A Luta Palestina na visão da FDLP

Conforme vimos fazendo, alternando entre as colunas de análise, vimos publicando algumas entrevistas pessoais, com companheiros(as) e camaradas que atuam na luta tanto dos palestinos como dos árabes em geral pela construção de um novo mundo, democrático e igualitário.

Jehad Youssef, do Comitê Central da FDLPTivemos a honra de conhecer, durante o 12 º Congresso do PCdoB, o Dr. Jehad Youssef, do Comitê Central da Frente Democrática de Libertação da Palestina, uma das organizações da esquerda palestina, de caráter marxista-leninista. Apresentamos nesta coluna uma breve entrevista com o camarada.

A entrevista com o Dr. Jehad Yousef

Jehad Youssef nasceu nos territórios ocupados por Israel em 1967. Nessa época já tinha dez anos de idade. É militante da Frente Democrático de Libertação Nacional da Palestina desde 1977 e atualmente é membro do Comitê de Relações Exteriores do Comitê Central da FDLP. É médico pediatra formado pela Universidade de Barcelona, tendo estudado também em Cuba. Encontra-se exilado da Palestina desde 1986, sem ter o direito de retornar a sua casa, como mais de cinco milhões de palestinos espalhados em todo o mundo.

Vejam a seguir a entrevista

Conte-nos um pouco a história da FDLP e suas breves divergências com a FDLP e o próprio Partido Comunista Palestino.

A FDLP é uma das organizações da esquerda palestina e se orienta pelo marxismo-leninismo em seu trabalho interno e nas suas relações de massas. Nas suas fileiras se integram trabalhadores em geral, camponeses, proletários, intelectuais, revolucionários e refugiados. Ela combina em seu trabalho, a luta política e a resistência de todas as formas, inclusive o direito à luta armada contra o exército de ocupação de Israel e seus colonos.

A FDLP é pioneira e esta na vanguarda de todas as etapas da luta do povo palestino, defendendo e apresentando em cada momento difícil um plano, um programa e como devem ser resolvidos os problemas nacionais tanto em termos políticos, como nas questões de organização do povo organizado, uma plataforma eleitoral, defendendo sempre a unidade nacional, as eleições democráticas através da representação proporcional em todas as instâncias de decisões dos palestinos, em especial no Conselho Legislativo, que é o parlamento palestino, da Cisjordânia e de Gaza. Dentro e fora da Palestina, também nas prefeituras, nas universidades, nos sindicatos entre outras localidades.

Lutamos também para a formação de um governo de unidade nacional onde estejam representadas todas as forças que atuam com o povo palestino. A FDLP é uma organização política independente com relação ás tomadas de decisões e não depende de governos e entes políticos regionais. Nossas diferenças com o Partido Comunista da Palestina, que hoje se chama Partido do Povo Palestino, é que, na essência, nas décadas passadas tínhamos divergências quanto ao emprego da luta armada contra a ocupação. Nós defendíamos que o recurso às armas deveria ser adotado exclusivamente nos territórios ocupados e nunca fora deles.

O mundo tem tido a notícia de que o presidente da ANP, Mahmoud Abbas teria convocado eleições gerais, legislativas e presidenciais, para janeiro próximo. Isso esta confirmado? Se sim, em que condições elas ocorreriam na Cisjordânia, em Gaza e em Jerusalém Oriental? Israel permitiria? Os grupos Hamas e Jihad aceitam participar? E as regras eleitorais, estão definidas?

Segundo as leis palestinas, devem ocorrer eleições legislativas e presidenciais no próximo dia 24 de janeiro de 2010. O presidente deve convocar essas eleições. No entanto, o Comitê Eleitoral será quem vai decidir se existem condições de que essas eleições possam ocorrer. Nos últimos dias, o Comitê visitou a Faixa de Gaza para verificar as condições para a realização das eleições, mas seu trabalho foi impedido pelo Partido Hamas, que resultou em uma declaração de impossibilidade de realizar eleições em Gaza. Por outra lado, o governo do primeiro Ministro de Israel, de Benjamin Netanyahu tem dito que vai impedir a realização de eleições em Jerusalém Oriental, onde vive uma maioria palestina. Além do que, até este momento não temos um acordo sobre as bases de uma nova legislação eleitoral, de forma que não vejo como possam ocorrer eleições em janeiro do próximo ano. Isso poderá causar um grande vazio no poder, pois não teremos parlamento funcionando nem um presidente da Autoridade Palestina.

Ao mesmo tempo em que convoca eleições, Abbas diz ao mundo que não concorrerá ás eleições. O próprio presidente Obama teria telefonado a ele pedindo que se candidatasse novamente. Como a FDLP vê esse processo? Vocês lançariam candidato próprio à presidente que faria coligação com o Fatah de Abbas?

Nós defendemos um acordo nacional das forças políticas que atuam na Palestina e com o seu povo, ai incluindo o Fatah, a Jihad Islâmica e os partidos da esquerda palestina (FDLP, FPLP e PPP), em um processo eleitoral que seja votada com base no conceito de eleições proporcionais.

Neste momento não estamos defendendo lançar candidaturas próprias da FDLP, nem ainda fazer alianças com outros candidatos, porque cremos que não teremos eleições nos prazos que a lei determinava (24 de janeiro de 2010). Creio que o presidente Obama, ao invés de exigir que Mahmoud Abbas seja novamente candidato, este deveria exigir do governo de Israel o congelamento da expansão das colônias judaicas na Cisjordânia como condição necessária para continuarmos as conversações de paz em um marco internacional, sob os auspícios da ONU e das grandes potências como ponto de referência as resoluções da própria ONU que garantem o direito do retorno dos refugiados palestinos. A retirada das forças israelenses da Cisjordânia e de Jerusalém, bem como a criação do Estado da Palestina, nos territórios ocupados em junho de 1967, tendo Jerusalém Oriental como capital desse Estado.

Segundo Hani Al-Masri, próximo de Abbas, “o conflito entre a Fatah e o Hamas é político e não constitucional e, portanto isso exige uma solução política”. Esta de acordo com essa afirmação? Se sim, qual a saída para a recuperação da unidade nacional palestina?

Lamentavelmente, as diferenças entre o Hamas e o Fatah não são apenas aspectos políticos e programáticos. Existem diferenças sobre as cotas do poder, a questão da hegemonia e sobre o dinheiro. Assim foi demonstrado a amarga experiência do acordo dos dois partidos estabelecido em fevereiro de 2007 em Meca, um acordo que se resumia em dividir os espaços no poder. Em poucos meses ocorreu a desgraça, com enfrentamentos e derramamento de sangue dos dois lados como seu resultado. O Hamas controlou gaza completamente e surgiu a divisão política e territorial, ou seja, duas zonas, dois governos e enfrentamentos constantes. Isso porque esse acordo não era um produto de acordo nacional, resultante de um diálogo nacional entre todas as forças políticas e que representem os interesses nacionais.

De nosso ponto de vista, a saída para esta crise esta no diálogo nacional de todas as forças que atuam na Palestina. Quanto às tentativas de acordos nacionais, estabelecidos em reuniões anteriores, em conjunto com os representantes do Hamas, da Fatah e o resto das organizações e partidos palestinos, tivemos como referência o documento dos presos e o documentos dos partidos datados de 2006, que constava no seguinte: realização de eleições legislativas e presidenciais em Gaza, Cisjordânia e Jerusalém segundo os princípios de eleições proporcionais, com a formação de um governo de unidade nacional onde todos participem.

Os corpos de segurança têm que ser independentes e profissionais e não podem ter nenhuma tendência política. Devemos reativar a OLP e convocar eleições para o Conselho Nacional Palestino, dentro e fora da Palestina ocupada, também seguindo os princípios das eleições proporcionais. As negociações com Israel e um possível acordo de paz sobre a legalidade internacional devem se dar com base nas resoluções da ONU, que garantem o direito de retorno dos refugiados palestinos ás suas casas e terras e a criação de um estado palestino independente e tendo Jerusalém como sua capital.

Em recente artigo no The Christian Science Monitor Hohn Whitebeck, advogado e especialista em direito internacional, afirmou que a solução de “dois povos, dois estados” estaria completamente em cheque. Você concorda com isso? Seria a volta a uma proposta de estado único, Palestina, de caráter bi-nacional, laico, com dois povos sob um mesmo governo democraticamente eleito.

Todas as forças do povo palestino lutam por um Estado Palestino, independente, sobre os territórios ocupados por Israel. A Liga Árabe, a Conferência dos Países islâmicos, os Países Não Alinhados, A União Africana, a União Europeia. A ONU, inclusive seu Conselho de Segurança apoiam a criação de um Estado Palestino. Quem sempre utilizou de uma política obstrucionista sempre foi o Estado de Israel. Ao meu juízo, o trabalho e as condições para a solução de “dois estados” são mais factíveis do que apenas um só, ainda que laico e democrático.

Em recente artigo, a Drª Bouthaina Shaaban, ex-ministra síria dos expatriados, que tive a honra de conhecer quando veio ao Brasil, escreveu interessante artigo no site Counterpunch, cujo título foi “Contra o colonialismo sionista”, ela critica a perda de forças e de papel da ONU. Lembra que a ONU, depois do massacre de dezembro de 2008 a janeiro de 2009, contra os palestinos de Gaza, chegou a dizer que “conclama Israel a suspender as demolições de casas de palestinos”. Só falta pedir “por favor…”. Que papel os palestinos veem para a ONU na atual conjuntura política internacional?

A maioria dos países árabes que integram a ONU apoiam os direitos legítimos do povo palestino, em especial o direito dos refugiados ao retorno, a criação do Estado da palestina e a retirada das forças israelenses de ocupação até as fronteiras de 1967, inclusive os seus respectivos secretários-gerais sempre assim o expressaram publicamente. Recordamos inclusive a última visita do Secretário-Geral Ban Ki Moon à Faixa de Gaza e sua expressão de terror que seus olhos tiveram quando viram o holocausto. Mas, as soluções da ONU não são vinculantes e sempre se chocam com o poder de veto das diferentes administrações da Casa Branca junto ao Conselho de Segurança da ONU.

Um dos melhores jornalistas que cobrem Oriente Médio, Robert Fisk, do The Independent, publicou recentemente um artigo, cuja tradução tem o título de “A verdade sobre o Oriente Médio esta soterrada longe dos jornais”. Ele comenta alguns trechos que os reproduzo a seguir: “Uma vez que governos e editorias e diretores de redes de televisão decidam sobre ‘a pauta’ e ‘a matéria’, todos podem ter certeza de que o muro dos israelenses será convertido em ‘barreira de segurança’ ou ‘cerca’; que algum ditador árabe pró-ocidente virará ‘homem forte’; que o território palestino ocupado será metamorfoseado em ‘território disputado’; e todos os ofendidos e humilhados tornar-se-ão genericamente violentos: a brutalidade terá sido suavizada; e a ocupação da Palestina foi legalizada”. Qual a sua opinião sobre o papel da mídia na cobertura da luta de libertação da Palestina?

Os meios de comunicação de massa possuem muita forma e importância. Durante muito tempo e até hoje, o governo de Israel e seus aliados, através do lobby judaico, tem manipulado a história e o verdadeiro conflito da Palestina e Israel. Eles procuram ocultar massacres, assassinatos e a limpeza étnica exercida pelo exército israelense em 1947 e 1948, quando foram expulsos pelo menos 800 mil palestinos e foram apagados do mapa mais de 530 aldeias e foram assassinados milhares de palestinos.

Hoje, com a globalização da informação e através da Internet e das estações de satélites, nosso povo sente que a sua voz, seu rosto, seu canto, seu sofrimento e sua dor estão chegando e sendo vistos e ouvidos por milhões de cidadãos em todo o mundo. Isso sem falar nas vozes de partidos, governos amigos em todo o mundo que denunciam as injustiças, o bloqueio por que padece nosso povo palestino.

Para encerrar, gostaria de saber a opinião oficial do Comitê Central da FDLP sobre as propostas para a paz e quais sãs saídas para o conflito nós teríamos na Palestina ocupada hoje, no atual estágio da correlação de forças que vivemos no mundo.

Ainda que os povos da América do Sul e latina, da África e da Ásia venham conseguindo muitos progressos, avanços progressistas e lutas por sua independência e justiça social para seus povos, elegendo governos progressistas de centro-esquerda, tal qual na Bolívia, Venezuela, Equador, no Brasil, Nicarágua, El Salvador, Cuba, Argentina entre outros, lamentamos que no Oriente Médio a situação esteja estancada e não estejam ocorrendo transformações e avanços que envolvem a defesa dos interesses dos povos (eu diria que as “águas estão estancadas…”).

Esta situação não representa nenhum peso na correlação de forças para poder exigir e entabular uma relação de interesses que possam visar a grandes mudanças, em especial quando envolvem os Estados Unidos. Isso poderia servir inclusive para melhorar a posição dos EUA quanto a começar a defender uma solução equilibrada no conflito árabe-israelense.

Nós defendemos neste momento:

1. A necessidade de terminar com a divisão na palestina e chegar a um acordo nacional com eleições legislativas e presidenciais segundo o princípio da representação proporcional e com a formação de um governo de unidade nacional;

2. A necessidade do fortalecimento da esquerda em Israel e dos partidos que trabalham com setores árabes dentro de Israel e que lutam contra a ocupação, contra o Apartheid, contra o colonialismo e que sejam a favor de uma solução baseada na criação do Estado Palestino;

3. Os partidos e organizações progressistas e nacionalistas árabes devem ter um papel destacado nas lutas populares em seus respectivos países e;

4. Os países devem elevar suas vozes em uníssono em todas as instâncias internacionais, exigindo o cumprimento de todas as resoluções da ONU com relação ao conflito árabe-israelense.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
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