A eficiência ruralista e o novo índice de produtividade

Se por um lado os grandes produtores rurais adoram enaltecer a eficiência na produção agrícola brasileira, por outro fazem uma contraditória oposição à proposta de mudança dos atuais índices de produtividade. Os atuais índices – que podem servir como indicadores de desapropriação para reforma agrária – são baseados em dados de 1975.

Parece mentira, mas é verdade: querem a manutenção de informações sobre a produção de trinta anos atrás.

Há 30 anos a agricultura no cerrado brasileiro dava seus primeiros passos. Eram desenvolvidas as primeiras variedades adaptadas para esta região. A própria Embrapa engatinhava. Não se tinha dados técnicos suficientes sobre uma série de fatores. A infraestrutura era ainda pior que a atual. Os solos precisavam ser corrigidos e faltavam insumos básicos. Assistência técnica praticamente inexistia. Mas hoje em dia, falar em se produzir 1200 quilos de soja por hectare em Sorriso (MT), por exemplo, é uma piada de mau gosto.

Verdade seja dita: a tão propalada eficiência do agronegócio brasileiro se deve muito mais ao trabalho criativo e inovador de nossos cientistas, patrocinado por instituições estatais de pesquisa (investimento público), tais como Embrapa, universidades e diversos outros centros de investigação, do que qualquer outro tipo de empreendedorismo rural.

Mas independente disto, a pose de vítima que encena os ruralistas em relação a essa tão tardia redefinição dos índices de produtividade, totalmente desatualizada, merece o Oscar da dramaturgia.

A propriedade rural precisa exercer sua função social e não apenas ser objeto de especulação e reserva de valor. Estranho que os mesmos ruralistas que se opõem à atualização dos índices de produtividade, a cada dia exigem mais da produção dos seus trabalhadores, explorando sempre mais da mão de obra que por muitas vezes é até escrava. Ou seja, os trabalhadores têm que ser produtivos, o latifúndio não. Também os pesquisadores e professores universitários são cada vez mais exigidos em produtividade que será revertida em conhecimentos, produtos e processos para o próprio produtor rural produzir cada vez mais.

Não se trata, portanto, de punir aqueles grandes produtores rurais que se destacam no setor, como quer fazer crer a senadora ruralista Kátia Abreu (DEM), do Tocantins. Muito pelo contrário. Estes podem ficar tranquilos, pois estão bem acima da média. O que não se pode permitir é a especulação, a grilagem e a concentração de terras subutilizadas como faz o proprietário majoritário da Editora Três, que edita certa Revista Istoé, coincidentemente contrária à mudança nos índices de produtividade. Daniel Dantas, denunciado pelo Ministério Público, é também dono de um império de terras e gado no Pará.

A senadora, em um de seus discursos inflamados, disse que "hoje o mercado já expropria quem não é eficiente” e que, portanto, não precisam deste índice de produtividade. Isso seria verdadeiro se a terra não fosse usada como objeto de especulação, como bem contra argumenta o ministro de Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel: “Terra não é uma joia, não é um carro de luxo, não é reserva de valor, não pode servir para especulação. Terra tem que servir para produzir alimentos, é isso que o índice de produtividade determina”. Lastimável que o ex-ministro da Reforma Agrária (isso mesmo, Reforma Agrária) do governo Fernando Henrique, Raul Jungmann, pense diferente.

Reforma agrária não é uma bandeira apenas do MST, entidade satanizada dia e noite pelos ruralistas com o apoio da grande mídia. Reforma agrária é uma exigência da maioria absoluta de uma sociedade que por séculos convive com as maiores concentrações fundiárias do mundo, que só faz aumentar.

Uma área do tamanho aproximado dos estados do Paraná e São Paulo juntos pertence aos 300 maiores produtores rurais brasileiros. Isso ao mesmo tempo em que mais de quatro milhões de famílias não têm um pedaço de terra para plantar. Para não falar de outros absurdos que os ruralistas parecem desconhecer. Fica a impressão que só os representantes do agronegócio trabalham, sendo os demais produtores rurais meros vagabundos.

Certamente a aprovação desta lei não será tarefa fácil. Os mesmos setores que por séculos defendem a concentração de terras no Brasil farão de tudo para até mesmo desestabilizar o governo, como fazem na Argentina. Lá a presidenta Cristina Kirchner ousou encarar o lobby ruralista e pagou caro por sua ousadia. Foi retaliada com o desabastecimento de alimentos, a interdição das rodovias – quando foi possível ver as “colheitadeiras” de última geração com suas cabines climatizadas e GPS – e outras atos golpistas.

Os índices de produtividade, que valerão a partir do próximo ano, serão fixados com base nos dados da Produção Agrícola Municipal (PAM) feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) por microrregião geográfica, a partir da média de produtividade entre 1996 e 2007. Anos com forte queda de preço ou problemas climáticos são excluídos do cálculo.

O velho ditado popular é feliz ao afirmar que “aquele que não deve, não teme”. Resta-nos a pergunta: quem tem medo do novo índice de produtividade?

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