Em defesa do Parlamento

No dia 3 de maio de 1823 ocorreu a sessão solene de Instalação da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil. Tinha início, assim, a existência do Poder Legislativo no nosso país.


Sede do primeiro parlamento brasileiro, no Rio

 

O Legislativo é o mais democrático, transparente e representativo dos Três Poderes brasileiros. É o foro dos grandes debates nacionais, aberto à participação de todos os setores da população. É o mais suscetível às pressões da sociedade, com quem aprende e para quem tem, também, papel educativo democrático.

Por essas características, nosso Legislativo sempre foi vítima dos movimentos autoritários. Poucos meses depois de sua instalação, foi dissolvido, em 12 de novembro de 1823, por ordem do imperador D. Pedro I, justamente quando discutia um tema até hoje de grande atualidade: o projeto de lei sobre a liberdade de imprensa.

Dois dias antes, 10 de novembro, o Plenário da Assembleia começou a discutir o projeto que "trata de liberdade de imprensa". O povo foi admitido no recinto e galerias para acompanhar os debates. Houve tumultos generalizados e a sessão foi suspensa pelo presidente. No dia seguinte, o deputado Antônio Carlos de Andrada e Silva, irmão do Patriarca da Independência e também deputado José Bonifácio, propôs, entre outros assuntos, que a Assembleia se declarasse em sessão permanente, devido à movimentação de tropas na cidade, ameaçando os trabalhos constituintes. Aprovada, a sessão passou para a História como "A Noite da Agonia". Vara a madrugada e, pouco antes das 13 horas do dia 12, a tropa imperial cercou o Parlamento e colocou canhões nas entradas das ruas adjacentes. A Assembleia foi dissolvida e os constituintes, por prudência, retiram-se, sem protesto. Alguns foram presos e desterrados a mando de D. Pedro, dentre eles os irmãos Andrada e Silva.

O Parlamento foi fechado pelo menos 15 vezes. Em novembro de 1891, dois anos após a proclamação da República, o presidente Marechal Deodoro da Fonseca, o fechou, após a votação da Lei de Responsabilidade do Presidente da República. A chamada Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder, também fechou o Parlamento, que foi novamente fechado por Getúlio quando instaurou o Estado Novo, entre 1937 e 1945.

Quando os militares assumiram o Executivo, com o Golpe de 1964, o Congresso não foi dissolvido, mas seus trabalhos foram suspensos algumas vezes, suas prerrogativas diminuídas, muitos parlamentares foram cassados e alguns, inclusive, assassinados. Em 1977, a Ditadura Militar, então comandada pelo general Ernesto Geisel, novamente fechou a Casa, por 15 dias, instituiu o Pacote de Abril e criou o senador biônico, nomeado por um Colégio Eleitoral submisso aos detentores do Poder Executivo.

Mas não foi apenas através de fechamentos e cassações que o autoritarismo cerceou as atividade parlamentares do Brasil. A falta de liberdade de organização e manifestação políticas dos trabalhadores e demais setores da sociedade também refletiram – e muito – na composição da Casa. Não só o Partido Comunista do Brasil, o mais antigo do país ainda em atividade, teve sua existência legal proibida por dezenas de anos, mas também outras siglas que hoje estão no Congresso foram afetadas, como o Partido Socialista Brasileiro, PSB, e o Partido Trabalhista Brasileiro, PTB, cassados pela ditadura militar em 1965.

A história do nosso Parlamento reflete a história da liberdade em nosso país. Não apenas a liberdade partidária, mas a liberdade de manifestação, expressão e organização do nosso povo. Nos períodos em que essa liberdade inexistiu ou foi cerceada, a composição dos legislativos municipais, estaduais e federal foi afetada, majoritariamente elitizada. Nos períodos em que a democracia se expandiu – e estamos vivendo o momento democrático mais longo de nossa história – no Parlamento se fizeram representar as mais variadas ideologias e correntes políticas.

Mas isso não exclui dificuldades ainda existentes. Aí estão as propostas de reforma política que se contrapõem: de um lado, propostas que querem aprofundar a democracia e a lisura dos pleitos, com a liberdade partidária irrestrita e o financiamento público de campanha; de outro lado, propostas que restringem o funcionamento partidário e privilegiam o financiamento privado das campanhas eleitorais, o que beneficia os grandes grupos econômicos e seus representantes.

Portanto, a democracia é uma luta permanente e a defesa do Parlamento uma causa progressista, que interessa ao povo, aos trabalhadores, e incomoda as elites monopolistas, autoritárias.

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