Flávio Dino: A internet na campanha eleitoral
O debate em torno do uso da Internet nas eleições, retomado em escala mundial a partir do caso de sucesso da campanha do novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ganhou corpo também no Brasil nos últimos meses. Tanto que esse instrumento de co
Publicado 01/07/2009 17:05
A inclusão da Internet nesse importante projeto de lei, em que buscamos esclarecer com o máximo de detalhamento possível como serão as regras do jogo político em nosso país, acabou centralizando o foco das atenções da mídia e da sociedade. O que certamente deve se repetir durante a votação em Plenário, pois é impossível desconsiderar o alcance e a força cada vez maiores dessa que é a “praça virtual” da atualidade. Entretanto, o uso da Internet nas campanhas eleitorais hoje é submetido a um regime praticamente proibitivo. Os candidatos estão confinados ao site “.can”, que é um espaço certificado pela Justiça Eleitoral e sujeito a muitos impeditivos.
Estamos propondo, no projeto, a substituição radical desse panorama. Em primeiro lugar, porque a Internet é um mecanismo de barateamento das campanhas eleitorais, portanto ajuda a diminuir o peso do dinheiro nas eleições. Em segundo lugar, porque ela é um mecanismo democrático, que aproxima os representantes dos representados, favorecendo a interatividade e o diálogo entre candidato e eleitor tanto quanto as ruas. Com 40 milhões de brasileiros tendo acesso direto à informática – número sempre crescente a cada ano – é um absurdo restringir o seu uso, como aconteceu até as eleições de 2008.
No lugar desse regime do “nada pode” ou do “pouco pode”, nós parlamentares do grupo de trabalho para a Reforma Eleitoral criado pelo presidente da Câmara, Michel Temer, o qual tive a honra de coordenar, estamos propondo um sistema amplamente liberal no uso das tecnologias disponíveis no mundo virtual. Assim, será possível utilizar a Internet nas campanhas eleitorais tanto para abrigar sites de partidos e candidatos, quanto para criar blogs, twitter, orkut, redes sociais de relacionamento de um modo geral, e-mails e salas de bate-papo entre os candidatos e os eleitores. Mais do que isso, o projeto permite a utilização da Internet como meio de doações, inclusive com a utilização de cartão de crédito.
Porém, evidentemente que essa liberalização precisa ser feita com algumas cautelas, porque se trata de mudança profunda em uma realidade na qual a Internet é usada apenas para propaganda negativa e difamatória dos candidatos e partidos. Precisamos permitir o bom uso desse fantástico meio de comunicação. A primeira cautela que sugerimos, então, é a de que não haja propaganda paga na Internet, porque não podemos equipará-la a um jornal ou a uma revista. Não temos meios para arbitrar a igualdade de espaços disponíveis para a comercialização na rede, como é feito nos demais veículos, e uma disputa realmente democrática pressupõe paridade de armas, ou seja, regras que possibilitem ao máximo a igualdade de chances entre os candidatos. Caso contrário, o mais forte economicamente esmagaria o mais fraco.
Também defendemos que haja um regime claro de direito de resposta. No caso de injúria, calúnia e difamação, que seja garantida a possibilidade de o candidato ir à Justiça Eleitoral e buscar o mesmo espaço para veicular a verdade sobre a situação em questionamento.
Outra cautela que propomos são regras proibitivas de conteúdos ofensivos ou de tratamento privilegiado a determinados candidatos no tocante às empresas de comunicação social que usam dos meios virtuais. Tais empresas precisam garantir equidade de tratamento aos vários postulantes, sob pena de também assim quebrar a igualdade de chances entre os candidatos. A Internet não é igual à tevê ou ao rádio, que são concessões públicas, mas também não é igual à imprensa escrita. Precisamos construir um regime jurídico próprio para esse novo meio, a partir da sua natureza específica, que é a de uma espécie de convergência de várias mídias. Essa característica da Internet nos obriga a uma convergência de regras também no plano normativo.
Em função disso é que surgiu outra cautela proposta no projeto – a proibição clara do spam, aquela mensagem indesejada e invasiva que viola o direito à privacidade do receptor. Incluímos uma regra segundo a qual as propagandas devem vir com uma opção para o internauta que não deseja recebe-las: “Não, eu não quero mais receber sua propaganda eleitoral”. E o candidato será obrigado a não mais enviar esse tipo de conteúdo para aquele endereço de e-mail, sob pena de multa.
Tenho a convicção de que produzimos um texto avançado e de qualidade, que nos colocará no século 21. É uma grande mudança, que deve ser feita com prudência. Não podemos substituir o regime até aqui vigente, altamente restritivo, por um imprevisível “vale-tudo”. Aliás, nenhum meio de propaganda é totalmente “liberado”, seja em campanhas eleitorais ou comerciais. Regras são necessárias para proteger tanto os cidadãos quanto os candidatos. Além disso, é importante entender que reforma política é um processo, não está restrita a um momento único. O que importa é avançar, com passos seguros. É isso que buscamos com o projeto da reforma eleitoral e a inclusão da Internet em nossas campanhas. Se conseguirmos aprová-lo, já será um enorme passo.
* Flávio Dino é deputado federal pelo PCdoB-MA e coordenador do grupo que elaborou a proposta de reforma eleitoral