Egito vota Constituição e ativistas protestam contra o Exército

O painel de 50 especialistas encarregados da reforma da Constituição do Egito celebra uma reunião final, nesta segunda-feira (2), antes de entregar o projeto ao presidente interino, Adly Mansour, que deve convocar um referendo para a sua aprovação. No domingo (1º/12), manifestantes entraram em confrontos contra as forças de segurança nas ruas da capital, Cairo, em protestos contra uma legislação que, segundo os ativistas, reforça o poder político do Exército.

Egito - AFP

Um grupo de quatro artigos controversos sobre o prazo para a convocação de eleições, a composição do parlamento – que ficou à discrição do mandatário interino – e depois sobre as cotas para setores dos sindicatos, camponeses, jovens, cristãos e deficientes foram os mais debatidos.

O fim dos trabalhos foi anunciado um dia antes do prazo fixado, que terminaria nesta terça (3). Na prática, dá início à corrida para as eleições presidenciais e parlamentares, esperadas para a retomada da constitucionalidade no país.

No início de julho, a deposição do primeiro presidente democraticamente eleito no Egito, Mohammed Mursi, filiado à Irmandade Muçulmana, levou de volta ao poder o Exército e, depois dele, um governo interino apoiado pelas Forças Armadas.

O setor militar esteve diretamente ligado ao governo egípcio durante o governo ditatorial de Hosni Mubarak (1981-2011); seu envolvimento no processo de destituição de Mursi e na elaboração de uma nova Constituição tem causado protestos massivos reprimidos violentamente.

Confrontos internos e oposição

A destituição de Mursi foi provocada pelas manifestações de milhares de egípcios contrários aos rumos do seu governo e à percepção de “islamização” das leis do país. Entretanto, o envolvimento direto do Exército, liderado pelo general Abdul Fattah Al-Sisi e a própria destituição de um presidente eleito levou outros milhões às ruas em protesto, sobretudo liderados pela Irmandade Muçulmana.

A seguir, a detenção de líderes islamitas religiosos e políticos – principalmente do Partido da Liberdade e Justiça, de Mursi, afiliado à Irmandade – e a lei de manifestações promulgada pelo governo interino para regular o direito ao protesto intensificaram as revoltas.

Além disso, a aplicação a severas penas de prisão a 21 ativistas femininas da Irmandade Muçulmana – banida do cenário político por outra regulamentação governamental – e a férrea oposição a agrupações laicas constituem outro elemento combustível à volátil situação do país.

Neste domingo, manifestantes que protestavam contra a nova Constituição entraram em confronto com as forças de segurança, que dispararam bombas de gás lacrimogênio.

O rascunho de Constituição apresentado reflete como o equilíbrio de poder mudou no Egito desde que os generais seculares depuseram o ex-presidente Mursi, em julho, depois dos protestos massivos contra o seu governo. O texto contém uma linguagem que pode servir para banir completamente partidos islâmicos, de acordo com a agência de notícias Reuters.

“O povo quer derrubar o regime”, bradavam centenas de manifestantes que reuniram-se na Praça Tahrir, epicentro dos protestos massivos de 2011, que derrubaram o regime autocrático de Mubarak.

Alguns dos manifestantes disseram não pertencer à Irmandade Muçulmana. “Quero o Sisi fora e um fim real ao controle militar”, disse Ramez Ibrahim, 32, um professor de ciência política, em referência ao general Al-Sisi, que liderou a deposição de Mursi.

Veículos do Exército movimentavam-se para dispersar os manifestantes e, depois, selou a praça completamente. Mais cedo, ativistas puseram fogo em um caminhão da polícia perto da Universidade do Cairo.

O governo se diz determinado a implementar a lei, aprovada na semana passada, que restringe de forma significativa os protestos. Criticada até pelos Estados Unidos, a regulamentação endureceu os temores dos ativistas pró-democracia sobre o futuro das liberdades políticas no Egito, afirma a Reuters.

Assembleia vota a constituição

A destituição de Mursi desencadeou o período mais violento de crise da história moderna do Egito, com centenas dos seus apoiadores mortos e ataques armados contra as forças de segurança tornando-se frequentes.

Cerca de 200 policiais e soldados foram mortos no que o governo interino, respaldado pelo Exército, tem chamado de “guerra contra o terrorismo”. A Irmandade, entretanto, afirma estar resistindo pacificamente à tomada militar.

Próxima à Praça Tahrir, a Assembleia constituinte estava votando sobre a proposta de Constituição cujas provisões incluem o banimento de todos os partidos formados sobre uma base religiosa, embora os islamitas tenham vencido as eleições pós-Mubarak.

O projeto também amplia uma lista de privilégios que já beneficia o Exército, ao exigir a aprovação do Conselho Supremo das Forças Armadas para a escolha de um ministro da Defesa que servirá por oito anos, a partir da aprovação do documento. O texto não indica como ele será escolhido, ou quem poderá demiti-lo.

A nova Constituição substituirá a que foi elaborada por uma assembleia controlada pelos islamitas e ratificada por Mursi no ano passado, depois de ser aprovada através de um referendo. O novo texto remove adições feitas pelos islamitas no ano passado.

Segundo a Reuters, o Partido Nour – islamita e ultraconservador que apoiou a destituição de Mursi – foi descrito pelo rascunho como “satisfatório”.

Com agências,
Da redação do Vermelho