Proposta de reajuste do IPTU de BH volta ao debate da Câmara

No momento em que o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), fundação pública vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, sugere no Congresso Nacional um novo modelo para cobrança e aplicação dos recursos do IPTU.

No momento em que o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), fundação pública vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, sugere no Congresso Nacional um novo modelo para cobrança e aplicação dos recursos do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) pelos municípios brasileiros, a Câmara Municipal de Belo Horizonte se prepara para debater o projeto de lei do prefeito Marcio Lacerda (PSB) que vai reajustar as planilhas do tributo para 2010 – o que vinha sendo tentado desde o final do ano passado, mas foi retirado de pauta por causa da campanha eleitoral.

O prefeito Marcio Lacerda disse, na semana passada, que vai apresentar à Câmara dos Vereadores uma proposta de mudança do IPTU. “Se a pessoa comprovar que não tem renda para pagar o imposto e mora em um imóvel de maior valor, poderá ficar sem pagar, mas, quando for vender a propriedade, o IPTU dos anos anteriores terá que ser totalmente quitado.” Pela legislação atual, o imposto prescreve após cinco anos.

Nos próximos meses, a questão do IPTU deve ocupar também o centro da discussão política nos municípios em todo o Brasil. Em Minas Gerais, as avaliações sobre os critérios de cobrança e aplicação de recursos do imposto devem integrar a pauta de debates e encaminhamentos da Associação Mineira de Municípios (AMM) a partir das próximas semanas. A entidade está convocando seus associados para a eleição, no próximo dia 24 de setembro, dos membros do Conselho de Órgãos Fazendários Municipais de Minas Gerais (Confaz-M Minas), que reúne representantes das secretarias municipais de Fazenda dos 853 municípios mineiros. A última composição do conselho foi presidida até o final de 2008 por Lúcio Scalon, secretário de Fazenda de Uberaba.

Em Belo Horizonte, um primeiro projeto sobre o IPTU chegou a ser enviado à Câmara ainda na gestão do prefeito Fernando Pimentel (PT), no final de 2008, mas foi retirado pela prefeitura depois de um acordo firmado com os vereadores e com o prefeito eleito Marcio Lacerda. Para o vereador Arnaldo Godoy (PT), que até dezembro de 2008 integrava a Comissão de Orçamento e Finanças e chegou a participar das primeiras avaliações sobre o projeto na Câmara, a questão do IPTU deve gerar discussões acaloradas porque sempre envolve várias polêmicas.

“A tramitação da proposta da prefeitura pode ser tranquila ou mais complicada. Tudo vai depender das alterações que o prefeito Marcio Lacerda vai apresentar sobre a forma de cobrança do tributo na capital”, adverte Godoy, reconhecendo que chegou a concordar com a maioria dos termos do primeiro projeto – segundo o qual a prefeitura propunha reajuste do imposto pela planta de valores, ou seja, pela localização e valorização dos imóveis no mercado. Godoy lembra que os vereadores de BH terão até o final de dezembro para votar o novo projeto sobre o IPTU para que ele tenha validade a partir de 2010.

Na Câmara de BH, os vereadores aguardam para os próximos dias a apresentação do teor do projeto do Executivo. Assim que for apresentado, o projeto entra em fase de instrução na Câmara Municipal e segue em tramitação para as comissões do Legislativo, começando pela de Orçamento e Finanças.

Ipea sugere perda de autonomia

Intitulado “Política Fiscal e Justiça Social no Brasil: o Caso do IPTU”, o documento apresentado pelo Ipea na última quinta-feira, na Câmara dos Deputados, em Brasília, propõe revisões para o modelo do imposto, argumentando que ele pode ser um instrumento tributário que promova distribuição de renda e permita reduzir tanto desigualdades sociais quanto a dependência das prefeituras em relação às esferas de governo estadual e federal.

O estudo do Ipea foi apresentado por Marcio Pochmann, presidente da fundação, em audiência conjunta organizada pelas comissões de Finanças e Tributação e de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio da Câmara. Também participou da audiência o prefeito de Vitória (ES), João Coser (PT), que preside a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP).

De acordo com Milko Matijascic, economista-chefe do Ipea e um dos coordenadores do estudo apresentado em Brasília, um dos graves problemas com o IPTU no Brasil acontece em anos eleitorais, quando muitos prefeitos, por questões políticas, deixam de cobrar o imposto. Com isso, a manutenção das cidades e investimentos sociais são prejudicados, piorando a qualidade de vida da população.

Na avaliação do economista do Ipea, parte desse problema se deve ao fato de que, apesar do Brasil ser um país federalista, a União deixa para os municípios autonomia irrestrita para definir a alíquota referente ao IPTU.

“O problema vem de muitas décadas, mas poderia ser minorado caso no Brasil fosse adotada uma prática bastante comum em outros países, que é definir as alíquotas a partir das instâncias superiores do Estado e da União, e não pelos municípios, que são mais frágeis diante de pressões econômicas e de apelos políticos e partidários”.

O levantamento apresentado aos parlamentares aponta que pelo menos 137 municípios adotaram alíquota zero para o IPTU em 2008. O Estado que apresentou maior número de prefeituras que cobram alíquota zero para o IPTU foi o Maranhão, com 49 municípios. Em segundo lugar, estão o Pará e o Rio Grande do Norte, com nove municípios cada, seguidos da Bahia, com oito municípios. “Este número por certo é ainda maior, pois 269 municípios não são cobertos pelo Relatório Finanças do Brasil, que é a fonte desses dados”, explica Milko Matijascic.

Para o presidente da Frente Nacional dos Prefeitos, João Coser, os motivos que levam muitos municípios brasileiros a conceder isenções do imposto, que em alguns casos chegam até a alíquota zero, são sempre eleitorais.

“O IPTU é um tributo direto muito perceptível para a população, até pelo fato de ser pago por meio de carnê, em vez de estar embutido em um preço, como é o caso do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Com isso, muitos prefeitos temem que a cobrança do IPTU resulte em revés eleitoral e acabam reduzindo ou zerando sua alíquota.”
Ao analisar o contexto da experiência de países selecionados como os Estados Unidos, Argentina, Alemanha, Suécia e Coreia do Sul, o estudo do Ipea analisa os mecanismos do IPTU e o perfil do imposto no cenário brasileiro, destacando a evolução da tributação sobre a propriedade em percentuais sobre o PIB. Também mostra a participação deste imposto na arrecadação municipal e sua incidência por estratos de renda, o aumento de sua arrecadação e sua relação com a desigualdade de renda.

“O IPTU merece destaque devido ao fato de, ao contrário dos outros impostos, incidir sobre o patrimônio e não ser um tributo indireto. Isso significa que as municipalidades, além de contarem com um instrumento que permite obter arrecadação própria, sem depender de repasses, contam com um tributo que pode reduzir as desigualdades sociais e ordenar os espaços urbanos para evitar a especulação sem justificativas sociais e para preservar o meio ambiente”, diz um trecho do estudo, que está disponível para download gratuito no site www.ipea.gov.br. A íntegra do trabalho será publicado em 2010, em livro que vai reunir pesquisas de técnicos da entidade sobre tributação.

O coordenador do estudo explica que, numa situação hipotética, se a cobrança do IPTU fosse homogeneizada segundo o perfil geográfico e social dos municípios, levando-se em conta a unidade federativa de vinculação do município, a renda per capita, a renda total, o número de habitantes e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), a arrecadação poderia aumentar em R$ 25,576 milhões.

Esse valor, lembra Matijascic, se aplicado em programas sociais como o Bolsa Família, seria suficiente para tirar 2,39 milhões de pessoas de uma situação muito próxima à da linha de pobreza e 94 mil da indigência. Ou, então, num segundo cenário, resgataria 1,44 milhões de brasileiros da indigência e 1,32 da situação de pobreza.

Arrecadação poderia aumentar 75%

“No Brasil, o IPTU é mais regressivo porque tem maior incidência sobre os mais pobres. No final das contas, pessoas que têm mais renda são beneficiadas pelo atual sistema tributário. Além disso, é bom ser proprietário de imóvel, porque o proprietário paga menos tributos em relação aos não proprietários”, explica o economista do Ipea, que considera a questão do IPTU um dos grandes desafios políticos para os prefeitos e administrações municipais.
Matijascic afirma que é um erro considerar o IPTU apenas como uma fonte de arrecadação. “Sua importância real está muito mais no controle do espaço urbano das cidades e na proteção do meio ambiente”, avalia, lembrando que é fácil entender porque ele é um tributo quase sempre tão impopular.

“As tabelas sempre estão desatualizadas e os imóveis valem muito mais do que o apresentado como valor venal. Mas é fundamental conscientizar a população sobre sua importância, porque esse tributo valoriza a cidade e contribui para a qualidade de vida”, destaca. Matijascic também alerta, com base no estudo do Ipea, que existem mais de 5 mil legislações distintas no Brasil apenas relativas ao IPTU. Para o economista, caso a homogeneização do tributo fosse adotada, a arrecadação do IPTU aumentaria, em média, 75,7% nos pequenos municípios. “Nosso estudo comprova que o aumento seria menos impactante nas metrópoles, com cerca de 1,1%. Já nas periferias, o aumento médio da arrecadação, com a homogeneização, seria de até 13,3%”, completa.

Informações do Jornal Hoje em Dia