Direita chilena quer incluir "fidelidade" em direitos homossexuais

Perto de ser aprovada pelo Legislativo chileno, a primeira lei de direitos civis para os homossexuais no país encontrou um novo obstáculo. O projeto da oposição exige uma cláusula de fidelidade para aprovar o AVP (acordo de vida em casal), lançado durante o governo anterior, do ex-presidente Sebastián Piñera, e que se assemelha, no Brasil, à Lei de União Estável.

Por Victor Farinelli, na Opera Mundi

Direita chilena quer incluir "fidelidade" em direitos civis homossexuais - Divulgação

O texto proposto pelos deputados Arturo Squella, da União Democrata Independente, de extrema direita (UDI), e Cristián Monckeberg (presidente do partido Renovação Nacional, direita moderada) fala que os envolvidos em união civil através do AVP devem estabelecer o compromisso de manter uma relação de respeito, fidelidade e proteção mútuas.

Segundo Squella, a proposta pretende tornar o projeto mais sério. “Se os casais gays querem ter uma instituição parecida com o matrimônio, precisam se comprometer com valores que um matrimônio requer, ou então seria como uma amizade colorida institucionalizada”, disse o deputado, em entrevista a uma rádio.

Na mesma entrevista, ele também rechaçou comentários de que havia uma contradição pelo fato do ex-presidente Piñera ter sido o impulsor do projeto, e agora os partidos que o sustentavam serem os que parecem tentar obstaculizar o seu avanço. “O AVP atrasou no governo anterior porque queríamos o melhor projeto, e agora o governo Bachelet tenta acelerar a tramitação sem se importar com o resultado final”, reclamou Squella.

Rapidamente, surgiram reações nos movimentos que defendem os diretos dos homossexuais do país, que viram na iniciativa uma forma de discriminação. A Fundação Iguales criticou os deputados por querer incluir na lei mecanismos que são diferentes da lei de matrimônio comum. “Se esses compromissos fossem tão importante para os deputados, estariam na lei que eles querem que seja exclusiva dos heterossexuais. Nós não pedimos nada novo ou diferenciado, queremos os mesmos direitos e as mesmas regras”, explicou o assessor de comunicação, Nicolás Levy.

Já para o Movilh (Movimento Para Integração e Liberação Homossexual), o texto, além de discriminatório, recupera argumentos utilizados no passado pelos que eram contra o divórcio no Chile. Segundo Rolando Jiménez, porta-voz do movimento, “as leis civis estabelecidas na ditadura falavam na fidelidade e respeito mútuo como elementos em defesa dos valores da família, e com isso adiaram por 20 anos a instituição da lei do divórcio no país”. O Chile foi o último país do continente americano a ter o divórcio legalizado, em 2004.
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Jiménez diz temer que a proposta dos partidos de direita seja uma armadilha, para impedir que um casal unido através do AVP possa se separar legalmente. “O mais adequado, e o que nós esperamos, é que o Congresso a rejeite e a considere discriminatória. As ideias que precisam ser pensadas em gerar igualdade, não uma instância especial que nos trate como cidadãos estranhos ou cujos direitos têm que ser diferentes”.

Em paralelo ao projeto do AVP, o Executivo chileno trabalha, junto com o projeto de reforma constitucional, uma mudança na lei de matrimônio que o tornará acessível tanto para casais homossexuais quanto heterossexuais, permitindo a ambos o direito de adoção. A secretária geral da Presidência, Ximena Rincón, responsável pelo projeto da reforma, disse em setembro, durante anúncio da proposta, que a mudança na lei não esbarra no AVP e tampouco o invalida se for aprovada.

“Vários países possuem uma lei de união estável e ao mesmo tempo permitem o matrimônio para casais de diferentes orientações sexuais. Vamos aprovar o AVP antes da reforma e dar esse passo fundamental em termos de direitos civis no Chile”, analisou a secretária.