita nas últimas eleições. Mas, reforça que boa parte dos problemas enfrentados pelo governo e pela população, bem como a dificuldade em contorná-los, têm relação direta com a posição majoritária dos parlamentares.
A pesquisa apontou que 46% avaliam negativamente o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva; outros 27% o julgam positivo e 24%, regular.
Leia também: Governo aciona STF após Congresso barrar aumento do IOF para super-ricos
Quando a classificação ideológica é aplicada, o resultado é que 86% dos de direita avaliam mal o governo, 10% vêm como regular e 2% como bom. Já entre os de esquerda, 84% aprovam e 16% afirmam ser regular. A maioria dos de centro, 53%, julga como regular, 24% como negativo e 23% como positivo.
Importante destacar que 32% se dizem da base governista, 32% da oposição e outros 27%, independentes — os percentuais parecem indicar que parte dos parlamentares trafega entre essas posições, conforme a conveniência ou necessidade do momento.
Pelos ricos e contra o povo
O cenário advindo do levantamento ajuda a compreender o atual momento político. Após os embates mais recentes entre parte do Congresso — que tenta impor um tipo de “parlamentarismo torto” — e o governo, voltou a ganhar força a narrativa (propagada pela direita e veículos tradicionais de comunicação) de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua equipe estariam radicalizando no discurso do “nós contra eles”, o que supostamente acabaria por aprofundar a divisão política do país.
Mas a divisão já existe e o que parece estar acontecendo mais recentemente é que o governo e parte de sua base aliada — talvez cansados de buscar o diálogo racional e a coesão num parlamento majoritariamente hostil — passaram a explicitar o que está por trás da derrubada de vetos e de decretos por parte do Congresso.
Leia também: Plebiscito Popular mobiliza o Brasil por redução de jornada e IR mais justo
O fato é que a maioria dos deputados e senadores tem procurado blindar ainda mais setores econômicos e sociais privilegiados de quaisquer medidas que busquem algum nível mínimo de justiça tributária e responsabilidade social.
Ao mesmo tempo, os parlamentares de oposição tentam capitalizar pautas que lhe são convenientes e inviabilizar qualquer proposta do governo destinada a reequilibrar o orçamento, de maneira a jogar sobre o governo o ônus dos cortes sobre programas sociais que possam vir a acontecer se as contas não fecharem.
O posicionamento desses deputados fica claro na pesquisa: a elevação da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, proposta pelo governo, é apoiada por 88% dos deputados. A pauta tem apelo popular (de maneira que não convém ficar contra) e isoladamente não mexe com os interesses dos endinheirados.
Porém, a contrapartida — taxar os super-ricos para compensar tal isenção — tem 44% de deputados favoráveis e 46% contrários. Por divisão ideológica, apenas 17% da direita é favorável, número que salta para 92% na esquerda.
Leia também: Haddad defende decreto do IOF: “Tudo dentro da democracia”
Aliada do governo, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) tem defendido essa e outras bandeiras favoráveis ao povo. “De um lado, os BBBs (bancos, bets e bilionários), que vivem da exploração da força de trabalho do povo e não querem abrir mão de seus privilégios; de outro, classe média e pobres, que carregam este país nas costas há mais de 500 anos. Está na hora de equilibrar esta balança, com o povo no orçamento e os super-ricos no Imposto de Renda. Queremos um Brasil com saúde, educação, renda e vida digna e plena para todos”, comentou nas redes sociais.
Seu companheiro de bancada, Daniel Almeida (PCdoB-BA), também vem tratando da questão, procurando mostrar o que, de fato, está em jogo: “Querem que o povo continue pagando a conta! Enquanto o Bolsa Família custa R$ 158 bilhões, o setor financeiro abocanha R$ 1,6 trilhão do orçamento — e ainda faz escândalo contra o IOF. Não querem pagar imposto, mas querem manter privilégios. Fazer justiça tributária é cobrar mais de quem tem mais. Chega de blindar o andar de cima enquanto o povo sofre embaixo”.
Outra pauta importante para a população (mas indigesta para o patronato), o fim da escala 6×1, que beneficia grande fatia dos trabalhadores, é rejeitado por 70% da Câmara — a posição é oposta à da população. Segundo pesquisa recente do Datafolha, 64% dos brasileiros defendem acabar com esse tipo de jornada.
No caso da PEC da Segurança Pública, pela qual o governo busca ampliar a participação da esfera federal no combate à violência — uma das principais preocupações da população —, contrários e favoráveis têm o mesmo percentual de 42%, e 16% não souberam dizer.
Enquanto isso, o debate sobre um projeto alternativo à anistia, que beneficia apenas os golpistas do 8 de janeiro, tem o apoio de 54% dos parlamentares — outros 24% são contrários e 22% não sabem.
Para concluir, vale destacar que quando questionados sobre a relação entre o governo e o Congresso, 51% dos deputados a avaliam como negativa, 30% como regular e 18% como positiva. Entre os que se declaram como da base do governo, 71% a julgam positivamente. No campo oposto, 96% da oposição acham que é negativa.
O cenário geral mostrado pela pesquisa, portanto, demonstra a complexidade do momento e das relações entre governo e oposição, para além dos embates próprios do parlamento. Ou seja, o “nós contra eles” existe, mas diz respeito, sobretudo, à forma como parte considerável dos parlamentares está jogando cada vez mais contra os interesses do povo e do país.