Depois das portas que a educação abriu de 2003 pra cá.

Tenho visto no facebook depoimentos de pessoas cujas vidas foram transformadas pela oportunidade que o ProUni lhes abriu de cursarem uma graduação. Como também é o meu caso, penso em falar sobre isso, mas numa perspectiva diferente. Penso na sequência que se abre após a graduação, visto que os Governos Lula e Dilma ampliaram também oportunidades nos cursos de Pós-graduação. Lá também não temos vida fácil, muito pelo contrário.

Recorrerei a partes do texto com que abri minha defesa de Mestrado, em março de 2013. Meu trabalho intitulava-se “Trabalhadores do século 20 em poemas de Jorge de Sena”, era um tema inédito, portanto com as dificuldades de fonte que esta condição trás, e atiçou posturas elitizadas que desprezavam o tema.

Acontece que, mais que aumentar a quantidade de mestres e doutores, penso, o Brasil precisa aproveitar estes tipos de curso para tratar, entre outras questões, de sua própria elaboração enquanto nação. Daí eu considerar tão importante nós “de ProUni”, como somos eventualmente chamados, estarmos também nos cursos de pós. E somos capazes, temos disposição para mais esta empreitada. Construir nosso país passa também por esta frente.

A construção de um trabalho acadêmico, propriamente, envolve escolher entre o que se vai abarcar e o que ficará de fora. Há diversos critérios para realizarmos tais escolhas, mas há de se considerar também o tempo. No imediato, pode ser que pensemos no tempo de leitura, mas ao longo do caminho, senti falta do tempo necessário às reflexões e amadurecimento daquilo que lemos. Neste sentido, proponho mesmo que os cursos tenham maior duração. Dois anos para Mestrado e quatro para o Doutorado é uma indecência! (Sim, critico, porque sou livre para propor ações para e criticar o governo que legitimamente escolhi, e é assim que a Dilma entende, estou certa disso.)

Assim, a exiguidade do tempo de duração de um mestrado impõe que, a certa altura, novas reflexões e diálogos sejam anotados para a continuação da pesquisa acadêmica, e este é um aprendizado importante, pois provavelmente passaremos a vida toda empreendendo estudos e pesquisas, até porque um curso de mestrado não é algo que escapa da dialética da vida, de modo que não corre como uma flecha nem é imune aos obstáculos, mas é uma experiência grandemente enriquecedora.

Minha dissertação tem como tema trabalho e trabalhadores nos poemas de Jorge de Sena, especificamente observando a situação que encontramos no modo capitalista de produção, em que a maioria produz coletivamente, mas a divisão dos resultados desta produção é apropriada por uma minoria. Embora isso possa ser afirmado de modo simples e direto numa frase, não há nada de simples no funcionamento de uma sociedade, e me interessava o olhar que o poeta lançou em redor e que expressou na sua obra poética.

Uma das complicações desta vida em sociedade reside no fato de que, ao contrário da aparente liberdade que o capitalismo propagandeia, estamos obrigados a conseguir dinheiro para nos mantermos dentro do sistema e, ao fazer isso, sustentamos (muitas vezes sem perceber) uma elite parasita que nos suga a vida.

Numa sociedade somos reduzidos a dados estatísticos, apresentados em levantamentos e projeções despersonalizados, ao passo que nos poemas que estudei vi a possibilidade de termos restituída a nossa condição de humanos, portanto seres da cultura e do sentimento. E penso que este é um elemento fundamental: nos vermos como humanos, não deixarmos de nos perceber devido às obrigações, às necessidades materiais.

Vencida esta etapa da construção desta dissertação, cristalizou-se em mim o entendimento de que oferecer poemas à humanidade, assumir e manter-se fiel a essa tarefa de ser um poeta, pela vida afora, é o maior gesto ético de Jorge de Sena. Quanto a nós aqui, brasileiros construindo um país, os cursos de pós-graduação podem oferecer ferramentas de pensamento importantes das quais nós devemos lançar mão.

Para finalizar, devo dizer que carrego ainda muitas incertezas, naquele dia ano e meio atrás como hoje, e isto me parece um bom sinal, se eu pensar nos versos de Camões, que Sena tanto estudou, em que lemos “Errei todo o discurso dos meus anos”, pois o que produz um pesquisador me parece ser o processo da pesquisa, ou seja, o trabalho.

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