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Brasil entrou em nova fase de crescimento, diz Mantega

O Brasil entrou em outro ciclo de crescimento. Vai privilegiar as exportações dos produtos manufaturados, em vez de se concentrar majoritariamente em commodities, e desestimular a entrada de capitais financeiros especulativos. A análise é do ministro da F

Em entrevista a Márcia Pinheiro, publicada na edição desta semana da revista Carta Capital, o ministro deixa claro que opta pelo modelo de desenvolvimento exportador asiático, ao estimular as vendas externas das empresas brasileiras. E não hesita em dar um recado: se o pacote não surtir efeito, vai reforçar a munição.



Leia abaixo a íntegra da entrevista:



A previsão de déficit em conta corrente do país neste ano foi decisiva para a adoção das medidas para frear a valorização do real?
É uma visão estratégica do que deve ser a economia brasileira no futuro. Nós demos uma reviravolta quando assumi a Fazenda, ao privilegiar a conta comercial. O Brasil trabalhou para ser um protagonista no mercado internacional. Conquistamos, assim, o superávit comercial e abrimos caminho para fortalecer as contas externas. Pudemos aproveitar o bom momento da economia mundial, a partir de uma nova política de comércio exterior, e criamos as condições para diminuir a nossa vulnerabilidade. O segundo passo importante foi reforçar as reservas do País. Passamos a ter outro espaço no cenário internacional: ser mais confiável e seguro. Um terceiro momento foi o fortalecimento do mercado interno. A economia brasileira passou a ter dois eixos: externo e interno. Nos últimos dois anos, o eixo interno se fortaleceu muito.



Em razão do aumento do crédito, salário mínimo e programas sociais.
Houve aumento do emprego e da massa salarial, uma política de salário mínimo agressiva, programas sociais do governo e uma revolução no crédito.



O crescimento do crédito no Brasil está dentro dos limites prudenciais?
Sim. O nível de endividamento no País era muito baixo. Apenas tiramos um atraso, que foi um dos alimentadores do chamado mercado de massa que se consolida hoje no País. Mesmo com o cenário internacional ruim agora, não queremos perder o eixo comercial. Se olharmos vários países, nos últimos 20 anos, dá para separar aqueles que decidiram seguir um caminho forte no comércio exterior e os outros que privilegiaram a conta de capitais. No primeiro grupo, estão os emergentes asiáticos, que ganharam market share. Nos anos 90, o Brasil escolheu o caminho da conta de capitais. O Fernando Henrique queria pautar o desenvolvimento a partir do investimento estrangeiro, por meio de capitais financeiros. Para fazer isso, usou juro muito alto para atrair dólares, com câmbio artificial, que estourou a conta comercial. Nossa estratégia é oposta. Queremos beneficiar a conta comercial, que fez a felicidade da China e da Coréia, por exemplo.



Mas o fortalecimento do mercado interno está, de certa forma, fragilizando a balança comercial, com o aumento de importações.
O crescimento maior da economia resulta em mais importações. Isso leva à redução do saldo comercial e à diminuição da conta corrente. Agora, é o momento de dar um novo impulso às exportações, de modo a manter o equilíbrio.



Qual é a equação para essa estratégia?
A política industrial está sendo reformatada, de modo a privilegiar as exportações de manufaturados. O desejável é que as empresas tenham um pé no mercado interno e outro no externo, porque isso cria sinergia e complementação. Esse processo passa pela reforma tributária, para a redução de custos e o aumento da competitividade. O governo dará competitividade financeira, tributária e de infra-estrutura. Pela via financeira, concederemos financiamento a taxas menores. Na política industrial, haverá linhas de crédito mais baixas para as exportações. É uma nova política. Agora, teremos um viés exportador. A competitividade tributária virá pela reforma e a de infra-estrutura, pelas obras do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC).



Que papel têm as medidas anunciadas na quarta-feira 12 pelo CMN?
Elas vieram exatamente para fortalecer as exportações. São fundamentalmente três iniciativas. Primeiro, retirar o IOF das exportações. Como incide duas vezes, porque replicamos a CPMF, haverá uma desoneração de aproximadamente 0,76%. Em segundo lugar, suprimimos a chamada cobertura cambial: 100% dos dólares obtidos pelos exportadores agora poderão ficar no exterior.



Há quem alegue ser a medida inócua, pois os 30% que eram permitidos ficar no exterior nunca foram plenamente atingidos.
Depende da empresa. Para muitas, é preciso ter recursos lá fora e deixar de pagar o custo de trazer os recursos, arcar com taxas e voltar a remetê-los para o exterior. Isso é definitivamente bom para os exportadores. Mesmo porque não teremos a vida toda esse diferencial de juro interno e externo de hoje. Muitos dos recursos que você mencionou voltam para se aproveitar das condições financeiras. Amanhã, não será assim.



Pela postura do Banco Central, o amanhã parece estar tão longe.
O amanhã um dia chega. Como cantava o Chico, “amanhã vai ser outro dia”. Ainda temos o juro mais alto do planeta, mas isso vai mudar.



E o objetivo da terceira medida?
Colocamos um Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 1,5% sobre as aplicações financeiras em portfólio. Ou seja, em renda fixa e em títulos do Tesouro Nacional. Quanto menos tempo o investidor ficar aqui, mais ele vai perder. É importante ressaltar que não incidirá IOF sobre operações em Bolsa, investimento direto, empréstimos para empresas e derivativos de renda variável.



Na prática, a Fazenda está contornando o problema da alta taxa básica de juro?
Exato. É como se eu estivesse baixando o juro. As medidas visam diminuir as operações de arbitragem (recursos que entram no Brasil apenas para aproveitar a remuneração elevada). Também queremos equiparar os investidores externos com os internos. Os estrangeiros tinham uma vantagem em relação aos brasileiros, que pagam Imposto de Renda.



Não voltará a alíquota de IR para estrangeiros que comprem títulos do governo?
Nós estamos compensando o IR com o IOF. Porque o IR de 15% incidia apenas sobre o rendimento do título e o IOF, sobre todo o capital que entra. O Imposto de Renda é mais complicado, porque obedece à anualidade.



O processo termina nessas medidas?
Não vamos colocar um IOF pesado agora. Mas ele é móvel e poderá ser alterado a qualquer hora, se não surtir resultado. É regulatório e não arrecadatório.



Haverá impacto no câmbio na curto prazo?
Acredito que sim. Hoje o dólar está derretendo, o que prejudica a exportação de manufaturados. As medidas são uma sinalização de que o governo não assistirá impassível ao derretimento do dólar.



Existe um Plano B se não houver o efeito esperado?
O IOF vai de zero a infinito. Se for o caso, podemos mexer. Mas não queremos nenhum efeito bombástico. Mesmo porque toda a nossa política econômica é muito prudente.



O PIB brasileiro cresceu 5,4% em 2007. Como o senhor espera que se comporte a partir de agora?
Teremos um ano muito favorável. A economia brasileira está num bom ritmo. Está rodando de 5,5% a 6% hoje. Mesmo que sofra algum rescaldo da crise internacional, que é forte, tem condições de chegar ao fim do ano com um crescimento de 5%.



O que significa um crescimento acima de 5% sem inflação?
Joga por terra a teoria do PIB potencial (quanto um país pode crescer sem pressões inflacionárias). A conta feita pelos conservadores pega o histórico do crescimento e a capacidade ociosa da indústria. Eles concluem que é possível crescer 2,5% ou 3% ao ano e só. É uma análise estática e retrospectiva. Eles não conseguem avaliar o potencial da economia brasileira. São, em geral, pessoas que têm pavor do crescimento. Existe um segmento de economistas que sofre de “crescimentofobia”. Eles acham que crescer é ruim, porque inevitavelmente provoca inflação.



O Brasil pode crescer mais do que o intervalo entre 5% e 6% ao ano?
Devagar, pode. Não neste ano. Mas nada impede que alcancemos os 7% ou 8% em 2009 ou 2010.



O senhor acredita na tese do descolamento da economia brasileira da crise externa?
Estamos descolados. Por enquanto. Claro que ninguém sabe o que vai acontecer. Mas, até o momento, estamos ilesos. Há um conjunto de países emergentes descolados. Nós não estamos sozinhos. Estamos acompanhados de China, Índia, Rússia e muitas nações da América Latina.



Com as medidas para o câmbio, dá tempo para virar o jogo e não haver déficit nas contas externas neste ano?
Não se trata de virar o jogo. Ainda temos uma equação virtuosa. Era esperado que a balança comercial tivesse um saldo menos vultoso. Temos de nos preocupar agora com o dinamismo das exportações de manufaturados. Não deixar o setor produtivo nacional se acomodar com o mercado interno. Mesmo porque hoje a economia é globalizada. Não é possível ser campeão em um só mercado. É preciso ser forte em vários simultaneamente.