Oito anos de mudanças: movimento social comemora conquistas
Uma boa comparação para entender a diferença entre o governo Lula e o governo FHC em relação aos movimentos sociais é a lei, adotada no apagar das luzes do governo tucano, que tirou da UNE o direito de emitir a carteira estudantil, com o PL do governo Lula devolvendo a sede das entidades estudantis, destruída pelo Regime Militar.
Por Luana Bonone
Publicado 02/10/2010 19:13
Podem-se citar ainda a regularização das centrais sindicais, a limitação de compra de terras por estrangeiros, o Estatuto da Igualdade Racial, a Lei Maria da Penha, ou a PEC da Juventude. Esses são alguns dos marcos legais que “oficializam” o avanço da democracia entre 2003 e 2010 e o respeito às demandas do movimento social.
Leia também, da série de artigos sobre os oito anos do governo Lula:
- Aprofundando a democracia
- Exemplo na luta contra pobreza
- Governo Lula democratizou cultura
- Movimento social comemora conquistas
- A polêmica questão dos direitos humanos
- Política externa de soberania e pela paz
- Grandes conquistas no campo do esporte
Mas, se for escolhido o critério do diálogo, os dados são ainda mais fortes: mais de 70 conferências temáticas, que mobilizaram mais de 4,5 milhões de pessoas; primeira vez na história que um Presidente da República se reuniu com todos os reitores de universidades federais; segunda vez na história em que o Presidente visitou a sede da UNE (o primeiro a fazer isso foi João Goulart, deposto pelos militares em 1964). Isso sem contar a participação de Lula em congressos: da União Nacional dos Estudantes (UNE), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), da Central Única dos Trabalhadores (CUT), etc.
Para cada recorte que se escolha, é difícil não reconhecer o avanço da relação entre governo e movimentos sociais durante os dois mandatos Lula. Relação que rendeu frutos concretos em termos de conquistas.
No campo da educação, medidas como o Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Programa de Apoio ao Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), e mesmo as alterações no programa de Financiamento Estudantil (Fies) iniciaram uma jornada fundamental: dar oportunidade para que uma juventude antes excluída da universidade passasse a ter acesso a este recurso que gera mobilidade social, aumenta empregos e ruma no sentido de qualificação dos recursos humanos nacionais para o desenvolvimento de Ciência e Tecnologia.
Para o presidente da UNE, Augusto Chagas, “a expansão da rede pública, o ProUni – que já incluiu 700 mil jovens no ensino superior -, as mudanças no Fies e nas políticas de permanência, juntas, têm concretamente combatido a marca de exclusão do nosso sistema educacional”.
Além disso, o governo triplicou o orçamento do Ministério da Educação nos últimos oito anos, passando de R$ 17,4 bilhões em 2003 para R$ 51 bilhões em 2010, e com uma grande conquista em 2009: o fim da Desvinculação de Receitas da União (DRU) para a Educação, o que libera cerca de 20% que este instrumento retirava dos recursos vinculados à área.
É forçoso perceber que houve esforços importantes também em relação ao Ensino Básico, cuja primeira medida foi a transformação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) em Fundeb, ampliando para o Ensino Básico. Medidas de valorização do profissional da educação como o Piso Salarial Nacional para professores também podem ser comemoradas, assim como o fim do vestibular, com o Sistema de Seleção Unificada (SiSu). Entretanto, o grande avanço registrado no governo Lula é o crescimento de universidades federais e a construção de escolas técnicas em número que equivale à soma de escolas criadas em toda a história do Brasil.
Segundo o presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Yann Evanovick, “até 2002 o Brasil possuía 114 instituições. Até o final de 2010 haverá 214. E, se for dada continuidade ao projeto em curso, o secretário de Ciência e Tecnologia do Ministério da Educação (MEC), Eliezer Pacheco, informou que a perspectiva é que até 2011 haja cerca de 400 institutos federais de ensino técnico no país”.
As políticas educacionais fazem parte da principal vitrine dos avanços na área de juventude, que envolvem ainda políticas de esporte e cultura, como o Programa Segundo Tempo, o Pró-Jovem e o Programa Cultura Viva (pontos de cultura). Todos esses programas, entretanto, não são mais importantes que a própria criação de uma Secretaria Nacional de Juventude (Sejuve), que os movimentos pressionam que seja transformada em ministério no próximo governo. A Sejuve conduziu as Políticas Públicas de Juventude utilizando como instrumento principal de diálogo com a sociedade o Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), formado por 67 entidades da sociedade civil organizada, que conquistaram, ainda, a aprovação da PEC da Juventude e agora lutam pela aprovação do Estatuto.
Mas não foi só no campo educacional e da juventude que os movimentos sociais obtiveram conquistas e comemoram avanços. As centrais sindicais, legalizadas, passaram a ter atuação mais articulada e se fortaleceram, pautando o governo e o congresso nacional para conquistas como a política de valorização do Salário Mínimo, que equivalia a 95 dólares durante o governo FHC e passou a valer 387 dólares no governo Lula.
Quando anunciada a lista das centrais legalizadas, em agosto de 2008, o presidente da CTB, Wagner Gomes, comemorou o fato histórico declarando que a central ''obtém, com este reconhecimento, uma grande vitória. Agora o nosso desafio é estruturar a entidade nos estados e ampliar o número de entidades filiadas'', demonstrando a possibilidade de maior consolidação do movimento a partir da medida.
Quando Lula vestiu o boné do MST, a grande mídia se assanhou. Entretanto, após participar de congressos da entidade e dialogar com lideranças do movimento, o presidente mostrou que conhece a demanda do campo, ainda que o MST mantenha suas necessárias críticas e pressões em relação às políticas de reforma agrária. Em sete anos, o governo Lula assentou 574,6 mil famílias. Isto significa 59% do total das famílias assentadas em toda a história do país. Foram 46 milhões de hectares de terra destinados para a Reforma Agrária (53% do total de terras destinadas para a Reforma agrária em toda a história do país e uma área maior que o estado de São Paulo e Paraná). De 2003 a 2008 a renda da Agricultura Familiar cresceu 30% acima da inflação, enquanto a média do país foi de 11%. Em agosto deste ano, mais uma medida foi considerada conquista pelo movimento social: a limitação da compra de terras brasileiras por estrangeiros.
Conquistas institucionais e de resultado concreto podem ser observadas em relação a diversos outros movimentos. É o caso da criação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), com status de ministério e a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial. O número de universidades públicas que passaram a adotar cotas raciais – muito estimuladas pelo próprio texto do Reuni, que propõe medidas de democratização do acesso a essas instituições – e a lei que institui o crime de preconceito racial com pena de reclusão também são indicativos do crescimento do debate no país.
Da mesma forma, a criação da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SEPPM), transformada em Ministério no último mês de março, significou avanço institucional que deu força à consolidação da Lei Maria da Penha, também criada durante o governo do presidente Lula, que endureceu as penas para crimes de violência doméstica contra a mulher.
Mas a política de participação social que recebeu mais elogios do conjunto dos movimentos foi, sem dúvida, a realização de conferências temáticas. Estudo do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) concluiu que as dezenas de conferências nacionais realizadas nos últimos anos, reunindo representações sociais com interesses específicos, tiveram forte influência na aprovação de leis pelo Congresso Nacional, transformando debates teóricos em medidas práticas. A pesquisa, denominada “A Democracia Brasileira entre Representação e Participação. As Conferências Nacionais e o Experimentalismo Democrático Brasileiro”, abordou 80 conferências realizadas entre 1988 e 2009 e relacionou as diretrizes traçadas em cada uma com as proposições legislativas no Congresso. A maior parte das conferências foi realizada a partir de 2003, durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A relação profícua entre governo e movimentos, sobretudo os que se preocuparam em pressionar com mobilizações de rua, é muito bem expresso no documento da Confederação Nacional de Associações de Moradores (Conam) para as eleições 2010:
“Ao longo da década de 90 lutamos e derrotamos o neoliberalismo que pregava o Estado mínimo privatista, vendeu nossas empresas públicas ao capital internacional com alegação de que eram ineficazes e deficitárias este projeto foi à marca da política dos tucanos por dez anos.
A partir de 2002, um novo período de desenvolvimento foi iniciado. Começava então, a retomada do Estado como indutor do desenvolvimento e da valorização do patrimônio público. (…)
Para a luta do movimento comunitário, os programas de habitação popular via entidades (Programa Crédito Solidário – PCS, Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social – FNHIS e Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV), para famílias de zero a três salários mínimos, devem ser aprimorados e alcançar maior parcela da população. (…)
Esse conjunto de ações trouxe benefícios diretos na vida das pessoas, refletido no maior acesso aos serviços de saúde, educação, assistência social, moradia digna, entre outros, transformando milhões de brasileiros e brasileiras em cidadãos e cidadãs, com direito a emprego, acesso a crédito, aumento do poder compra, em fim possibilitando as realizações pessoais e coletivas, que antes eram consideradas simples teses ou utopias em realidade.”