E se fôssemos todos Sergio Moro?

Ao me deparar com um cartaz esmeradamente confeccionado e exposto na Savassi (bairro nobre de Belo Horizonte) afirmando que “Somos todos Sérgio Moro” fiquei a imaginar o que significaria adotar esse estilo de vida (e de justiça).

 Sendo Sérgio Moro, teria que imediatamente me render àquela velha expressão popular que melhor simboliza e nos faz entender a dinâmica adotada pela turma da Lava Jato: “Aos amigos tudo, aos inimigos os rigores da lei”.

Atualmente sou um simples professor. Mas recordo bem da época em que eu era coordenador de curso e dos grandes feitos que eu poderia ter realizado se, já naquela época, tivesse incorporado o espírito do Doutor Moro.

Logo na posse, para mostrar serviço aos meus colegas que me honraram com os seus votos, e imbuído do justo e legítimo sentimento de justiça, teria aplicado à risca a Lei nº 8.112 de 11/12/90 que diz respeito ao regime jurídico dos servidores públicos em geral.

Em especial a parte da lei que trata das proibições do servidor, deveria ter usado o inciso primeiro para ferrar aquele meu desafeto de “ausentar-se do serviço durante o expediente, sem prévia autorização do chefe imediato”.

Como teria sido bom vingar-me daquele petralha! Lembro-me bem do dia em que um aluno não o achou em sua sala e após um tempo descobri que ele estava acompanhando sua esposa numa consulta médica. E isso tudo sem me consultar. Um desaforo!

Poderia tê-lo pego também quando o mequetrefe levou o microscópio da faculdade para sua casa após aquela aula prática de biologia em praça pública, pois de acordo com o inciso II é proibido “retirar, sem prévia anuência da autoridade competente, qualquer documento ou objeto da repartição”.

Fico aqui me remoendo de ódio quando lembro da chance perdida de ter aberto um Processo Administrativo Disciplinar, quando esse meu adversário organizou uma festa surpresa para aquela lambisgoia da professora de fitopatologia que votou contra mim. O inciso V é muito claro ao condenar aquele que promove “manifestação de apreço ou desapreço no recinto da repartição”.

E o que falar do vacilo que eu dei ao deixá-lo escapar de ser enquadrado no inciso XII quando esse vagabundo foi homenageado pelos alunos e recebeu uma linda caneta personalizada de presente. De acordo com a lei, é vedado “receber propina, comissão, presente ou vantagem de qualquer espécie, em razão de suas atribuições”.

E por fim, que chance não aproveitada quando peguei o meliante em flagrante imprimindo um artigo de uma revista que nada tinha a ver com sua matéria na sala dos professores. Era a oportunidade que eu tinha de encaixá-lo no Inciso XVI que criminaliza “utilizar pessoal ou recursos materiais da repartição em serviços ou atividades particulares”.

Enfim, tive a chance de ser um Sérgio Moro quando fui Coordenador de Curso e agora só me resta perseguir algum aluno que está hierarquicamente abaixo de mim. Quem sabe começo por promover a delação premiada para poder desmascarar aquele maconheiro que senta na última fila e que tenho certeza que sempre cola em minhas provas.

E o bom de tudo isso é que nem preciso me preocupar com o principio básico da impessoalidade na Administração Pública, pois como somos todos Sérgio Moro me resguardarei em outra velha lei: “Pau que dá em Chico, não dá em Francisco”.

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