Arsenal teórico e prática criativa e consequente

Durante mais de duas décadas em que fui diretor do Sindicato dos Professores de Campinas e Região vivi situações muito diferenciadas, fruto de diferentes conjunturas políticas e econômicas.

Na década de 80 participei do movimento sindical, em alta, que contava com um poder significativo de mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras. Na década de 90 participei do movimento sindical, em crise, com grandes dificuldades para envolver as várias categorias na luta.

Lembro-me nos anos 80 que quando visitava as escolas para conversar com os professores e professoras era abordado para que apresentasse as fichas de filiação ao sindicato. Aqueles que não eram filiados sentiam-se mal situados diante dos colegas. O mínimo que se esperava era que fossem filiados. E quando se filiavam nem perguntavam o valor da mensalidade e os benefícios diretos que poderiam ter. Sabiam, no mínimo, que o fundamental era a luta que o sindicato desenvolvia por melhores salários e condições de trabalho. E muitos acreditavam que o papel do sindicato não ficava por aí. Deveria se envolver na luta política para a transformação da sociedade.

Já, nos anos 90, o quadro mudou. Lembro-me de ter ido a instituições de ensino superior, nas quais os professores me questionavam sobre as vantagens que o sindicato oferecia para os sindicalizados. Mesmo fazendo grande esforço para explicar que o papel da entidade sindical é o de lutar na defesa dos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras, não conseguia convencer muitos deles. Na realidade, o que queriam saber eram os benefícios assistencialistas diretos que o sindicato oferecia. Comentava com diretores do sindicato que me sentia como se fosse um vendedor de títulos de clube, em que teria que provar que aquele clube mereceria a associação porque apresentava melhores benefícios do que os outros.

Essa diferença de postura é reflexo das grandes transformações ocorridas na sociedade brasileira, fruto da introdução do neoliberalismo, da reestruturação produtiva e das novas técnicas gerenciais. O aumento do exército industrial de reserva, como decorrência do desemprego quantitativamente superior, intimidou os trabalhadores e trabalhadoras. Prevalecia a visão de que era melhor ganhar um salário baixo, do que ficar desempregado ou subempregado, como tantos acabaram ficando.

A constatação que estou fazendo é simples, mas nem sempre levada em consideração em estudos desenvolvidos, inclusive por alguns intelectuais progressistas. Em muitos desses estudos acadêmicos, para explicar as dificuldades de mobilização, atribui-se o maior peso à burocratização dos dirigentes sindicais, que se encastelam nas máquinas sindicais, deixando de ter uma atitude de luta e mobilização.

De forma nenhuma, quero retirar dos dirigentes sindicais a responsabilidade pela baixa mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras. Reconheço que há dirigentes que diante das dificuldades colocadas se renderam e se afastaram das bases. Mas por outro lado, mesmo aqueles que consideram firmemente a necessidade de organizar e mobilizar os trabalhadores e as trabalhadoras, encontram grandes dificuldades de atuar num terreno com tantos obstáculos quanto este.

Marx sempre atribuiu às condições materiais de existência um papel fundamental na construção da consciência. É importante, por um lado, considerar as dificuldades impostas pela realidade na qual vivemos e, por outro, manter vivos o nosso empenho e dedicação para que, mesmo nos momentos conjunturais adversos, consigamos continuar o nosso trabalho de sindicalistas classistas.

Com o arsenal teórico que o marxismo nos proporciona para compreendermos profundamente a realidade tal qual ela se apresenta e com a prática adequada, criativa e consequente, haveremos de dar passos significativos para que o movimento sindical possa, cada vez mais, exercer um papel importante na luta anticapitalista e pela construção do socialismo.

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