Crise no Senado: acordão “salva” Artur e Sarney
Nas duas últimas colunas tratei da “crise” do Senado. Mostrei que a direita estava em xeque e que evitou o xeque mate oferecendo “empate”. A votação do conselho de ética que poupou da degola Sarney e Artur Neto, líder do PSDB, revela que o acordão foi materializado.
Publicado 24/08/2009 22:28
A direita suspirou aliviada, pois sabia que o aprofundamento das investigações levaria ao cadafalso vários dos seus, especialmente aqueles que nos últimos anos ocuparam os postos responsáveis pelos atos secretos.
O episódio é mais uma demonstração da sistemática luta de classes da qual uma parte da esquerda até verbaliza, mas nem sempre tira conseqüências. Parte porque não tem a necessária consistência teórica para entender que valores como democracia e ética, por exemplo, não são a-histórico e tão pouco desprovidos de interesses de classe. E outra parcela porque tem no proselitismo seu modo de sobrevivência política.
As representações contra Sarney em síntese eram: favorecimento do neto em operações de crédito consignado no senado; usar a fundação Sarney para desviar recursos públicos e mentir sobre sua responsabilidade na mesma; omitir casa de 4 milhões do fisco e ter uma conta no exterior; criar cargos e aumentar salários por atos secretos; favorecer parentes por atos secretos. Sarney nega as denúncias.
As representações contra Artur Neto eram: receber “doação” do ex-diretor geral do senado Agaciel Maia; manter funcionário fantasma em seu gabinete; contratar parentes da mesma família; pagar um personal trainer com dinheiro do Senado; não declarar a receita a doação de uma casa onde mora e ter feito o Senado extrapolar o teto de 30 mil para custear despesas médicas da mãe. Artur reconhece a veracidade das denúncias.
A votação no conselho de ética foi uma demonstração dessa dicotomia. Alguns senadores “sumiram”. Os que ficaram patrocinaram coerência e incoerência.
As forças progressistas e os setores que dão sustentação ao governo votaram pelo arquivamento das denúncias tanto contra Sarney quanto Artur Neto. Votaram coerentemente. Afinal, como é de fácil conclusão, as representações contra um e outro guardam enorme semelhança de conteúdo. Se um recurso é arquivado o destino do outro não pode ser muito diferente. Ademais, ao que tudo indica, honravam um acordo político.
A direita votou em bloco pelo não arquivamento das denúncias contra Sarney, no que contou com a ajuda do Senador Jeferson Praia, do PDT amazonense. Mas, paradoxalmente, esse mesmo bloco votou pelo arquivamento da representação contra o líder do PSDB Artur Neto, numa aberrante demonstração de incoerência. Se era a defesa da moralidade que eventualmente os movia, como explicar essa generosidade seletiva num episódio de tanta semelhança de conteúdo?
A luta de classes e a luta política explicam. A motivação da direita nunca foi a busca da moralidade no Senado. O que lhe move é o sentimento golpista. Pena que uma parcela da esquerda sequer consiga ver o que está escancarado nesse tipo de votação e na “cobertura” que a chamada grande mídia fez do episodio.
A revista Veja, edição de 26 de agosto, teve a capacidade de escrever quase 3 laudas sobre o episódio fazendo críticas ao arquivamento das representações contra Sarney e sequer mencionar o nome de Artur Neto, o outro denunciado. Segundo a revista, Lula disse: “é para salvar o Sarney”. Foi “salvo”. E quem mandou salvar Artur?
A revista não explica. Prefere manter a cruzada de classe. Algumas páginas depois ela abre uma entrevista com o presidente do IBOPE, Carlos Montenegro, no qual este afirma sem qualquer reserva que “Lula não fará seu sucessor”.
Não pode haver confissão de maior parcialidade do que isso.