Fracassa a turnê do chefe do Império

A grande imprensa deu muito destaque à turnê que George Walker Bush fez pelo Oriente Médio. Afinal de contas, foram oito dias percorrendo Isael, Palestina e mais cinco países árabes, todos esses governados por aliados dos americanos. No entanto, apesar de

Um roteiro estratégico



Não há dúvidas que a região do Oriente Médio sempre foi estratégica, seja para qualquer potência mundial. Na época de um mundo bipolar, da guerra fria, tanto EUA como a URSS tinham parceiros e aliados estratégicos na região e sempre mantiveram espécies de “cabeça de ponte” na região. A URSS tinha como aliados fortes o Egito de Nasser e a Síria de Hafez Assad. Mas, as coisas se alteraram. O mundo hoje é unipolar. Ainda assim, os Estados Unidos devem cultivar amigos e aliados estratégicos para a implementação de sua política para a região.



A escolha dos países que foram visitados foi estratégica. Apenas países francamente amigos e a favor dos americanos. Além de Israel, claro, o primeiro a ser visitado, o principal aliado estadunidense na região, Bush visitou as chamadas petro-monarquias, como o Kuwait, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Egito. A turnê iniciou-se no último dia 8 de janeiro e foi concluída na quarta, dia 16. Talvez uma das viagens e estadias mais longas fora dos Estados Unidos, já feitas nos quase oito anos de governo Bush.



A escolha foi estratégica. Há pequenos países, protetorados, espécies de sultanatos, mas são possuidores de gigantescos poços e reservas petrolíferas. A Arábia Saudita é o maior produtor do mundo e o maior exportador de petróleo para os americanos (como sabemos, os EUA produzem no máximo oito milhões de barris/dia de petróleo e necessitam, para mover a sua economia e sua frota de veículos – a maior do planeta – de 20 milhões de barris). Não há a menor sombra de dúvida que a dinastia da família Al Saud, que governa a Arábia Saudita há pelo menos 300 anos, é a maior aliada de Bush. Há interesses comuns entre eles de petróleo. Isso esta amplamente documentado. Bush, desde que foi governador do Texas, sempre foi testa de ferro de companhia petrolíferas.



No entanto, apesar disso, há contradições. Os sauditas são sunitas e discordam da linha xiita, adotada no Iraque e no Irã. No caso do Iraque, os sunitas resistem à ocupação e os xiitas apóiam a ocupação americana. No Líbano há uma inversão, onde temos sunitas apoiando os Estados Unidos e xiitas fazendo oposição ao governo. A tentativa maior de Bush na região foi angariar apoios para a sua campanha diuturna contra o Irã, ao qual chama, o tempo todo, de estado “eixo do mal’ e fomentador do terrorismo em escala mundial.



Como avaliar a visita?



Ao fazermos uma avaliação da visita devemos primeiramente analisar quais seriam seus grandes objetivos estratégicos e depois vermos se eles foram atingidos ou não. Ai teríamos como dizer se houve fracasso ou não na investida territorial americana, ainda que no campo diplomático.



Bush vai chegando ao final de seu mando. Com eleições marcadas para novembro deste ano e posse em janeiro de 2009 do novo presidente, ele vive grandes problemas e sua popularidade vai voltado ao nível do que era antes dos atentados ás torres gêmeas em setembro de 2001, o mais baixo de um presidente americano. Há a crise iminente na sua economia, uma possível recessão, que vem derrubando bolsas de valores de todo o mundo. Houve a chamada crise dos títulos imobiliários e a imensa inadimplência da população, extremamente endividada. Tanto isso é grande que mesmo sendo neoliberais, o governo estuda conceder, doar, dar de graça, incentivos fiscais da ordem de 500 dólares por família para minimizar os sofrimentos e incentivar o consumo.



No entanto o maior problema e seu maior fracasso na verdade, vem sendo a política externa. Há problemas graves na Ásia, quando não se consegue estabilizar um governo no Afeganistão e agora a crise política no Paquistão, fronteira norte da Índia. Mas, seu maior fracasso foi mesmo a ocupação no Iraque, da qual, não há saída honrosa e cujo desastre, além dos gastos que superam a marca de um trilhão de dólares, a morte de mais de quatro mil soldados norte-americanos.



Mas, talvez o mais rotundo fracasso seja a não efetivação da paz na Palestina. A decisão unilateral tomada por Ariel Sharon de desocupar Gaza, desmantelar sete assentamentos judaicos nessa pequena região palestina, mas não mexer na Cisjordânia, sem negociar com os palestinos foi apoiada por Bush e não trouxe a paz, menos ainda o Estado Palestino.



No entanto, apesar de todo o fracasso do ponto de vista de trazer a paz na Palestina, é preciso reconhecer um aspecto positivo, nem tanto pela vontade política do próprio Bush, mas como uma vitória e conquista da luta dos palestinos, que foi, pela primeira vez, quando Bush declara ser favorável abertamente à criação do Estado Palestino. Indicou até o final de novembro, quando vai terminar seu mandato e ocorrem eleições americanas. É provável que os democratas vençam as eleições. Pessoalmente, acho que mudará pouca coisa a política americana no Oriente Médio, pois o lobby judaico é poderoso nos Estados Unidos e duvido que Israel seja abandonado pelo padrinho poderoso, que são os Estados Unidos.



Um segundo objetivo estratégico da visita seria o de criar uma espécie de aliança entre países contra o Irã, considerado hoje o maior inimigo dos Estados Unidos. Bush elevou a sua retórica contra esse país islâmico, mas aqui seu fracasso foi ainda maior. Nenhum país árabe quis se comprometer com essa frente, com essa aliança espúria, pois não há essa percepção generalizada de que o Irã fomenta o terrorismo e de que seu programa nuclear tem fins bélicos como acusa o governo americano. O presidente americano chegou a falar na iminência de um ataque preventivo ao Irã. Um incidente foi até simulado pelos americanos no estreito de Ormutz, quando lanchas da guarda costeira iraniana pediram o afastamento de barcos e navios de guerra estadunidense, que violavam a área marítima do Irã. A versão americana do episódio foi de que foram os iranianos que ameaçaram os americanos. Coitadinhos, com a mais poderosa frota naval do planeta, sentiram-se ameaçados por marinheiros iranianos. Ironia.



Opiniões pessoais



Não tenho dúvidas de que a visita resultou em fracasso da diplomacia americana. No caso da Palestina, apesar do apoio à criação do Estado Palestino, não há detalhes sobre isso, principalmente sobre a questão da demarcação territorial desse estado e sua continuidade entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza. Nada se fala sobre a questão dos milhões de refugiados, da capital em Jerusalém entre outros problemas.



O mais interessante é que Bush agora começa a mencionar os territórios antes da guerra dos Seis Dias de 1967, mas fala em retirar da região da Cisjordânia apenas os assentamentos que ele chama de ilegais. Para a comunidade internacional, qualquer assentamento judaico na Cisjordânia é ilegal, mas para o governo americano e israelense, que são aliados e parceiros, assentamentos ilegais são os criados à revelia do governo, pelos judeus ortodoxos. Ou seja, assentamento autorizado – que são mais de 200 – esses podem e vão por lá continuar o que, na prática, impede qualquer acordo de paz na região.



Por fim, a questão do ataque iminente contra o Irã. Neste aspecto, lemos nos sites e jornais de todo o mundo, que os analistas se dividem entre os que acreditam na iminência de um ataque e aqueles que acreditam ser isso só uma ameaça verbal, para contentar a comunidade interna mais conservadora americana.



Acho que as possibilidades de ataque iminente são reais e não fazem parte apenas de retórica. É sempre bom lembrar que estamos em ano eleitoral e a direita americana esta meio que por baixo e os Estados Unidos sempre foram um país guerreiro, no sentido que quando participam de uma guerra, especialmente com apoio da mídia e dos governo, cresce o chamado patriotismo e a popularidade de qualquer governo, na transcurso da história sempre cresceu com isso. Assim, não descarto um ataque violento, mas pontual, localizado, em alguma usina nuclear, em algum local de processamento de urânio, com o menor número possível de baixas civis e casas de família. Seriam eventualmente ataques a centros militares e estratégicos. Isso poderia ajudar a impulsionar as campanhas dos candidatos republicanos mais conservadores que defendem uma forte presença americana no Oriente Médio. Lembremos que estamos na fase das primárias, onde os eleitores filiados a partidos políticos escolhem previamente os pré-candidatos de seus partidos de forma direta, em urna.



Na questão dos palestinos, há que se destacar também o fato de Bush admitir certa reparação, indenização aos refugiados, mas não menciona a volta, nem sequer de uma parte deles se assim o desejassem. Também tem o aspecto de que pela primeira vez na história, um presidente americano visita os territórios palestinos ocupados. Como em um determinado momento da visita o helicóptero do governo americano não pode transportar o presidente, a solução foi fazer o curto trajeto de alguns quilômetros de carros, com sua comitiva presidencial. Bush sentiu na pele o que significa os chamados checkpoints ou postos de controle. Nessas localidades, comandos de soldados israelenses barram todos os carros, com palestinos e árabes a cada um ou dois quilômetros. Uma humilhação seguida de outra.



Bush critica da mesma forma, com mesma intensidade os dois lados do conflito. Isso é equivocado. É uma relação assimétrica, pois não são contendores de mesma magnitude mas sim de um lado um dos exércitos mais bem treinados do mundo e de outro guerrilheiros palestinos lutando pela libertação de suas terras. Ao tomar essa atitude, de “criticar” ambos os lados, na verdade, como sempre, Bush faz o jogo do governo de Israel, que ele apóia de forma firme e decisiva. A crítica para Israel não é para valer e não tem conseqüência. Na verdade, a crítica dura e contundente é contra o governo palestino e o que ele chama de “terroristas” palestinos.



Não vejo possibilidades reais da criação de um estado Palestino, formal, com soberania e autonomia para decisões em sua área territorial. Com qual capital? Teria um exército ou não? E a ligação por terra entre Cisjordânia e Gaza, como seria feito? E a construção do Muro da Vergonha, vai ser interrompida? E os mais de dez mil presos políticos serão libertados? Sei de todas essas respostas e imagino que Bush tem opiniões sobre todas elas, mas, seguramente, não vai expressá-las assim abertamente. Acompanharemos todos os próximos passos da busca, árdua e difícil, pela paz.



Um Blog que Recomendo



Aos apoiadores da causa palestina, aos que gostam de política internacional, em especial o Oriente Médio e aos que são patriotas, progressistas de todo o mundo, devem ler, de quando em vez, o blog do combativo jornalista, meu amigo antigo de origem libanesa, George Bourdoukan, cujo endereço é http://blogdobourdoukan.blogspot.com/ Divirtam-se.

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