A praça, o coronel e os trabalhadores
Ao longo da existência do que convencionamos chamar de coletividade (quem sabe, humanidade), a idéia que mais nos vem à mente é a reunião de humanóides empenhados em tratar de algum assunto, seja ele a partilha do fogo, do agradecimento
Publicado 07/11/2008 14:11 | Editado 04/03/2020 17:11
Estas reuniões davam-se em espaços que, em sendo de ninguém, presumia-se de todos. Aos poucos, o poder é monopolizado e trancafiado em palácios, de acesso restrito ao povo, considerado ameaça. E então, acontece na Grécia que o poder sai de dentro dos palácios e ganha… a praça (to mésson, o meio), o centro da aglomeração urbana. Este é o início da democracia. Ou seja, ao desmistificar e desmisterializar o poder, este torna-se público e pode ser pensado por todos, não sendo portanto patrimônio de um só, independente de sua força física ou bravura. Isso acontece no espaço público, na praça. Da Grécia em diante, passando pela selvageria das arenas romanas e do obscurantismo medieval, as praças sempre foram áreas públicas de lazer, pontos de encontro, locais de manifestações, atividades culturais e sociais, mas principalmente, espaços democráticos de protesto ou apoio aos governos e suas leis. Revoluções iniciaram e terminaram em praças; reis e rainhas foram coroados e depostos em praças. Da mesma forma, ditadores e presidentes legalmente eleitos foram às praças. Nem mesmo a ditadura militar conseguiu tirar o povo das praças; seus últimos suspiros foram justamente os comícios pelas Diretas Já, nas praças de todo o país. A praça é do povo, como o céu é do avião, já dizia o poeta. Pois bem, em pleno 2008, no estado que já foi considerado o mais progressista e politizado do país, é com compreensível estarrecimento que nos deparamos com a histriônica proposta de proibição de manifestações políticas na principal praça pública da capital – a Praça da Matriz, do Palácio do Governo, da Assembléia Legislativa, ou seja, dos principais atores da vida política dos gaúchos. Certo que nos últimos anos, notadamente no último ano, foi tamanha a profusão de atos e manifestações que quase estava sendo necessário agendamento prévio. Falta do quefazer dos manifestantes? Não, falta do fazer bem feito dos governantes. Falta de políticas públicas, falta de investimentos em educação, em saúde, em segurança, no meio ambiente. Falta de transparência, de punição (um ano de escândalo do DETRAN – e daí?) falta de seriedade, de palavra empenhada, de comprometimento, falta de terra para quem dela quer viver. Seria trágico, não fosse cômico, pensar que a solução encontrada por nosso governo, ao invés de tentar resolver os problemas da população seja justamente esconder o lixo sob o tapete – já que considera a nós- cidadãos que pagamos impostos,trabalhamos e construímos a riqueza deste estado como um lixinho incômodo e barulhento, justamente as margens do Guaíba, onde poderemos, quem sabe, falar para nós mesmos, esta massa cada vez maior de desassistidos cada vez maior e mais oprimida e pauperizada para uma natureza também a cada dia mais degradada. Regina Abraão
Diretora Semapi/RS