Grampo da PF pega Cel Mendes pedindo ajuda de envolvido no escândalo do Detran
Ao grampear os telefones de suspeitos de desvios em verbas na Grande Porto Alegre, a Polícia Federal (PF) gravou um dos investigados, o secretário-geral de Governo de Canoas, Francisco Fraga, recebendo do coronel Paulo Roberto Mendes um pedido de apoio
Publicado 11/12/2008 15:06 | Editado 04/03/2020 17:11
Na ligação, feita em abril, o oficial solicitava que Fraga intercedesse junto ao Piratini para garantir sua nomeação ao comando. À época, Mendes era subcomandante da corporação, e Chico Fraga, um dos 39 indiciados pela PF em outro inquérito, o da Operação Rodin.
O diálogo foi documentado com autorização judicial no contexto da Operação Solidária, que apura fraude em contratos de fornecimento de merenda escolar e de obras rodoviárias. Em 27 de maio, Fraga se tornou um dos 40 réus no caso Rodin, que investigou a fraude do Detran. Enquanto isso, Mendes estava prestes a assumir o comando. Teve seu nome confirmado pela governadora Yeda Crusius em 9 de junho.
Relatório em que a PF analisa os diálogos gravados reproduz o seguinte trecho: “Assim, no intuito de fortalecer seu nome, Mendes solicitou a Chico Fraga que fizesse articulações com algumas pessoas que pudessem influenciar na decisão da chefe do Executivo. Nesse sentido, solicitou o militar que Chico Fraga pleiteasse ao jornalista Políbio Braga a produção de matéria relacionada à invasão da fazenda Southall, aduzindo que o MST somente teria logrado êxito em função da ausência de Mendes, que se encontrava em viagem oficial. Chico Fraga recorreu também ao deputado Eliseu Padilha, o qual teria se comprometido a falar com a governadora”.
Transcrições integram relatório de operação
Um dos diálogos interceptados é entre Fraga e uma pessoa que supostamente poderia influenciar o jornalista Políbio Braga. Fraga sugere a publicação de nota afirmando que a invasão da fazenda só ocorreu porque Mendes não estava atuando naquele dia, 14 de abril. A nota foi publicada.
Transcrições e relatório da PF que expõem a relação entre Mendes e Fraga integram o inquérito da Operação Solidária que está na Justiça Federal, em Porto Alegre. Apesar de tramitar em segredo de justiça, o inquérito pode ser consultado por interessados, como advogados e investigados.
ZH teve acesso ao material pormeio de pessoas que o receberam no começo da semana. Os documentos estão sendo distribuídos a autoridades, especialmente na própria Brigada. Um dos que receberam o material foi o ex-comandante-geral da BM Nilson Bueno, sucedido por Mendes. Bueno confirmou a ZH ter recebido os documentos, mas não quis se manifestar sobre o teor. Ele fez contato com a PF e aguarda audiência na superintendência para buscar esclarecimentos sobre os documentos.
Trecho do relatório
O que diz documento da PF sobre a análise dos diálogos:
Importa salientar também a relação verificada entre o investigado e o coronel da Brigada Militar Paulo Roberto Mendes Rodrigues, subcomandante da corporação. Em 21/04, ao retornar de viagem, Cel Mendes contata Chico Fraga (retornando a uma ligação deste) e acabam por agendar encontro. Houve algumas ligações até a definição do local e, em uma delas, Chico Fraga passou a orientação: “Quando ligar naquele, deixa que eu volto, porque aquele é o que estão gravando” e, no mesmo contexto, Cel Mendes afirmou “eu acho que esse meu é meio complicadinho”. Ou seja, tratavam evidentemente sobre a segurança das comunicações via telefone.
Quanto a isso, percebeu-se que um dos assuntos tratados está relacionado a possível ascensão de Mendes ao comando da BM, o que depende de decisão a ser tomada pela governadora. Assim, no intuito de fortalecer seu nome, Mendes solicitou a Chico Fraga que fizesse articulações com algumas pessoas que pudessem influenciar na decisão da chefe do Executivo. Dessa relação, o mais relevante que se constata não é o lobby em si, até porque é cediço que tais decisões têm caráter político, sendo natural o empenho em prol deste ou daquele “candidato”, no entanto, a constatação de uma relação de proximidade entre o investigado central e uma das mais altas autoridades da segurança pública estadual sobreleva exponencialmente a sensibilidade do trabalho.
Contrapontos
O que diz Paulo Mendes, comandante-geral da BM
Tenho relação com o Chico Fraga, que era secretário de Governo e ajudou muito a Brigada em Canoas. A prefeitura sempre ajudou e ajuda até hoje. Mas desconheço esse assunto (pedido de ajuda para a nomeação). É novo para mim.
O que diz Ricardo Cunha Martins, advogado de Francisco Fraga
Há um questionamento sobre a legalidade dessa investigação e das escutas. E sobre o mérito das escutas não tenho nada a declarar.
O que diz Políbio Braga, jornalista
Recordo dessa nota, mas não lembro da circunstância em que botei, porque eu gosto de tocar o pau no MST. Essa nota não tem fonte, sou eu mesmo. No blog tenho certeza de que saiu. Se saiu no impresso não recordo. Com certeza não houve interferência absoluta de ninguém, pois costumo atacar o MST e defender o coronel.
O que Eliseu Padilha, diz o deputado federal do PMDB
Realmente intercedi pelo coronel Mendes a pedido do meu partido em Canoas. O Mendes comandava a Brigada em Canoas. Não me lembro do Chico Fraga ter pedido. Falei com a governadora (para interceder pelo coronel).
Por: Adriana Irion