Coletivos da palavra, uma luta necessária

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Pensar o contexto da cidade na sua multiplicidade educativa é um dos caminhos para fomentar, reconhecer, potencializar e trilhar novos rumos numa perspectiva  de ampliar a visão social  de mundos das camadas populares que tem um acesso reduzido aos mecanismos de leitura nos seus diversos contextos: social, político, cultural, tecnológico, cientifico e artístico.

Ampliar o acesso à leitura na sua dimensão múltipla é antes de tudo, uma tomada de posição política e de mobilização social.  O que requer
reconhecer a leitura enquanto instrumento de  entrelaçamento com a  prática escolasocial e emancipação  humana que pode contribuir de forma significativa para o processo de construção de um novo tipo de sociedade  pautada  por uma cultura leitora permanente.  

Uma cultura leitora não nasce do acaso, mas dos processos das relações sociais, de políticas permanentes de incentivo e acessibilidade à leitura, fomento a publicação  e a formação de público leitor e de educadores
comprometidos com a democratização da pluralidade dos  conhecimentos 
produzidos historicamente pela humanidade,   conjugado com os aspectos vivenciais,  bem como deve estar conectada as inovações e interações tecnológicas que vão desde o letramento virtual ao uso das redes
sociais inseridas na prática social da contemporaneidade. 

A escola é um dos principais vetores de disseminação da leitura, entretanto, não pode ser percebida como espaço exclusivo  e fechado,  mas como espaço de trânsito , em que as práticas pedagógicas ultrapassem  os seus
muros e a leitura escrita e de mundo ganhem significados para a vida.   

Ultrapassar os muros da escola, significa reinventar novas práticas, descontruir conceitos, criar novas parcerias na caminhada do conhecimento e avançar no caminho de uma cidadania ativa e de ampliação das leituras de mundo.  

Pensar uma cidade leitora exige esforço  conjunto dos diferentes
segmentos da sociedade num processo de entrelaçamento, autonomia e
descentralização de ações e protagonismo.

A efervescência e a pluralidade cultural, estética e artística do nosso povo se reoxigena constantemente,  o tradicional e o contemporâneo, o popular e erudito dialogam e se hibridam  configurando infinitas possibilidades  de trilhar pela diversidade de leituras, ainda desconhecida pela  população na sua totalidade.  

Neste contexto, diversas são as organizações, movimentos e grupos artísticos e culturais que podem favorecer para descortinar outras visões sociais de mundo e ampliar o olhar para a diversidade e pluralidade,  bem como fazer as conexões com outras realidades e leituras da contemporaneidade locais e universais.    

Pensar a leitura  a partir  da diversidade da prática social é um dos
caminhos para construção de um novo tipo de leitor e leitora concatenado com o seu tempo e as suas realidades.

É indiscutível a necessidade da aquisição da leitura como mecanismo de integração e diálogo social. Alguns fatores transitam nesta questão, como: ampliação da visão social de mundo, incitação do processo imaginativo, estratificação social, relações de poder, acesso, exclusão e elitização das leituras e das literaturas.     

É nesta composição, que o hábito, o gosto e a mediação da leitura perpassam, por isso a necessidade da democratização das leituras e das literaturas, como parte integrante de democratização da produção historicamente desenvolvida pela humanidade.  

A elitização do acesso ao livro aponta também para um poder centralizado numa elite econômica. 

A constituição de uma cultura leitora é um desafio que se apresenta. As camadas populares, na sua maioria, detêm índices de escolaridade baixo e limitações da prática habitual de leitura.  A taxa de analfabetismo tem reduzido, entretanto, muitos não têm conseguido ultrapassar as condições de analfabetismo funcional, quando a pessoa é alfabetizada, mas tem dificuldade de interpretação de textos. 

Algumas perguntas se fazem necessárias para refletir sobre a cultura leitora, dentre elas: Qual o valor econômico do livro?  Onde o livro circula? Como ocorrem os processos de mediação da leitura? Quais são os espaços de leituras?

O livro no Brasil é caro e se torna mais caro, quando não se tem o hábito de ler, quando a relação objeto e desejo são incompatíveis, o que consequentemente indica que o livro circula em espaços e públicos restritos. O hábito da leitura está intimamente ligado ao processo de mediação da leitura, que ocorre tanto no âmbito familiar, escolar, através de outras organizações ou iniciativas. Já as compreensões dos espaços de leituras ainda são limitadas à escola e à biblioteca, apesar de existir uma infinidade de outros espaços e possibilidades: os muros, as praças, os postes, os pontos de ônibus, as bodegas, ambientes virtuais e as residências são locais de leituras. São nas casas onde as pessoas leem mais livros, conforme aponta a pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil 4” (2015 ).

A defesa da democratização da leitura e a construção de uma cultura leitora tem ganhado contorno importante na discussão sobre a política pública e implementação de um marco legal, como é o caso   do  Plano Nacional do Livro e Leitura – PNLL, mas ainda é tardia essa implementação no âmbito dos estados e municípios. Por outro lado, o país vivencia um processo destruidor das políticas públicas implementadas com a discussão e participação social nas últimas décadas. 

Aglutinar forças para mobilizar amplos setores da sociedade para discutir e definir uma política pública para o livro e a leitura, em cada cidade, é um exercício necessário para contribuir para democratização da leitura e uma cultura leitora. O Plano Municipal do Livro e da Leitura (PMLL) pode ser esse um desses caminho.

As linguagens marginalizadas, os regionalismos, as inovações tecnológicas, os espaços urbanos, a literatura popular e contemporânea, os clássicos, a diversidade literária, o fomento a publicação de livros,  a mediação da leitura, o reconhecimento das práticas oriundas do povo de  democratização das leituras e das literaturas e  a compreensão do acesso à leitura como  direitos humanos é um passo importante desconstruir os castelos letrados em que o povo fica nas  suas margens.

Que a leitura possa ser uma apropriação irrestrita do povo para que ele possa construir um novo mundo de pão, palavra e poesia. Sem perder a noção que todo  processo de aprendizagem é educativo ( seja escolar ou não)  e tem que ser compreendido na sua dimensão mais ampla, ou seja, o educativo pode ser algo positivo ou negativo, contribui para o processo de emancipação humana, quanto para o processo de manutenção dos mecanismos de opressão e exploração. A palavra, as leituras e as literaturas não se separam deste aspecto.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
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