A extravagante Conferência de Herzliya

Esse nome é pouco ou quase nada conhecido fora de Israel: Herzliya. Trata-se de um Centro Interdisciplinar situado ao norte de Israel, uma espécie de Universidade privada e laica, com dois grandes centros de pesquisas. Realiza conferências anuais com pouquíssimo destaque na mídia.

Sionistas na Conferência de Herzliya

Sionistas na Conferência de Herzliya

A décima Conferência ocorreu no final de janeiro e início de fevereiro deste e contou com a ampla presença de diplomatas, altos funcionários de estado, membros do governos e militares de alta patente. Apenas o combativo jornalista Fisk (1) cobriu o assunto. Quero tratar disso, nesta semana.

O que foi essa Conferência em Israel

Essa Universidade possui dois grandes centros de pesquisa. Um deles, que estuda o terrorismo e é dirigido por Shabtai Shavit, ex-diretor do Mossad (serviço secreto) de 1989 até 1996. O outro, estuda política e estratégica e é dirigido por Uzi Arad, que também foi um subdiretor do Mossad. Costumam ser muito concorridas as mesas e os debates e podemos dizer que a elite intelectual direitista de Israel comparece em massa a essas conferências.

Desta feita, o centro dos debates foi difundir ao mundo que Israel é vítima e está sob ameaça. Quando no final de 2008 nós falamos em uma das nossas colunas que os ataques e o massacre de Gaza que Israel perpetrou contra palestinos inocentes, poderia colocar o próprio estado de Israel em cheque isso acabou sendo o centro dos debates. Muitos dos oradores afirmaram que, em especial depois do relatório do juiz judeu Richard Gladstone pediu a condenação de Israel por crimes de guerra contra os palestinos, Israel se sente cada vez mais ameaçada.

Já se sabia que qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo que defender os palestinos e atacar Israel poderá ser acusado de ser anti-semita. Agora Israel eleva o tom desse discurso hipócrita e se faz ainda mais de vítima para tentar atrair a atenção do mundo para si. Chegam a falar que Israel corre o risco de se inviabilizar enquanto estado nacional.

Possa como vítima, posa como excluída. Tenta aparecer como um ente democrático, um estado perfeito, uma democracia em meio a um oceano de ditaduras de xeiques e emires árabes obscurantistas e medievais. Israel tenta passar a imagem de que possui um exército “perfeito”, honesto que, no máximo e de vez em quando, pune um ou outro oficial por ter se excedido. Quem vê de longe e de fora, parece que Israel encontra-se sitiada. É a forte propaganda sionista em defesa dos atos criminosos de Israel e de seu estado colonial.

O que esta em curso é tentar que o mundo esqueça por completo, que apague da sua memória a Operação Chumbo Derretido, que assassinou 1,5 mil palestinos (crianças, mulheres e velhos basicamente), desde dezembro de 2008 e final de janeiro de 2009. Destruiu a Faixa de Gaza, destruiu a sua já precária infra-estrutura, bloqueou ainda de forma mais severa, qualquer passagem de suprimentos, mesmo remédios e alimentos para 1,5 milhão de palestinos.

É preciso fazer com que se esqueça e se possível se enterre de vez o bem elaborado e justo Relatório Gladstone. Este juiz sul-africano, judeu por confissão, condenou duramente Israel por crimes de guerra e pediu que a Comissão dos Direitos Humanos da ONU condenasse Israel. O governo sionista tem prazo até abril para responder a todas as acusações, sob pena de ser incurso em leis internacionais. Um dos temas mais usados e cuja tecla foi muito batida foi de que tanto o relatório Gladstone como uma campanha internacional que vem sendo feita vai no sentido de tentar deslegitimar a existência de Israel e seu estado judeu.

Ironia do destino é que esse juiz, que conduziu de forma isenta as investigações em nome da ONU, foi, um dia, muito elogiado por essa mesma Israel que hoje o condena e o chama de traidor. Foi quando ele fez relatório semelhante na guerra da Bósnia para apurar as vítimas de assassinatos e violações pelos sérvios. Goldstone esteve na boca de todos os sionistas e direitistas presentes em Herzliya. Seja Yaossi Gal, Tzipi Livni, Malcoln Hoelein, James Cunningham.

Fisk, jornalista de boa memória, diz que Israel quer que esqueçam tudo de ruim que este estado sionista fez. E relembra alguns fatos inesquecíveis:

• Invasão do Líbano por Israel em 1982: 15 mil palestinos mortos;
• Massacre de Sabra e Shatila em setembro de 1982, por milícias libanesas pró-Israel e sob os auspícios dos sionistas: três mil palestinos mortos;
• Massacre em Qana em Israel em 1996: 106 libaneses mortos sob fogo israelense;
• Massacre de Israel na guerra ao Líbano em 2006: 1,5 mil libaneses massacrados;
• Massacre de palestinos entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009 em Gaza: 1,5 mil palestinos mortos.

Menciono acompanhando Fisk apenas os massacres mais recentes de palestinos e libaneses. Israel insiste em posar de uma democracia legítima e transparente mas, recusa-se a aceitar qualquer investigação isenta, neutra, idônea, quando os resultados lhes ferem interesses estratégicos.

Com isso, Israel vai se isolando cada dia mais da comunidade internacional. Como disse no passado, isso vai fragilizando a sua legitimidade, a sua viabilidade. Crescem as ideias relacionadas com um estado único laico de palestinos e israelenses. Isso enfraquece a proposta de dois estado. Não bastasse tudo isso, há tempos Israel vem propalando – desde que Arafat era vivo em 2004 – de que “não há com quem negociar a paz do lado palestino”.

Isso vai gerando um impasse considerável. Por isso, como tenho dito, vejo a paz cada dia mais difícil de ser conquistada.

Nota

(1) Artigo de Robert Fisk pode ser lido em www.independent.co.uk/…/fisk/robert-fisk-israel-feels-under-siege-like-a-victim-an-underdog-1886332.html

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