Da Luta Surge o Hip-Hop
Em meados de 1970, em um cenário hostil de crises políticas e econômicas, a guerra no Vietnãn trouxe jovens jamaicanos para os Estados Unidos, principalmente para os bairros pobres de grandes cidades como Nova Iorque e Los Angeles, somando estes jovens aos latinos, e aos descendentes de escravos africanos.
Publicado 08/11/2011 16:55
Em sua bagagem, os jamaicanos traziam o toasting, que é um estilo músical semelhante ao reggae. Na jamaica, este estilo era disseminado unindo as pessoas em locais públicos com carros equipados com um som potente; as letras consistiam em pequenas rimas improvisadas (free style), com um certo teor político.
Nesta época, a insatisfação dos imigrantes e do povo marginalizado era traduzida em manifestações como a de pegar aparelhos de som e colocá-los em frente de suas casas, no quais gritavam ao microfone palavras de ordem pautadas principalmente nas idéias de Malcom X, Martin Luther King, Panteras Negras, e ao som de bases contínuas de discos como os de James Browm. Surge o RAP, que significa “batida” em inglês. Rap é a abreviação de ritmo e poesia. O rap é responsavel por dois elementos do hip-hop: o que pega no microfone para rimar – MC (mestre de cerimônia) – e o que cuida do som para garantir a base contínua – o DJ (disk jockey).
Uma das formas de protesto dos hispânicos e negros americanos contra a guerra do Vietnãn foi através da mímica em forma de passos de dança. Em um desses passos, o dançarino, com a cabeça no chão, gira o corpo em torno de si, fazendo com que as pernas lembrem os helicópteros americanos. Em outro, o dançarino dá passos como se o corpo estivesse quebrado ou ferido por granada, ou ainda balançando o braço como pêndulo, lembrando as vítimas da radiação de Chernobil.
As paredes dos guetos e becos onde se encontravam traziam pichações de gangues para demarcarem seus espaços, e estas evoluíram para uma arte plástica chamada grafite.
Isto é o hip-hop: a união dos quatro elementos: DJ, MC, B.boy (quem dança breack) e o grafite, elementos que em seus 20 anos ganharam novas formas, novos papéis e, tendo como referência suas origens, se descaracterizou nos Estados Unidos.
No Brasil o breack ganhou a ginga da capoeira; o rap se fundiu com o repente, a embolada e o swing do samba; o grafite ganhou a experiência das pichacões políticas da época da ditadura; o DJ sampleou a MPB, a bossa nova; o MC lançou mão da sarcasticidade, como nas crônicas em primeira pessoa de Machado de Assis, e a poesia, a exemplo de Castro Alves, passou a ser utilizada como instrumento de libertação. O hip hop, portanto, apropriou-se da herança revolucionária do povo brasileiro: resgatou elementos da auto estima negra contida nas mensagens de Toni Tornado; os quilombos se transformaram em posses. Chamamos a isto de quinto elemento – o poder que une os outros quatro e que transforma o artista em ativista.
O quinto elemento
Faz com que o hip hop deixe de ser um estilo meramente artístico para ser um estilo de vida. O quinto elemento é o fator de transformação do homem.
É por isto que semanalmente viremos aqui ocupar essa coluna. Como diz o grupo de rap SNJ: “Nossa música tem que atingir todas facções hereditárias: do moleque, ao tiozinho da terceira idade…”
Este espaço então tem duas grandes funções: fazer com que os manos de hip hop tenham acesso a mais informação, idéias e as utilizem na luta contra o opressor, ao passo que tem a pretensão de divulgar a origem de contestação revolucionária do verdadeiro hip hop. Ou seja, pretendemos provocar um debate.
Para ilustrar a situação que vivemos, vou citar um trecho da recente entrevista de Andre Midani, que, depois de 12 anos em Nova Iorque, onde foi alto executivo da Warner Music, voltou ao Brasil se dizendo horrorizado com o apartheid social: “A ‘sociedade branca’ não se interessa pela ‘favela’. A ‘favela’ não quer saber dos influentes. Mundos separados onde cresce uma tensão. Se o discurso do hip hop não for ouvido, não vai ser mais discurso só, vai ser porrada mesmo."