A história se repete como tragédia ou como farsa

A frase cunhada por Karl Marx cai como uma luva na desconstrução narrativa operada nesse ano que se completou ontem por ocasião da tentativa de golpe no dia 8 de janeiro de 2023.

Foto: Agência Brasil

Há 365 dias o nosso país passou sim por uma tentativa de golpe de Estado, os financiadores e envolvidos no processo que culminou com o ataque aos prédios dos três poderes do Brasil no ano passado tinham plena consciência do que faziam, questionavam o resultado das eleições, o presidente eleito, a urna eletrônica, pediam intervenção militar e fechamento dos poderes. Não reserva similaridade com absolutamente nada e nenhum outro ato ocorrido desde quando Brasília se tornou a capital federal, mesmo os mais violentos.

O fio narrativo que se espalha nas redes sociais a partir do eficiente esquema bolsonarista, muito mais refinado e capilarizado que qualquer um mantido pelo campo democrático, vem gerando na alta, sem parar, de 8 de janeiro de 2023 até 8 de janeiro de 2024. Isso está claro na pesquisa qualitativa realizada pela empresa Atlas que analisa de maneira estratificada a evolução do entendimento da população acerca do que ocorreu no dia da tentativa de golpe.

Ao perguntar se “você concorda ou discorda da ação de manifestantes que ocuparam o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o STF?” a pesquisa mostra uma oscilação dentro na margem de erro sobre quem discorda da ação dos manifestantes (recuou de 76 para 74%) e dos que concordam com a ação dos manifestantes (que recuou de 18 para 15%), mas chama a atenção o aumento dos que não sabem: de 6 para 11%, uma diferença de 5 pontos, para além da margem de erro, mostrando que mesmo num tema sensível como esse a rede de mentiras consegue influenciar parcela dos brasileiros.

Isso ganha ainda mais evidência com o recuo de todos os governadores alinhados com o campo conservador ausentes no ato de ontem, um contraste que salta aos olhos ao comparado com a unidade dos representantes de todos Estados da Federação e dos três poderes na caminhada simbólica capitaneada pelo presidente Lula ano passado. Não aguentaram a pressão bolsonarista das redes, vale destacar o que o ex-presidente Bolsonaro disse para CNN na véspera do aniversário da tentativa de golpe, classificando o ocorrido como “uma armadilha da esquerda”, e dando o tom do discurso que movimenta sua tropa, endossado pela homenagem ontem de sua esposa ao golpista que morreu na Papuda.

Dito isso, não surpreende aqui e acolá aparecerem ex-militantes do campo democrático que se prestam a dar ainda mais substância ao discurso de que “não foi tudo isso”. Vale lembrar que o impeachment da ex-presidente Dilma também foi corroborado por pessoas que doaram boa parte da sua vida a democracia, acabam dando chancela a iniciativas que não fazem parte de sua biografia e, justamente por isso, as tornam mais convincentes.

Comparar a tentativa de golpe com o ocorrido na invasão de 2016 pelo MLST é surreal, o movimento estava errado, depredou patrimônio público, machucou pessoas, foi punido por isso, mas não tentou derrubar o presidente da República eleito. Não se trata nunca coisas diferentes como iguais, é uma violência contra os fatos, e mais ainda contra a História. Tal afirmação que ganhou grande circulação ontem nos blogs, grupos de WhatsApp e na mídia cumpriu seu objetivo, dando ainda mais gás ao discurso negacionista, tentando confundir e nivelar o que não é possível e nem permitido em qualquer critério cientifico de análise da realidade.

Ainda bem que, mesmo com a penetração comprovada das mentiras em parcela de nosso povo, quase 75% não é conivente com a destruição da grande obra democrática e plural que é nossa República e os poderes que a compõem. A democracia prevalece.

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