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Para Sorrentino, cenário pós-eleições impõe ajustes na estruturação partidária

Durante a reunião do Comitê Central do PCdoB, realizada no último final de semana, em São Paulo, o secretário nacional de Organização do partido, Walter Sorrentino, apresentou uma circunstanciada avaliação política dos resultados eleitorais alcançados pel

Walter Sorrentino*




Ajustar as linhas de estruturação partidária à realidade política, com base na avaliação política dos resultados de 2006




I- Resultados positivos nos marcos da disputa política e êxito na transição de tática eleitoral


Na primeira experiência eleitoral do PCdoB em eleições nacionais na condição de força de sustentação e integrante do governo no país, a reeleição de Luis Inácio Lula da Silva foi o primeiro objetivo central, marcado por expressivo êxito. Juntamente com esse êxito, foram eleitos 14 governadores apoiados pelo PCdoB, 8 dos quais em coligação eleitoral, e os demais com apoio. O Partido apresentou-se com duas candidaturas a vice-governadoras, pelos importantes Estados de São Paulo e do Rio Grande do Sul. Foram positivos os resultados alcançados pelo PCdoB nas eleições ao Senado, deputados federais e estaduais, dados os objetivos fixados. Esta era a outra meta central do projeto eleitoral do Partido.


O maior êxito foi alcançar a quinta posição nas eleições ao Senado, apenas atrás dos quatro partidos de maior votação nacional, elegendo no Ceará o primeiro senador comunista com legenda própria depois de Luis Carlos Prestes em 1945. Destaca-se ainda mais o significado disso considerando que foram eleições onde se disputou apenas uma única vaga para o Senado em cada Estado. Para deputado federal, o PCdoB elegeu 13 vagas em doze Estados, perfazendo 2,13% dos votos válidos nacionalmente. Ultrapassou 2% dos votos em nove Estados, mesmo tendo lançado expressivas lideranças eleitorais ao Senado. Os resultados do Partido se destacam quando são contextualizados no quadro da agressividade da direita nos últimos quinze dias antes da realização do primeiro turno eleitoral. A ofensiva da mídia conservadora, em consórcio com manipulações escancaradas no âmbito do Ministério Público e da própria Polícia Federal, amplificou os erros cometidos por integrantes do PT na Coordenação Nacional de Campanha.


Para deputados estaduais, o PCdoB elegeu 12 em nove Estados, recuando das posições anteriores, como em 2002, quando elegeu 17 deputados em treze Estados; foi um resultado aquém do esperado e que motiva exame crítico.


O PCdoB, em conjunto, e sua direção nacional,  participaram ativamente da batalha eleitoral. Representantes do Partido integraram o Conselho Político e a Coordenação Nacional de Campanha Lula, e também a Comissão que elaborou a proposta de Programa de Governo 2007-2010. Elaborou orientações partidárias para o pleito e propôs idéias e objetivos políticos para a frente que apoiou a reeleição de Lula. Mobilizou apoios e atuou com destaque para incorporar os movimentos sociais à disputa política. A imprensa partidária na rede da internet teve papel de primeira linha na luta de idéias, desmascarando o ideário neoliberal e destacando-se perante a opinião pública avançada no embate contra a ofensiva da mídia hegemônica para derrotar Lula e desmoralizar a esquerda.. Também foi intenso o trabalho de acompanhamento dos projetos em cada Estado, atuou determinadamente na construção e condução das candidaturas ao senado e incorporou-se, na prática, ao comando das três que detinham maior possibilidade de êxito. Acompanhou com destaque as vinte candidaturas a federal com maiores possibilidades de êxito.


Mobilizou esforços de articulação de apoios políticos e financeiros com esse propósito. Em algumas das vitórias alcançadas, esse papel foi decisivo.


Uma visão de conjunto mostra que uma das mais importantes lições a extrair desses resultados é que a transição da tática eleitoral efetuada foi vitoriosa, positiva e avançada. As candidaturas ao Senado projetaram o Partido e suas lideranças. É um trunfo ter obtido 32% dos votos nos Estados onde concorremos. Outro aspecto da transição foi o êxito referido das chapas próprias a deputados estaduais em Minas Gerais e Rio de Janeiro e, indiretamente, também na eleição a federal no Ceará. Representou uma eficiente arma para projetar lideranças eleitorais comunistas e mobilizar a energia militante, desafiando o coletivo à vitória. É possível que em algumas situações se tenha aquilatado mal a necessidade de avançar nessa transição tática para deputados(as) estaduais, ficando a meio caminho entre a concentração em coligação e chapa própria.


II- Extrair lições da radiografia eleitoral


Uma indicação das urnas é que se alterou o perfil de votação dos comunistas. Tradicionalmente, a maior parte da votação provém das capitais e grandes cidades-pólo. Em 2002, 63% do total de votos a deputado federal proveio das capitais, e 18% das cidades com mais de 100 mil habitantes. Em 2006, esse montante foi respectivamente de 40% e 26%. Ou seja, a votação proporcional provinda das capitais para deputado federal foi reduzida em 37%, enquanto a dos grandes municípios aumentou em 44%, resultado perseguido pela linha de estruturação nos últimos anos. Nos municípios com menos de 100 mil habitantes, o incremento foi ainda maior, de 86%. Outro aspecto do comportamento eleitoral, relacionado ao anterior, é que a força de Lula levou o PT a se fortalecer no Nordeste e também no Norte, em detrimento de posições relativas no Sudeste e Sul.


Mas é na força partidária, sua maior ou menor capacitação política, força e mobilização militante, Estado por Estado, que se situa fator decisivo do êxito ou insucesso nos objetivos perseguidos. Os resultados alcançados põem em evidência um conjunto de questões a serem aprofundadas para extrair lições e ajustes na linha de estruturação partidária. Destaca-se dentre todas o grau, a qualidade e caráter da ligação dos(as) comunistas e seus(uas) candidatos(as) com a massa popular. Em ligação com isso, põe-se em questão o perfil e caráter do trabalho das organizações partidárias. É indevidamente baixa a estruturação orgânica pela base.


O aproveitamento da participação do Partido na frente institucional também precisa ser examinado em ligação com os resultados eleitorais. Tudo indica que a participação federal no Ministério dos Esportes foi positiva no sentido de instituir uma corrente de política pública e base social identificada com os candidatos do PCdoB, com resultados eleitorais importantes em diferentes medidas no conjunto do país. Outro fator é que onde o PCdoB está à frente de prefeituras a média de votação nos candidatos comunistas a deputado federal foi de 7,8% dos votos válidos e 6,4 % para estadual.


Em outra esfera, a dos mandatos parlamentares, coloca-se em exame o quanto eles são dinâmicos no sentido de se ligar aos movimentos sociais e às amplas camadas populares, agregando novos setores e segmentos, alargando a base de sustentação eleitoral e atuando em reciprocidade com o fortalecimento do trabalho partidário pela base. Em alguns casos, esse processo esteve estagnado ou burocratizado, restrito apenas às bases tradicionais de segmentos médios ou de opinião, e foi razão de insucesso eleitoral. Por fim, foram muito limitadores dos resultados eleitorais a base material alcançada.


É no grau de maturidade das direções partidárias na construção, condução e controle do projeto político eleitoral em cada Estado, que reside o fator crucial do sucesso ou insucesso eleitoral. Para, além das situações de fragilização partidária – política, ideológica e organizativa –, parte significativa dos insucessos proveio de insuficiências como falta de coesão, disputas internas, pragmatismo exacerbado, e até mesmo primarismo expresso em rebaixamento estratégico e sectarismo nas relações partidárias. Houve também falta de tarimba na aferição do nível da disputa e da própria força eleitoral partidária, conduzindo a erros de avaliação e de condução.



III – Dilemas a enfrentar no novo marco de luta pela plena legalidade da representação dos comunistas no parlamento


Os resultados eleitorais alcançados são considerados positivos sem, contudo, serem fortemente expansivos, após quatro anos de governo Lula. O Partido fez nos últimos anos uma opção política clara: ''sair em alto mar'', mergulhar com sua política própria na realidade mais larga e profunda da população e da questão nacional, na condição de aliado de um governo oriundo do campo popular; e nesse percurso abrir, renovar e consolidar organicamente o Partido.


Nos termos de nosso 11º Congresso (enfocando os desafios de acumulação de forças nos marcos de um período de defensiva estratégica, quando a frente eleitoral-institucional vem condensando o centro da disputa política de projetos na sociedade, meio pelo qual vem se abrindo caminho a uma onda progressista e democrática na América Latina), o Partido trilha um caminho original. Busca combinar ajustadamente a atuação na esfera política, unindo amplas forças e atuando no seio de amplas frentes, não recusando os desafios da atuação a partir das instituições de Estado – quando se tornaram possíveis – e a própria frente eleitoral que concentra a disputa do poder político; com a luta de idéias em prol de um projeto de desenvolvimento nacional com distribuição de renda e valorização do trabalho; e mais a luta social, incorporando não só o movimento organizado dos trabalhadores, da juventude e popular, mas também as amplas camadas da população ao proscênio político.

Apresenta-se para o PCdoB a exigência de melhorar, em todas as esferas, a assimilação e correção na aplicação do caráter inter-relacionado dessas formas de acumulação de forças. A absolutização unilateral de uma forma em detrimento de outra conduz a distorções e desvios prejudiciais ao papel do Partido e à edificação partidária. A lição a extrair é a necessidade de combiná-las ajustadamente, dispor das forças partidárias em função de todas elas, corrigir os desvios existentes e pô-las todas a serviço dos objetivos políticos centrais do Partido e de sua estruturação, inclusive de sua força eleitoral.


Nesse sentido, o PCdoB deve preparar, desde já, o projeto político eleitoral contemplando disputas majoritárias e chapas próprias sempre que possível para o pleito municipal de 2008. Porque se destaca cada vez mais que o principal fator da estruturação partidária é sua política, sua intervenção política, extensiva também à esfera de participação institucional e, de forma saliente, à esfera eleitoral. Em certo sentido, o Partido não chegou a se integrar efetivamente ao quadro da principal disputa política travada no país desde a redemocratização, representada pela disputa eleitoral dos cargos majoritários.


O PCdoB precisa reforçar sua identidade eleitoral, seus redutos eleitorais de massa, reforçar a formação e projeção de novos quadros político-eleitorais. A luta eleitoral-institucional é irrecusável e precisa mesmo ser ampliada na vida partidária, para que possa seguir em “alto-mar” – fazer mais, e não menos, esforço para colher nas urnas o esforço do trabalho partidário permanente. Nesse sentido, exige-se ajustes na linha de estruturação, voltando-a para a consecução de maior força e visibilidade eleitoral, nos grandes centros, notadamente entre os trabalhadores e o povo; maior capacidade em transformar influência política, atuação nos movimentos sociais e atuação institucional em força eleitoral efetiva e adequação do discurso político para atingir as grandes camadas populares, a partir de suas experiências concretas de vida e luta; adequação de discursos e plataformas capazes de levar as idéias do Partido às camadas populares.


Afirmando que os dilemas entre força organizada para a luta política e social, e fortes redutos eleitorais, podem ser equacionadas duas ordens centrais e interdependentes de questões cujo enfrentamento é necessário para ajustar a linha de estruturação partidária. Na esfera da atividade política e social, é a do enraizamento da atuação dos comunistas nas camadas populares, forjando mais o partido pelas bases, sobretudo nas grandes concentrações urbanas do país, que vai ligado ao dinamismo das organizações partidárias pela base e de nível intermediário.


Na esfera ideológico-organizativa, avançar no esforço por formar e forjar direções firmes, dedicadas, coesas e disciplinadas, como garantidoras do caráter partidário e de seu projeto estratégico, e acelerar a formação de uma nova e extensa geração de quadros médios para dedicar-se mais intensamente ao projeto partidário. Isto reclama novas soluções para o tempo presente e aponta, mais uma vez, para a questão da elaboração de uma política de quadros consentânea, e adotar processos renovados de controle por parte das direções partidárias.


A vigência, a partir deste ano, da cláusula de barreira acentua as pressões referidas e colocam novos ingredientes aos dilemas da estruturação. Na essência, tornam mais complexa a luta pelo projeto do Partido, podendo representar um novo tipo de luta pela plena legalidade do PCdoB na atuação institucional, que pode ser menos ou mais prolongada, como demonstra a experiência política em outros países. Acentuam-se assim as exigências referidas no fortalecimento da perspectiva e coesão dos comunistas, principalmente das direções em todos os níveis.


O Partido mantém sua perspectiva independente política e ideologicamente, não trafica seu programa e seus princípios e contestará desse modo esse entulho autoritário, ao lado de propugnar o cumprimento do programa vitorioso nas eleições acerca de uma reforma política que aprimore um pluripartidarismo democrático, que é o que mais se coaduna com as exigências do país. A firmeza e coerência podem e certamente serão transformados em capital político perante o povo, base para manter a perspectiva de fortalecimento das fileiras partidárias com novos lutadores.


O ingresso de novas lideranças eleitorais também permanece em pauta. Apesar da pressão da cláusula de barreira, o PCdoB é legenda que pode dar vazão ao surgimento e afirmação de novas forças renovadoras na política, sobretudo se avançarmos na transição de táticas eleitorais, atraindo gente do povo que vem fazendo a experiência política do tempo e enxergando nele uma alternativa avançada e viável para elevar a representação política dos trabalhadores e do povo.



A partir dessa avaliação, complementada pelo exame em cada Estado das questões apresentadas, devemos examinar um conjunto de tarefas do Partido para compor, até a próxima reunião do Comitê Central, um plano para a estruturação partidária:


– O enfrentamento político, jurídico e junto à opinião pública, da cláusula de barreira, a par da luta por uma reforma política democrática e pluralista;

– Definir, à luz da experiência, objetivos mais concretos na participação em governo, em sua ligação com o projeto político e eleitoral do Partido, e sua ligação com o povo; articular direção nacional e estaduais no controle da participação em governos oriundos da vitória de 2006;

– Iniciar, desde já, os debates acerca do projeto eleitoral para 2008; sistematizar as experiências eleitorais deste ano;

– Investir decisivamente na comunicação e propaganda, projetando ainda mais o Vermelho, redimensionando o papel de Partido Vivo, inclusive definindo meios para divulgação televisiva pela internet;

– Atuar pelo fortalecimento das lutas da Coordenação dos Movimentos Sociais, pelo protagonismo nas agendas de mobilização e pela estruturação da CMS nos Estados; intensificar a unidade na ação com outras articulações de luta popular, com vistas a falar e mobilizar camadas populares mais amplas;

– Transformar implantação da Carteira Nacional de Militante-2007 em instrumento efetivo para emular as fileiras partidárias e representar fonte de sustentação efetiva face à redução drástica do fundo partidário;

– Redimensionar o problema da sustentação material;

– Expandir as receitas partidárias com a mais rigorosa aplicação dos preceitos estatutários das contribuições com o SINCOM e ampliando decididamente a relação com amigos e apoiadores da causa do desenvolvimento nacional;

– Examinar, de maneira circunstanciada, as questões de Partido, sua ligação com o povo, suas organizações de base e intermediárias, e suas direções, notadamente nas capitais;

– Promover uma agenda da direção nacional para enfrentar as situações de partido herdadas das eleições, no sentido de superar situações de fragilização, ou reajustar projetos e direções onde se alcançou vitórias, ou ainda enfrentar problemas de direção;

– Examinar a realização de uma conferência nacional para elaboração de uma política de quadros e direções mais consentânea com as exigências atuais;

– Realizar vitoriosamente a Conferência Nacional sobre a Questão da Mulher.



* Secretário Nacional de Organização do PCdoB