FHC, Alckmin e a vírgula

No português falado e escrito no Brasil – essa língua bela pela complexa sintaxe e cativante sonoridade – a vírgula, sinal gráfico de pontuação usado para uma breve pausa ou para separar frases ou partes de uma frase, tem muitas serventias. Os poetas a us

A vírgula serve para esclarecer – mas também para tergiversar, a depender da honestidade de quem a usa.


 


Conhecida é a historinha do jovem interiorano que foi estudar na capital, mantendo-se com parca mesada. Num determinado mês o dinheiro acabou mais cedo e teve que recorrer ao pai através de um telegrama.


 


– “Despesas aumentaram. Papai, mande dinheiro”


 


O pai, comerciante ranzinza, tomou-se de indignação:


 


– Ora veja, aquele menino está virando um perdulário! E ainda quer me dar ordens. Veja o que escreveu: “Papai mande dinheiro!”


 


A mãe do estudante, compreensiva e bondosa como toda mãe, socorre o filho:


 


– Não é bem isso, querido. Olhe, aqui tem uma vírgula: “Papai, mande dinheiro.”


 


– Ah, bem, se é assim vou mandar algum pra ele, pois bem merece.


 


Fernando Henrique Cardoso deve conhecer essa historinha. Ontem, na Rádio CBN, tentou desmentir declaração dada na mesma emissora no dia anterior, quando do afirmou categoricamente: “Eu não sou contra a privatização da Petrobrás”. É que com isso desmentia completamente a artimanha de Geraldo Alckmin, que nos últimos dias vem renegando (sic) o ideário neoliberal, em meio ao confronto de idéias entre ele e Lula. Entre outras falácias, nega a intenção de privatizar empresas estatais estratégicas (a Petrobrás inclusive) e até acena com a ampliação do funcionalismo público federal – o inverso do que sempre defendeu.


 


A fala de FHC, assim, virou uma trapalhada na campanha de Alckmin, que ele tentou emendar no dia seguinte, afirmando que na frase fatídica tinha uma vírgula: “Eu não, sou contra a privatização da Petrobrás”. Mas quem escuta a gravação da entrevista (http://radioclick.globo.com/cbn/) vê que não cabe de forma alguma a vírgula após o pronome, pois a entonação da voz é francamente afirmativa. O ex-presidente tergiversa – e a emenda terminou pior do que o soneto, como se diz. Pois revelou, uma vez mais, as contraditórias manobras eleitorais do tucanato.


 


Fica a lição. Quando fala um político como FHC, que quando assumiu a presidência da República, em 1995, chegou a pedir que esquecêssemos tudo o que ele escrevera antes, é preciso prestar muita atenção e avaliar o que diz, nega, mas pratica.

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