Estado Social
No último dia 25, aniversário de 30 anos da derrota da emenda Dante de Oliveira, das Diretas-já, no Congresso, eu estava em andanças pelos sertões de Goiás. De parceiro, um técnico agrícola que me guiava por umas quebradas aonde eu precisava ir. E a conversa se enveredou pela política nacional.
Publicado 29/04/2014 16:09
A certa altura, ele me disse: “dos presidentes que eu já vi passar, eu admiro o general Figueiredo e o Lula”. Diante de indagações que fiz, ele explicou que havia apreciado o gesto de Figueiredo de deixar o poder para um sucessor civil, assim demarcando o fim do regime militar. Com milhões de pessoas nas ruas, é certo, mas tudo em paz. E de Lula, porque “ele implantou o Estado Social, pacificamente”.
De pronto, me lembrei da famosa frase do pensador e político alemão Karl Kautsky, dita e repetida nas polêmicas que ele mantinha com seus conterrâneos Marx e Engels, de quem havia sido seguidor. Era assim: “…a Social-democracia é um partido revolucionário e não um partido que faz revoluções”.
A luta de classes para ele não deveria mais existir. Os operários e demais oprimidos teriam que se contentar com gentilezas da burguesia. Mas, isso foi lá atrás, antes e depois da revolução russa de 1917 e do advento do leninismo. Kautsky morreu em 1934, quando já estava em curso, em seu país, a implantação do nazismo de Adolf Hitler.
Finda a Segunda Guerra, porém, os ideais social-democratas ressurgem com força na Europa, depois de 1945. Os primeiros países a adotá-los foram Alemanha, França e Inglaterra, esta com seu “Social Welfare State” (Estado do Bem-estar Social). E também na Escandinávia, em especial na Suécia, que virou símbolo dessa forma de organização político-social, por assegurar amplas liberdades individuais.
Essas nações se baseavam no pensamento de John Maynard Keynes, um britânico que morreu em 1946, mas que apontou os caminhos para um capitalismo menos cruel, no pós-guerra. Sua tese principal é a da “Função Consumo”. A circulação do dinheiro, inclusive nas mãos dos mais pobres, era, na sua concepção, a melhor maneira de o capitalismo sobreviver sem revoltas ou revoluções naqueles países.
Isso foi possível, contudo, por causa da “exportação das contradições”, como dizia Lênin ao explicar o imperialismo. Ou seja, do ponto de vista global, a exploração das classes menos aquinhoadas passou a ser menor nos países centrais e maior nos países dominados, seja pelo colonialismo, seja pelo imperialismo. Essa é a lógica social-democrata dos países centrais.
Na Grã-Bretanha, o comando sempre ficou com a chefia do estado, que está nas mãos da monarca de plantão, no caso a Rainha Elizabeth II, que está no poder desde meados do século passado. A governança, porém, passou a ser exercida por um primeiro-ministro escolhido pelo parlamento, numa complexa interação com as centrais sindicais e outras entidades representativas da sociedade civil.
Este formato é que passou a ser chamado de “Estado Social”. No Brasil, porém, as políticas de distribuição de renda, ou de combate à pobreza, implantadas por Lula, seguem os princípios keynesianos, mas a gestão do estado mantém padrões liberais, que vêm da origem do capitalismo. Não caberia, pois, a designação de Estado Social.
De todo jeito, voltando ao roceiro goiano, a saída de Figueiredo, embora mal-humorada, e a forma suave das recentes mudança nas relações econômicas e sociais chamam a atenção do mundo inteiro.
Isto, apesar de alguns setores da esquerda latino-americana acusarem empresas brasileiras de se implantarem em países vizinhos (ou em outros continentes) para usarem mão-de-obra e recursos naturais mais baratos. Exportando contradições, pois. Ou, se quiserem, um Brasil imperialista.
De qualquer modo, esta prática, caso verdadeira, estaria muito distante da forma de ação dos Estados Unidos e seus aliados europeus. Basta ver como agem, por exemplo, com relação a estados do Oriente Médio e de outras partes do mundo onde a religião ainda está imbricada ao poder.
Ali, como forma de dominação, fomentam diferenças religiosas, que às vezes são concepções muito próximas uma das outras, mas geram conflitos inexplicáveis. Isto, é claro, quando não mandam tropas e suas pesadas artilharias.