A guerra total de Israel contra o povo palestino é constante

Trata-se de uma guerra total de Israel contra o povo palestino que se sustenta na ocupação, anexação e colonização de cada vez mais porções do seu território desde o primeiro dia do Estado e desde antes dele, há pelo menos um século.

Fotomontagem: Cebrapaz

No décimo dia da nova ofensiva contra a Faixa de Gaza, o único alento numa catástrofe contínua é o aumento da condenação ao regime de Israel sobre a Palestina. Além do repúdio às imagens de famílias e vizinhos resistindo à tomada de lares por soldados e colonos israelenses no distrito de Sheikh Jarrah, em Jerusalém, Israel faz o mundo olhar novamente para Gaza e montar o quadro completo: ocupação militar, colonização e apartheid conformam um regime de guerra total contra o povo palestino.

Nomeada em 10 de maio como “Guardiões dos Muros”, a mais recente ofensiva israelense contra a Faixa de Gaza já causou quase 220 mortes, de acordo com o Ministério da Saúde palestino. Destas vítimas, 63 são crianças e 16 são idosos. Dos mais de 1.500 feridos, 450 são crianças. Esta é pelo menos a quarta ofensiva de maiores proporções desde a denominada “Chumbo Fundido”, de 2009, quando um relatório da comissão de inquérito mandatada pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU já indicava que crimes de guerra e crimes contra a humanidade haviam sido cometidos. Mas várias outras agressões e a sistematicidade da violência estruturando a colonização da Palestina de forma perene devem ser evidenciadas neste quadro que não é uma mera repetição de eventos.

No Brasil, a Frente Parlamentar Mista pelos Direitos do Povo Palestino divulgou nota assinada por 59 deputados e senadores, nesta terça-feira (18), condenando “os atos de guerra do Estado de Israel contra populações civis de palestinos” e denunciando a sua “continuada política de limpeza étnica e apartheid” num regime de “ocupação e colonização contra o qual sanções são urgentes e necessárias para alcançar uma paz justa e cumprir com a própria responsabilidade dos Estados terceiros”. Nestes termos, a nota repudia “os laços econômicos, militares e políticos do governo brasileiro com estas violações”, visados desde que o presidente Jair Bolsonaro assinou, em 2019, durante acintosa visita a Jerusalém, o Acordo sobre Cooperação em Questões Relacionadas à Defesa, cuja votação na Câmara dos Deputados está suspensa diante da oposição de partidos e movimentos populares.

Foto: Reprodução

Outro exemplo, na Irlanda, onde o movimento de solidariedade com o povo palestino é vigoroso, a juventude do partido republicano e de esquerda Shinn Féin angariou 50.000 assinaturas até esta quarta-feira (19) à petição para que o governo expulse o embaixador de Israel, enquanto os seus promotores reforçam a demanda para que o governo reconheça o Estado da Palestina. Na semana passada, o parlamentar John Brady instou a comunidade internacional a chamar a política israelense pelo nome: “ilegal, apartheid e crime de guerra”, dizendo que a Irlanda tinha a chance de assim atuar por ter sido eleita para integrar o Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Entretanto, na reunião do órgão da ONU, no domingo (16), quando a ofensiva israelense chegava a uma semana com quase 200 palestinos e cerca de 10 israelenses mortos entre os bombardeios de Israel a Gaza e o lançamento de foguetes do Hamas contra Israel, os Estados Unidos mais uma vez bloquearam uma declaração conjunta que apelaria ao cessar-fogo. Não era, portanto, um reconhecimento do efetivo massacre dos palestinos por Israel ou do regime de apartheid, como diversas vozes têm demandado, mas um apelo ao fim da matança, de momento. Nem assim. Esta teria sido a terceira vez em uma semana que os EUA bloquearam uma declaração neste sentido. O presidente Joe Biden limitou-se a reafirmar a posição sustentada dos Estados Unidos, em qualquer governo de turno: a defesa de Israel, mesmo diante do genocídio.

Reencenando roteiros conhecidos, Israel alega que a ofensiva é uma resposta aos foguetes lançados pelo Hamas, que a “operação”, sempre certeira, moralmente correta e ética, visa aplastar uma ameaça terrorista —por exemplo, com a destruição de células, túneis ou bases, ainda que os destruídos sejam mesquitas, escolas, centros médicos ou edifícios em que se aloja a imprensa local e internacional. Essa “coincidência” que resulta na devastação de lares e estruturas civis muitas vezes essenciais à sobrevivência ou à reportagem dos acontecimentos é culpa do Hamas —dizem porta-vozes diplomáticos e das “forças de defesa de Israel”, em sua notória semântica tergiversante. Segundo os agressores, os palestinos são usados como “escudos humanos”, já que, benevolentes, as forças israelenses até mesmo enviam avisos aos residentes de que estão prestes a ser bombardeados. Prenúncios macabros do massacre anunciado.

Gaza

Está amplamente documentada a falácia dos argumentos de Israel. Em Gaza, território de cerca de 360 km2 densamente habitado por 2 milhões de pessoas, sitiado há mais de uma década por ar, terra e mar, não há abrigo ou local seguro onde as pessoas possam buscar refúgio enquanto suas casas e famílias inteiras são destruídas. Por exemplo, em 2014, foram frequentes as denúncias dos responsáveis da agência da ONU no terreno de que suas escolas, que abrigavam cerca de três mil pessoas durante a ofensiva “Margem Protetora”, haviam sido bombardeadas mesmo após a sua localização ter sido relatada para que as forças israelenses não cometessem os crimes de guerra que cometeram e vidas civis fossem preservadas. Novamente, Israel acusou a ONU de dar abrigo a terroristas. Não há, mesmo, escapatória.

Mas a devastação e as “vítimas colaterais” justificam-se com alguns períodos de “calma e paz” para os israelenses que vivem mais próximos da cerca de contenção confinando os palestinos ao estreito território, onde cerca de 70% da população é composta por refugiados de outros massacres e expulsos do que hoje é Israel. Já nestas comunidades, sim, há abrigos subterrâneos e um sistema de sirenes para avisar os residentes dos foguetes lançados de Gaza e que ainda deverão ser interceptados pelo sistema antimísseis que Israel construiu em parceria com os Estados Unidos, a Cúpula de Ferro. Que as populações de ambos os lados da cerca de contenção dos palestinos sofrem consequências dessa realidade, é fato. Mas que as condições são abissalmente assimétricas é, sim, preciso reiterar, como têm feito diversas forças, inclusive em Israel, ou por redes internacionais de judeus que se opõem a este regime que diz atuar em seu nome. Como se tem enfatizado, à exaustão e há décadas, não se trata de um conflito de responsabilidades partilhadas. Trata-se de uma guerra total de Israel contra o povo palestino que se sustenta na ocupação, anexação e colonização de cada vez mais porções do seu território desde o primeiro dia do Estado e desde antes dele, há pelo menos um século.

Sempre foi “necessário” ao movimento sionista, que se deparou com a uma forte consciência nacional, despojar o povo palestino das suas terras e dos seus lares, da sua pátria e da sua liberdade, para que a colonização da Palestina por sionistas fosse implementada, em conluio com o imperialismo britânico e a seguir, com o estadunidense. Que haja maior atenção às imagens do despejo de famílias em Sheikh Jarrah ou da ofensiva a Gaza, enquanto a liderança israelense é finalmente investigada por massacres passados e pelas políticas de um regime criminoso no Tribunal Penal Internacional, é certamente uma vitória dessa resistência palestina. Mas medidas efetivas para que essa farsa não continue sendo reencenada são devidas há décadas demais.

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