Presidente da Contag alerta para impactos da crise no campo
As conquistas que os trabalhadores rurais obtiveram no governo Lula “não resolveram os problemas da agricultura familiar, que continua com o grande passivo da reforma agrária”. Esta é a opinião de Alberto Broch, sindicalista recém-eleito presidente da Con
Publicado 08/04/2009 16:30
Em entrevista a Flaldemir Sant'Anna, do Portal CTB, Broch alerta para os impactos da crise no campo, como ondas de demissão e o crescente desemprego. “Temos sentido muita dificuldade para fazer avançar as pautas de reivindicações dos assalariados rurais”, afirma o sindicalista.
Confira abaixo a entrevista.
Qual o impacto da crise econômica sobre os trabalhadores do campo?
Os homens e mulheres do campo, especialmente os trabalhadores representados pela Contag, vivem um momento conjuntural preocupante. Não podemos negar as políticas públicas importantes que conquistamos nos últimos anos, graças a um processo de organização que a Contag coordenou, como o Grito dos Excluídos, mobilizações e negociações. Também não negamos o avanço democrático brasileiro com a eleição do presidente Lula.
Mas, essas conquistas não resolveram os problemas da agricultura familiar, que continua com o grande passivo da reforma agrária. Não realizamos a verdadeira reforma agrária. Só a Contag está com mais de 80 mil trabalhadores acampados em todo o Brasil, esperando um pedaço de chão para produzir.
O desemprego nos preocupa, pois a demissão de cada trabalhador, urbano ou rural, reduz o consumo, afetando os agricultores que deixam de vender um quilo de feijão a mais, o que interfere nos preços dos produtos. Também nos preocupam as demissões que ocorrem em alguns setores agrícolas, como a fruticultura no Vale do São Francisco, onde 10 mil assalariados foram demitidos.
Qual o papel que a agricultura familiar pode desenvolver no momento de crise?
Nós entendemos que este é o momento de fortalecer a agricultura familiar. Segundo dados da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação), temos mais de 1 bilhão de pessoas passando fome no mundo. Não vamos resolver o problema da fome sem atacar os grandes entraves da agricultura, especialmente da agricultura familiar.
É preciso fazer a reforma agrária e debater um problema sério, que é a renda da agricultura familiar, buscando a compatibilidade entre os custos de produção com os preços que são praticados no mercado. E isso vai se refletir também em vantagens para o consumidor.
Quais os efeitos da crise econômica nas políticas desenvolvidas pela Contag?
Nós temos sentido muita dificuldade para fazer avançar as pautas de reivindicações dos assalariados rurais.
Qual o projeto de agricultura defendido pela Contag?
A Contag, principalmente após o 10º Congresso, tem um grande projeto político para o campo, alternativo ao modelo de desenvolvimento rural que concentra terra e renda. A Contag defende um projeto alternativo, sustentável e solidário para a agricultura brasileira. Nossa proposta é um modelo de desenvolvimento que valoriza a pessoa humana, que estabeleça uma produção sustentável.
Como será possível implantar um projeto de agricultura sustentável?
A Contag quer fortalecer a agricultura familiar, mas para isso precisamos debater o acesso aos recursos naturais, discutir a reforma agrária e, principalmente, o modelo de produção existente, que concentra terra e renda. A Contag não é contra a tecnologia, mas queremos uma tecnologia que fortaleça um modelo de agricultura com gente no campo, que valorize as comunidades, a cultura local, a produção do conhecimento, os saberes dos agricultores.
Esse debate precisa envolver o conjunto da sociedade, pois mais de 70% dos municípios brasileiros têm como base econômica a agricultura — e uma agricultura familiar forte gera emprego, ocupação e renda no local onde as pessoas vivem. Para a Contag, o Estado precisa ter um papel atuante no desenvolvimento de políticas públicas para agricultura familiar.
Qual é posição da Contag em relação ao agronegócio?
A política da Contag para o campo se confronta com o modelo de agricultura que concentra o uso dos recursos naturais. Um modelo predominante no país que tem como único objetivo a agricultura para exportação, sem gente no campo, com expansão desordenada das fronteiras agrícolas. Nós nos confrontamos no dia-a-dia com o agronegócio.
Como será a convivência da Contag com a CUT e a CTB?
Nós queremos desenvolver uma convivência fraterna com a CUT e a CTB, pois consideramos que as duas centrais sindicais polarizam uma importante política no campo. A Contag foi filiada por mais de 12 anos à Central Única dos Trabalhadores, convivendo com a CUT sem nunca termos sido cutistas.
Agora, com a presença forte da CTB no campo, a Contag vai conviver com as duas centrais. Vamos trabalhar juntos para fortalecer a luta no campo, respeitando a autonomia dos sindicatos filiados na Contag e dos nossos dirigentes sindicais.
Qual é a base representada pela Contag?
A Contag representa cerca de 20 milhões de trabalhadores e trabalhadoras rurais em todo o Brasil. Temos 27 federações, cerca de 4 mil sindicatos com 9 milhões de filiados. Representamos um conjunto de 20 milhões de homens e mulheres que vivem no campo entre assalariados rurais, agricultores familiares, mulheres, jovens e trabalhadores em terra.