Morte do papa Francisco é uma perda para a humanidade
Sumo pontífice da Igreja Católica deu imensas contribuições para as causas mais fundamentais das pessoas e para a preservação do planeta
Publicado 24/04/2025 14:25
A morte do papa Francisco causou justificada comoção pelos continentes. Cento e trinta delegações de países, 50 chefes de Estado e dez monarcas irão reverenciar a memória e o legado de Francisco, no enterro que acontece, neste sábado, 26, na Basílica de Santa Maria Maior. O presidente Lula estará presente com uma comitiva que inclui os chefes dos demais Poderes da República. No Brasil, vivem cerca de 13% do total de católicos do mundo, 183 milhões de pessoas, segundo o Vaticano.
O papa Francisco personificou princípios de solidariedade e justiça, demonstrando compaixão pelos que sofrem sob o peso das guerras, das perseguições, das discriminações. Na condição de Sumo Pontífice, falou em defesa dos pobres e injustiçados e construiu pontes entre concepções religiosas. Francisco defendeu um mundo com respeito aos imigrantes, que preserve o planeta e proteja os direitos humanos, tornando a Igreja Católica mais inclusiva.
Em sua primeira viagem como papa ao Brasil para participar da 28ª Jornada Mundial da Juventude (JMJ), realizado no Rio de Janeiro em julho de 2013, Francisco pediu aos jovens que fossem “revolucionários”. “Peço para vocês irem contra a corrente, peço que se rebelem contra essa cultura do provisório. Tenho confiança em vocês em irem contra a corrente. Também tenham a coragem de ser felizes”, afirmou.
Sua primeira viagem papal foi a Lampedusa, ilha italiana que se tornou ponto de referência para requerentes de asilo e migrantes. Visitou também Lesbos, ilha grega emblemática da crise migratória. “Estou aqui para vos dizer que estou perto de vós, estou aqui para ver os vossos rostos, para olhar nos vossos olhos: olhos cheios de medo e esperança, olhos que viram violência e pobreza, olhos cheios de muitas lágrimas”, declarou. O Mediterrâneo “está se tornando um cemitério frio, sem lápides”, disse. “Peço-vos, vamos parar com este naufrágio da civilização.”
A causa palestina também sempre esteve em suas preocupações. Um dia antes de sua morte, em discurso na Praça de São Pedro, no Domingo de Páscoa, Francisco disse estar pensando “no povo de Gaza, e em sua comunidade cristã em particular, onde o terrível conflito continua a causar morte e destruição e a criar uma situação humanitária dramática e deplorável”. Logo após a sua a morte, o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, enviou condolências ao Vaticano, dizendo que Francisco foi “símbolo de tolerância, amor e fraternidade”.
Como papa, Francisco sempre combateu a extrema-direita. O arcebispo Paul Gallagher, ministro das Relações Exteriores do Vaticano e assessor de Francisco, disse que quando ele se mostrou decepcionado “com certas escolhas políticas, o silêncio lhe sobreveio”, numa referência à intolerância e ao ódio, às deportações em massa nos Estados Unidos sob o governo de Donald Trump e à expansão do autoritarismo.
Ao longo de seus doze anos como papa, Francisco também levou a Igreja Católica a enfrentar com mais firmeza escândalos de sua própria história. Assim que foi eleito, ordenou uma investigação e reforma que alterou a estrutura de supervisão das atividades financeiras e administrativas no banco do Vaticano, envolvido numa série de processos de lavagem de dinheiro. Também enfrentou os escândalos de abuso sexual na Igreja.
Outro ponto criticado por ele foi o sistema financeiro. “Que se passa no mundo de hoje que, quando um banco entra em bancarrota, aparecem imediatamente somas escandalosas para o salvar, mas quando há essa bancarrota da humanidade não há nem uma milésima parte para salvar esses irmãos (imigrantes e refugiados) que sofrem tanto?”, questionou. Na Laudato Si’, primeira encíclica papal focada exclusivamente no meio ambiente, além de pedir proteção ao planeta Francisco denunciou a exploração dos pobres pelos “excessos” do capitalismo.
O papa foi também decisivo na aproximação entre o governo estadunidense de Barack Obama e Cuba, um acontecimento histórico. Na China, Francisco chegou a um acordo com o governo para encerrar a disputa de poder de décadas pelo direito de nomear bispos no país. O acordo concedeu à Igreja maior acesso à China e legitimou sete bispos indicados por Pequim.
Em 2015, Francisco se tornou o primeiro papa a discursar no Congresso dos Estados Unidos. Durante a eleição presidencial estadunidense em 2016, Francisco criticou Trump por preferir construir muros em vez de pontes. “Uma pessoa que pensa apenas em construir muros, onde quer que estejam, e não em construir pontes, não é cristã”, disse. Quando questionado sobre padres gays, e ele respondeu: “Quem sou eu para julgar?” Em sua primeira exortação apostólica, afirmou que queria uma igreja “com as portas sempre abertas”.
Em 2023, Francisco realizou pela primeira vez uma reunião de bispos do mundo que incluiu mulheres e leigos como membros votantes. O sínodo, como a reunião é conhecida, abordou tópicos como o papel das mulheres, o celibato e o estado civil dos padres. Após o evento, Francisco permitiu que padres abençoassem casais gays.
A morte de Francisco é uma perda para a humanidade. Sua conduta como papa contribuiu em grande medida para que temas afeitos aos direitos mais fundamentais das pessoas fossem debatidos, iniciativas que combateram a ascensão da extrema-direita e projetaram horizontes para a luta democrática. O mundo progressista, sobretudo, perde um de seus mais destacados expoentes.