Volks vai fechar três fábricas na Alemanha e cortar salários
Sindicalistas acusam omissão dos executivos numa estratégia de investimentos para enfrentar concorrência tecnológica e medidas mesquinhas e fáceis para economizar
Publicado 29/10/2024 17:18 | Editado 30/10/2024 08:47

A Volkswagen, uma das maiores montadoras de automóveis do mundo, está em meio a uma crise interna, com planos controversos de fechar pelo menos três fábricas na Alemanha e cortar dezenas de milhares de empregos. O anúncio, feito pela chefe do conselho de trabalhadores, Daniela Cavallo, nesta segunda-feira (28), gerou uma forte reação de sindicatos e colocou a administração da empresa sob pressão. Os planos incluem também cortes em outras unidades e possíveis reduções salariais, afetando todas as fábricas alemãs da companhia.
Thomas Schäfer, CEO da Volkswagen, justificou os cortes em comunicado, destacando que as fábricas alemãs estão enfrentando custos operacionais de 25% a 50% acima do previsto, tornando-as duas vezes mais caras do que as dos concorrentes. Segundo Schäfer, a situação exige “medidas abrangentes” para recuperar a competitividade e alcançar a meta de retorno sobre as vendas de 6,5% até 2026. Gunnar Kilian, diretor de recursos humanos da empresa, afirmou que, sem essas medidas, a Volkswagen não conseguirá arcar com os investimentos necessários para o futuro, sugerindo a necessidade urgente de mudanças estruturais.
A empresa argumenta que a escalada dos custos, somada à concorrência de carros elétricos chineses de baixo custo, ameaça sua posição no mercado europeu e sua capacidade de inovação. No mês passado, a Volkswagen revelou que não deve atingir sua meta de economia de 10 bilhões de euros até 2026, um fator que também impulsionou a decisão de reavaliar a estrutura de custos.
No entanto, ainda em setembro, Daniela já denunciava as razões que ela considera plausíveis para a crise: “A Volkswagen não está sofrendo por causa das suas localizações na Alemanha e dos seus custos de pessoal na Alemanha. “A Volkswagen está sofrendo porque o conselho não está fazendo o seu trabalho.”
A empresa precisa recuperar novamente a liderança tecnológica. Para conseguir isso, o desenvolvimento técnico deve ser fortalecido em vez de adiar constantemente produtos e projetos. Para a líder metalúrgica, isso inclui saltos significativos na área de software ou o desenvolvimento de um sistema de bateria competitivo: “Temos que resolver a nossa obsessão por regras, temos que acabar com a nossa loucura de documentação e com os muitos processos duplos e triplos de segurança. E tudo isso é uma tarefa de liderança!”, complementa Daniela.
Mas em vez de abordar os problemas apresentados, os gestores, desde o chefe financeiro da VW, Arno Antlitz, ao chefe da marca VW, Thomas Schäfer, até ao CEO Oliver Blume, querem facilitar as coisas para si próprios, segundo ela. Eles querem fechar locais e reduzir o emprego. Daniela chama os planos históricos da administração de fechar fábricas pela primeira vez “uma declaração de pobreza” e uma “declaração de falência”.
Ela já tinha deixado claro, antes que os gestores pudessem tomar o microfone na reunião de empresa, que não era o mercado que era demasiado pequeno, mas que a gestão estava seguindo a estratégia errada para vender mais carros. Ela também culpa a administração por subestimar o mercado de propulsão híbrida. “Especialmente em tempos difíceis, precisamos de coragem para investir mesmo em tempos de crise e, assim, lançar as bases para as inovações de amanhã”.
Reação dos trabalhadores e sindicatos
O anúncio foi recebido com forte oposição do conselho de trabalhadores e dos sindicatos. Daniela Cavallo afirmou que “nenhuma fábrica está segura” e prometeu resistir aos cortes planejados. A liderança sindical do IG Metall, através de Thorsten Gröger, declarou que a luta pelos empregos será intensa. “Se a diretoria quiser anunciar o fim da Alemanha, eles devem esperar uma resistência que não podem imaginar”, disse Gröger, alertando para um confronto direto caso a Volkswagen persista nos planos de fechamento.
A insatisfação dos sindicatos também se manifesta nas negociações salariais. A próxima rodada está marcada para quarta-feira (30), e a Volkswagen já sinalizou cortes salariais de 10%, sem previsão de aumentos pelos próximos dois anos. Em setembro, a empresa encerrou um acordo de segurança de emprego que estava em vigor há mais de três décadas, permitindo demissões a partir de 2025. Esse rompimento gerou alarme entre os trabalhadores, que veem a medida como uma ameaça à estabilidade de longo prazo.
Intervenção do governo alemão
A repercussão dos planos da Volkswagen chegou ao governo alemão. O chanceler Olaf Scholz, através de um porta-voz, expressou preocupação com o impacto dessas medidas sobre os empregos. O governo enfatizou que decisões da diretoria que possam ser “equivocadas” não deveriam prejudicar os trabalhadores, ressaltando a importância de proteger os empregos no setor automobilístico – um pilar da economia alemã.
A posição do governo reflete o temor de que o fechamento de fábricas da Volkswagen possa desencadear uma crise em cadeia no setor industrial alemão. A Volkswagen emprega cerca de 120 mil pessoas na Alemanha, com dez fábricas espalhadas pelo país, incluindo seis no Estado da Baixa Saxônia, onde se localiza a sede da empresa em Wolfsburg, empregando aproximadamente 60 mil trabalhadores.
Impacto na economia e no setor automotivo
A decisão da Volkswagen de fechar fábricas na Alemanha é um sinal preocupante para a economia nacional, que tem enfrentado desafios em manter sua competitividade. O aumento dos custos operacionais, as pressões ambientais e a chegada de concorrentes internacionais de carros elétricos estão forçando mudanças estratégicas nas empresas alemãs. O anúncio da Volkswagen segue uma tendência de revisão de estruturas produtivas que também tem sido observada em outras grandes empresas europeias do setor automotivo.
Para a Volkswagen, os cortes são vistos como um caminho necessário para sustentar sua posição de liderança e financiar inovações futuras. Porém, esse movimento é arriscado, pois pode enfraquecer a relação com os trabalhadores e afetar a imagem da empresa no mercado europeu.
Perspectivas e próximos passos
A situação entre a Volkswagen e os sindicatos ainda está longe de uma resolução. As negociações coletivas, que serão retomadas em breve, representarão um teste de força entre a administração e os trabalhadores. Cavallo criticou a postura da Volkswagen, afirmando que a empresa precisa apresentar “conceitos viáveis” para o futuro, em vez de insistir em cortes e medidas de austeridade.
Para os analistas, o desafio será encontrar um equilíbrio entre a necessidade de reduzir custos e manter a confiança dos trabalhadores e do governo alemão. O futuro da Volkswagen na Alemanha está em jogo, e a resolução desse impasse poderá definir o rumo da montadora em meio a um setor automobilístico que passa por transformações profundas.
Com informações de IG Metall e agência DPA