Derrotar a extrema-direita
Caso a vitória de Joe Biden se confirme, o recado terá sido dado à extrema-direita, que tem Trump como um de seus pilares
Publicado 07/11/2020 10:47
Governos de extrema-direita podem destruir um país. É assim no Brasil de Bolsonaro e nos Estados Unidos de Trump. Durante quatro anos, o presidente norte-americano, amparado por uma base fundamentalista e racista, levou o país a uma divisão com precedente apenas na guerra da secessão, no século 19. O homem rico e desumano, mentiroso e fanfarrão, inimigo da ciência e alheio ao sofrimento de seu povo, deve deixar o governo da maior potência do planeta no dia 26 de janeiro, confirmada a vitória de Biden. Até agora, Trump esperneia sobre o resultado, dentro de seu estilo errático e autoritário, tentando comprometer o processo de uma eleição cuja apuração é tão complicada quanto antiquada.
Trump indo embora, seu clone brasileiro fica isolado do mundo, pois tem adotado uma política externa de dependência completa aos Estados Unidos, mais precisamente a Trump. Os dois têm muito em comum. Trump ameaça as instituições e Bolsonaro também. Os dois não aceitam derrotas e vez por outra insinuam recorrer à providências inconstitucionais e à mentira. *_Em 2018_*, Bolsonaro fez todo tipo de ameaças para o caso de não vencer a eleição e prosseguiu nessa linha, acuado ou não, com ataques aos poderes Judiciário e Legislativo. Na política externa, basicamente atrelou o Brasil aos Estados Unidos, mais precisamente a Trump, numa linha diplomática que pode isolar o nosso país no cenário mundial. Também à moda trumpista, o presidente brasileiro juntou-se a fanáticos extremistas e iludiu parte do eleitorado, espalhando temores sem sentido, teorias da conspiração e mentiras descaradas. Ambos, Bolsonaro e Trump, também deixarão sua marca na história como os presidentes que pior responderam à pandemia do novo coronavírus – um alto número de casos e de mortes que poderiam ser evitados.
A América do Sul, por sua vez, vive um período de esperança depois de tantos baques nos últimos anos. Alberto Fernandez foi eleito na Argentina, veio a heroica reversão do golpe na Bolívia – por meio de uma eleição democrática – e a vitória do povo do Chile, que foi para as ruas e *_aprovou a instalação de uma Constituinte para elaborar uma nova Constituição para substituir a atual que ainda é a dos tempos do sanguinário ditador Augusto Pinochet_*. No caso chileno, foi a baixa rede de proteção social pública, o espectro que hoje nos ameaça, que forneceu o combustível ao levante social por um plebiscito e por uma carta socialmente mais justa. A influência norte-americana na desestabilização de governos da América Latina, que Bolsonaro também tenta imitar, é conhecida há muitas décadas. Foi assim no Brasil, em 1964, foi assim no Chile, em 1973, foi assim na Bolívia, no ano passado, e é sempre assim na Venezuela desde o governo de Hugo Chavez. Em nosso país, a interferência de Trump ocorreu sob aplausos dos próprios governantes brasileiros, seus ardorosos fãs.
Não há ilusão de que Joe Biden traga grandes mudanças na essência política externa norte-americana, mas a mudança do poder nos Estados Unidos será sentida no Brasil de forma positiva – pelo menos se comparado a Trump. O candidato democrata à presidência afirmou recentemente que, caso eleito, sua administração “reunirá o mundo” para pressionar o governo de Jair Bolsonaro a proteger a Floresta Amazônica e, além disso, deve manter distância de grupos nazifascistas e de fundamentalistas religiosos, cujas ideias vicejam nos Estados Unidos e aqui são replicadas. Em todo caso, convém esperar o resultado oficial desta eleição que está sendo a de maior participação civil e a mais apertada dos últimos tempos. Caso a vitória de Joe Biden se confirme, o recado terá sido dado à extrema-direita, que tem Trump como um de seus pilares. A sanha destruidora desse neofascismo do século XXI, com seus preconceitos e sua cruzada anticiência vai sofrer um significativo abalo com a derrota de Trump. É o que esperam as pessoas de todos os continentes que amam a democracia, a liberdade e a paz.