Companheira Dilma, não atravesse o Rubicão

Quando meu inimigo me elogia eu devo começar a rever a minha prática.

Quando os generais romanos voltavam das suas longas e intermináveis guerras de conquistas eles tinham o direito de desfilar pelas ruas de Roma para serem aclamados pelo povo como heróis.

Precavido, o imperador determinava duas providências que deveriam ser rigorosamente cumpridas. Primeiro, as tropas sob o comando do general deveriam ficar acantonadas antes do riacho Rubicão. O novo “herói” entrava sozinho nas muralhas de Roma e assim não era tentado a um levante no qual estaria combinado os dois ingredientes essenciais: o apoio das massas e a força militar de sua tropa. O avanço da tropa além do Rubicão era considerado por Roma como declaração de guerra. A segunda providência era colocar um fiel escudeiro do imperador, a centímetros apenas de distância do homenageado, seguindo seus passos e repetindo intermitentemente: “lembra-te que tu não és o imperador”, para dissuadir qualquer arroubo dos novos heróis.

Centenas de anos depois o espanhol Cortez desembarcou no que hoje seria o México e recebeu uma tenaz e bem estruturada resistência por parte do povo Asteca, senhores daquelas terras e donos de uma vasta cultura.

Temeroso de que a inesperada e bem organizada resistência pudesse amedrontar a sua tropa e ocasionasse uma debandada, Cortez determinou que se queimassem todas as caravelas, com o que selava a sorte de sua expedição: a glória ou a morte.

Esses dois episódios históricos, extremos, até hoje são emprestados aos discursos contemporâneos quando se quer sinalizar que uma determinada atitude não tem volta. Se diz, então, que se “atravessou o rubicão e queimou as caravelas”. Como se percebe, são dois episódios distintos, em épocas completamente diferentes, mas como a maioria dos que pronunciam a frase não sabe disso e, talvez, nem os que a escutam, o fato fica como sendo único e indissolúvel.

No caso em questão o episodio é lembrado para lembrar a companheira Dilma que o tratamento por ela dispensado aos movimentos sociais no projeto de aprovação do salário mínimo pode representar uma ruptura definitiva. Assim, apelo para que a companheira Dilma não atravesse o rubicão e nem queime as caravelas. Não rompa com o movimento popular.

Não se impressione com a facilidade com que você conseguiu votar a matéria. Como disse em colunas anteriores, a esquerda vai se dando conta de que quem ganha governa e quem perde faz oposição e, por outro lado, a direita começa a ser pressionada para encerrar a demagogia e não comprometer a lucratividade de seus amigos mega empresários.

Quando a Veja (23.02) diz que “Prevaleceu o bom senso”, enaltecendo a aprovação dos 545 reais para o Salário Mínimo pela Câmara dos Deputados; quando figuras como Mirian Leitão, sempre tão azeda, diz que a proposta da direita (PPS, PSDB) é demagogia e os editorialistas da Globo dizem que Dilma passou no teste político, pois “o país não pode correr o risco de descontrole financeiro”, nós estamos diante de um fato de pólos invertidos.

E a Veja, novamente, após lembrar que o salário mínimo já é de 300 dólares recorda que a bandeira das centrais sindicais era um salário mínimo de 100 dólares. E depois, sem meias palavras, simplesmente defende o congelamento do salário mínimo por um período como, segundo ela, os americanos fizeram entre 97 a 2007.

Não precisou os guarda livros virem a público fazerem terrorismo, a Veja se encarregou de fazê-lo. Diz que cada real aumentado no salário mínimo provoca uma despesa adicional de 300 milhões de reais nas contas públicas; que o aumento provoca rombo na previdência, descontrole das contas públicas, da inflação e de outras tragédias mais. Nenhuma linha contra o aumento de juros, cujo cada 1% de aumento provoca aumento de19 bilhões.

Como a Senhora vê, está explicada a sua facilidade. Os parlamentares de direita, de quem Veja e outros meios são porta-vozes, apresentavam proposta de elevar o salário mínimo torcendo para não ser aprovado. Alias, só apresentavam tais propostas por que tinham certeza de que a mesma não seria aprovada.

Esses episódios dão bem o tom de quem está com quem!

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