Crise no Senado: acordão “salva” Artur e Sarney

 Nas duas últimas colunas tratei da “crise” do Senado. Mostrei que a direita estava em xeque e que evitou o xeque mate oferecendo “empate”. A votação do conselho de ética que poupou da degola Sarney e Artur Neto, líder do PSDB, revela que o acordão foi materializado.

A direita suspirou aliviada, pois sabia que o aprofundamento das investigações levaria ao cadafalso vários dos seus, especialmente aqueles que nos últimos anos ocuparam os postos responsáveis pelos atos secretos.

O episódio é mais uma demonstração da sistemática luta de classes da qual uma parte da esquerda até verbaliza, mas nem sempre tira conseqüências. Parte porque não tem a necessária consistência teórica para entender que valores como democracia e ética, por exemplo, não são a-histórico e tão pouco desprovidos de interesses de classe. E outra parcela porque tem no proselitismo seu modo de sobrevivência política.

As representações contra Sarney em síntese eram: favorecimento do neto em operações de crédito consignado no senado; usar a fundação Sarney para desviar recursos públicos e mentir sobre sua responsabilidade na mesma; omitir casa de 4 milhões do fisco e ter uma conta no exterior; criar cargos e aumentar salários por atos secretos; favorecer parentes por atos secretos. Sarney nega as denúncias.

As representações contra Artur Neto eram: receber “doação” do ex-diretor geral do senado Agaciel Maia; manter funcionário fantasma em seu gabinete; contratar parentes da mesma família; pagar um personal trainer com dinheiro do Senado; não declarar a receita a doação de uma casa onde mora e ter feito o Senado extrapolar o teto de 30 mil para custear despesas médicas da mãe. Artur reconhece a veracidade das denúncias.

A votação no conselho de ética foi uma demonstração dessa dicotomia. Alguns senadores “sumiram”. Os que ficaram patrocinaram coerência e incoerência.

As forças progressistas e os setores que dão sustentação ao governo votaram pelo arquivamento das denúncias tanto contra Sarney quanto Artur Neto. Votaram coerentemente. Afinal, como é de fácil conclusão, as representações contra um e outro guardam enorme semelhança de conteúdo. Se um recurso é arquivado o destino do outro não pode ser muito diferente. Ademais, ao que tudo indica, honravam um acordo político.

A direita votou em bloco pelo não arquivamento das denúncias contra Sarney, no que contou com a ajuda do Senador Jeferson Praia, do PDT amazonense. Mas, paradoxalmente, esse mesmo bloco votou pelo arquivamento da representação contra o líder do PSDB Artur Neto, numa aberrante demonstração de incoerência. Se era a defesa da moralidade que eventualmente os movia, como explicar essa generosidade seletiva num episódio de tanta semelhança de conteúdo?

A luta de classes e a luta política explicam. A motivação da direita nunca foi a busca da moralidade no Senado. O que lhe move é o sentimento golpista. Pena que uma parcela da esquerda sequer consiga ver o que está escancarado nesse tipo de votação e na “cobertura” que a chamada grande mídia fez do episodio.

A revista Veja, edição de 26 de agosto, teve a capacidade de escrever quase 3 laudas sobre o episódio fazendo críticas ao arquivamento das representações contra Sarney e sequer mencionar o nome de Artur Neto, o outro denunciado. Segundo a revista, Lula disse: “é para salvar o Sarney”. Foi “salvo”. E quem mandou salvar Artur?

A revista não explica. Prefere manter a cruzada de classe. Algumas páginas depois ela abre uma entrevista com o presidente do IBOPE, Carlos Montenegro, no qual este afirma sem qualquer reserva que “Lula não fará seu sucessor”.

Não pode haver confissão de maior parcialidade do que isso.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor