O Socialismo será possível no Brasil?

Por José Misael Ferreira do Vale

Diante de tantas desigualdades sociais, econômicas, culturais, educacionais e políticas, no interior da nação brasileira, nação que abriga a exploração desenfreada das camadas populares, com distribuição perversa de renda associada à exclusão pela falta de oportunidades de trabalho, educação e direitos sociais condignos, fruto de 500 anos de colonialismo conduzido pela elite minoritária que abocanha os frutos do trabalho coletivo, os brasileiros, impotentes diante da dominação secular, tendem a considerá-la natural, um destino, uma fatalidade que se deve, resignadamente, aceitá-la para sobreviver, e, assim, tocar a vida… Para muitos a possibilidade de transformação da “realidade rebelde” que resiste à mudança parece impossível e qualquer projeto nesse sentido estaria fadado, para muitos, ao fracasso.


 


A história tem mostrado que a transformação social pode acontecer em qualquer país, a qualquer tempo e sob condições adversas, desde que o povo tenha consciência da dominação perversa que o atropela, não se venda em troca de “pão e circo” e pense além de seu próprio umbigo, encarando o seu futuro como o futuro da nação. Dizer isso parece ser fácil, mas mudar a realidade social que nos desvaloriza, que procura imputar ao trabalhador, ao assalariado, ao funcionário, ao empregado (seja homem ou mulher) a responsabilidade pelo baixo desempenho da economia é coisa bem diferente que exige análise das condições objetivas, organização popular e reflexão política.


 


O Brasil será socialista quando o povo brasileiro, construtor da nação, compreender que a miséria é criada socialmente, não é resultado de castigo divino ou de determinismo racial ou geopolítico. O Brasil será socialista se o povo brasileiro quiser superar a democracia que se vive hoje. Democracia que custou caro em termos de luta e vidas – um avanço político, sem dúvida, em relação ao nosso passado autoritário -, mas que vem provando ser incapaz de criar justiça social para o povo sofrido porque a estrutura econômica reforça, cada vez mais, o lucro desenfreado, o capitalismo financeiro, o individualismo econômico, o mercado e a mercadoria acima das pessoas, os salários aviltantes, a falta de oportunidades de trabalho, educação, cultura, lazer e demais direitos sociais.  


 


O capitalismo selvagem que nos domina procura transformar a vítima em réu, repetindo mentiras até que elas se tornem verdades. O trabalhador passa, em tempos de capitalismo globalizado, a ser responsável pelo seu desemprego, o bancário é descartado sem explicações, o estudante responsabilizado pelo baixo desempenho escolar, o professor censurado pelo baixo rendimento escolar da escola, o pai de família passa a responder pelas dificuldades econômicas da mulher e filhos, o pobre passa a ser cobrado pela sua pobreza e assim por diante. É o conhecido expediente, usado por canalhas, de culpabilizar a vítima e eximir o dominador das responsabilidades sociais inerentes ao poder. A razão de tanta pobreza e miséria é simples, na visão do dominador civil e político: falta ao povo responsabilidade, competência, inteligência, iniciativa, criatividade, escolaridade, perspicácia, capacidade de trabalho e empreendimento. O povo é incapaz e ignorante. Não se diz e não se admite, em momento algum, que o trabalho do “trabalhador despreparado” cria a riqueza do país, gera a mercadoria produzida nas empresas capitalistas que dominam os meios de produção (as máquinas, as instalações, o dinheiro, o salário).


 


Às camadas populares cabe o secular desafio de não aceitarem passivamente as forças que procuram escravizá-las através da exploração econômica e manipulação ideológica, através da cultura, política, educação, comunicação e religião. Toda essa carga opressiva não exime o trabalhador de se preparar cada vez mais, investir constantemente em sua formação para se transformar, ao mesmo tempo, em dirigido consciente e dirigente preparado para tomar nas mãos a tarefa histórica de criar uma nova realidade social justa e humana, o socialismo com a cara do Brasil.


 


José Misael Ferreira do Vale é membro do Comitê Municipal do PCdoB-Bauru.