Alexandre Lucas: A comunidade do Gesso e as universidades
“As universidades têm que ter a dimensão que a sua presença na comunidade é uma trama de trocas de saberes e fazeres, onde é preciso refletir sobre as diversas narrativas que constituem a comunidade, para que o saber da academia não seja um conjunto de prepotência intelectual, desvinculada da realidade”.
Por *Alexandre Lucas
Publicado 05/02/2018 10:54 | Editado 04/03/2020 16:23

As faltas de diálogo e de organização provocam o isolamento político e tendem a ampliar o distanciamento para a resolução das demandas sociais, neste contexto é essencial a amplitude de compreensão dos sujeitos que compõe o território e o lugar e a capacidade de impulsionar o desenvolvimento social com protagonismo popular. Na comunidade do Gesso, no Crato-CE, o Coletivo Camaradas tem uma perspectiva de atuação pautada pela conversação dentro de uma rede de articulação denominada “Território Criativo do Gesso”, que visa potencializar as ações das instituições e grupos que atuam dentro e no entorno da comunidade situada entre quatros bairros: São Miguel, Pinto Madeira, Santa Luzia e Centro.
Neste arcabouço de articulações e de possibilidades, as universidades podem ser elementos centrais para impulsionar o processo de desenvisibilização territorial, criação de uma narrativa desenvolvimentista e popular e contribuir para o processo de democratização do conhecimento e ampliação da visão social de mundo.
Esse é o caminhando que vem sendo trilhando pelo Coletivo Camaradas para comprometer as universidades da região do Cariri no sentido de prolongar o seu tripé “Ensino, Pesquisa e Extensão”, na dimensão da prática social dos indivíduos, tendo como espaço laboratorial a paisagem cultural e as narrativas sociais da comunidade do Gesso.
Esse entendimento parte do pressuposto da necessidade de trabalho processual que torne a presença das universidades um corpo não estranho ao lugar e que tenha a capacidade de criar teias multirelacionais com instituições e grupos que atuam no território.
Isso visa inibir a compreensão de evento de universidade em comunidade que muitas vezes tem um caráter nocivo, baseado no assistencialismo e no “selfianismo”, ou seja, na ação que não contribui para o protagonismo comunitário e que enxerga a ação acadêmica como caridade e a comunidade como coitadinha.
O norteamento deve caminhar no sentido de buscar a conjugação entre o saber acadêmico e a prática social dos sujeitos, apontando a necessidade de conceber a comunidade para além da comunidade e substanciado por um processo formativo contínuo que possibilite repensar a prática social para uma construção de organização e desenvolvimento comunitário.
As universidades têm que ter a dimensão que a sua presença na comunidade é uma trama de trocas de saberes e fazeres, onde é preciso refletir sobre as diversas narrativas que constituem a comunidade, para que o saber da academia não seja um conjunto de prepotência intelectual, desvinculada da realidade.
Possibilitar vivência, experimentação, confluência das vozes diversas, sistematização e reflexão cientifica, diálogos e pontes, apresentar potências criativas e mobilizadoras para a qualidade de vida e “desilhar” universidade e comunidade de forma permanente e interligada a luta pela democratização dos saberes e dos espaços de poder, possivelmente sejam alternativas para a construção e o fortalecimento de tipos novos de universidades e de experiências comunitárias politizadas e comprometidas com o direito à cidade nas suas múltiplas dimensões.
*Alexandre Lucas é pedagogo e integrante do Coletivo Camaradas.
Opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as opiniões do site.