Frente Ampla e Unidade Popular?

Qual a transição em curso? Qual a encruzilhada histórica e o momento decisivo, que não admite erro? Como unir o povo para salvar a Nação?

Foto: Centro de Documentação e Memória/Fundação Maurício Grabois

O povo nos mostra o caminho, e devemos valorizar sua unidade face às eleições de 2022, quando sinaliza claramente pela Unidade Popular e pela Frente Ampla, ainda em 2021.  Sinaliza também quando Bolsonaro, finalmente, cai abaixo dos 20% de intenção de voto. Contudo, muitas vezes não fazemos a leitura correta dos sinais do povo, que tanto tem sofrido, e é generoso com nossos erros recentes. 

Não está decidido ainda o papel que a História reserva a Lula e nem ao Brasil, mas  teremos a chance de o ver e viver. As personalidades são fundamentais para a História, mas há que reconhecer os percalços do incorreto balanceamento da relação líder/massas, que testemunhamos especialmente os(as) comunistas no século XX.  O PCdoB entende disso por força da História centenária que possui. Erramos e acertamos nessa seara, mas tivemos a sorte imensa de ter um líder como João Amazonas, baixinho, cara de povo, paraense, sétimo filho de uma família pobre, pai padeiro, mãe, dona de casa. Quem diria… Essa é a força do povo, e foi isso que ele viu no Lula, e isso mudou tudo. Sua fé no coletivo era muito maior que em si mesmo. Só isso explica como – apesar dos vaticínios do nosso fim à esquerda e à direita – o PCdoB tenha sobrevivido ao longo de tantas provas, mártires, sofrimentos.

Os erros não foram postos sob o tapete, nunca, porque a autocrítica é um tesouro, e não um problema, pois permite corrigir-nos. Registre-se, medo de dificuldades e de inimigo grande, nunca fomos disso. O mesmo Amazonas que liderou rupturas foi o propositor genial da unidade popular, quando era improvável. Perdemo-lo às vésperas da vitória de Lula, mas jamais esquecemos suas lições, seu legado. 

Sem o PCdoB, com certeza, muito da unidade do povo desde a redemocratização não teria havido. Copa, Pan, Olimpíadas, Pré-Sal, Praças Esportivas, Cotas, Prouni, Reuni, Pontos de Cultura, sobrevivência no Congresso, também não. Nós não fomos coadjuvantes nas mudanças do Brasil, sempre miramos longe, e damos nossa vida nas batalhas. 

Registro o valor de três categorias que Amazonas trabalhou, já idoso, em meio às dificuldades excruciantes do final do século XX: transição, encruzilhada histórica, unidade, bandeira da esperança, pois essenciais para sobrevivermos ao próximo período. Qual a transição em curso? Qual a encruzilhada histórica e o momento decisivo, que não admite erro?  Como unir o povo para salvar a Nação? 

O líder e as massas se fundem e enfrentam as encruzilhadas históricas, se há verdadeira vanguarda, capaz de unir e mobilizar milhões, dar a liga que una o nacional, o democrático e o popular, se há sagacidade, sorte, correlação de forças interna e mundial. 

Foto: Centro de Documentação e Memória/Fundação Maurício Grabois

Ou seja, é preciso muita sinergia, ação, força de vontade e consciência para que nossos desejos de democracia, soberania e desenvolvimento sustentável com valorização do trabalho se tornem realidade. A derrota em 2016 nos trouxe aqui. Aonde uma segunda derrota poderá nos levar? De que nos serve o otimismo que desarma e traz soberba? De que nos servem as ilusões com a fidelidade das classes dominantes à democracia, por exemplo?

O líder cumpre papel superior, histórico, quando entende ser ele mesmo mescla de potência e fragilidade. Só assim, um se torna multidão e muda a história, legando à posteridade os frutos desse encontro decisivo. No nosso caso, afirmar a Nação Brasileira como caminho para o Socialismo.

Um paralelo pode ser feito entre a Era Vargas e os governos Lula/Dilma. O que ficou dos 13 anos que governamos o Brasil? Como chegamos até a situação desesperadora que o Brasil vive? Quem disse que não passará nova derrota ou uma vitória imune à guerra híbrida em curso, das imensas forças inimigas da Nação, da Democracia e do Povo? Pelo que me consta, não vencemos o jogo ainda, suas regras, não as definimos. Levamos vários 7×1 seguidos, não haveria Golpe, e houve. Rasgou-se a CLT, morreram centenas de milhares de pessoas. 

Costumo dizer, em 2022, até o voto pode valer. Mas, certamente valerão as milícias, grande parte das FFAA, o pentecostalismo de negócios e o fundamentalismo, a ingerência do mercado do financeiro, o big data, o poder econômico e a influência dos EUA e seu imperialismo genocida. Alerta-nos o site Poder 360: “Em 2020, novos registros de armas junto à Polícia Federal bateram o recorde da série histórica, que começou em 2009. Os dados de janeiro a novembro deste ano  (168.019) já superaram os de todo 2019 (94.064)”.*

E, a despeito de tanta nuvem no horizonte, observamos um ufanismo injustificável, fruto de pesquisas eleitorais que apontam para as possibilidades de Lula em 2022. Ter “furado a bolha” com a participação de Lula num podcast assistido por 295 mil pessoas ao vivo, levou a uma declaração infeliz, às vésperas das definições acerca das federações partidárias: “o PT é o único partido do Brasil”. Poucas coisas podem ser mais estranhas que um partido social democrata tardio e brasileiro, expressar essa ânsia de ser partido único… Sem qualquer propósito, feriu-se gratuitamente quem se deveria atrair. Pior, a federação que se busca construir passa a ser interpretada como adesão, e não como Unidade Popular, que é exatamente o nó górdio para assegurar à Frente Ampla o seu caráter progressista, capaz de abrir amplas avenidas para o poder e à reconstrução nacional. O cheiro acre do hegemonismo foi longe, as ilusões com a democracia burguesa mais uma vez se expressam num grau de ingenuidade impressionante para quem estava “eleito” em 2018, e acabou passando 580 dias na prisão. Quem avisa, amigo é, e nunca faltou a solidariedade do PCdoB nem ao Lula, nem ao PT, desde janeiro de 1989, quando a Classe Operária propôs a Frente Brasil Popular.

Foto: Centro de Documentação e Memória/Fundação Maurício Grabois

Parece que não enterramos mais de 600 mil compatriotas, e que isso não é um fato político, derivado de nossa derrota, em 2016, pacífica e republicana, pois não ia “haver golpe”.  Parece que não sofremos o Golpe de 1964, mesmo com a frase atribuída a Prestes: “Estamos no governo, só nos falta o poder”.  Parece que no Brasil, a democracia é tão forte que o voto é o senhor, e não os diversos fatores que os inimigos têm em suas mãos. Parece que o Fora Bolsonaro deu certo, que vencemos a Deforma Trabalhista e que o movimento sindical está bombando, “tá tudo dominado”. A democracia burguesa no país da escravidão é assim: uma ilha cercada de vetos classistas e imperialistas por todos os lados. Salto alto não constrói unidade, não impede golpe, não protege candidato, nem ganha eleição. E, se ganhar, tem que governar depois da hecatombe que ameaça a continuidade da Nação Brasileira.

Tudo certo, mas nada resolvido. Federação não será jamais adesão, mas pode ser algo mais profundo e duradouro, como Chávez, Mandela, e Arismendy ensinaram, na Venezuela, África do Sul e no Uruguai, com o Polo Patriótico, o Congresso Nacional Africano e a Frente Ampla. Precisamos de mais que um líder, mais que um partido, precisamos de algo ainda muito distante: Frente Ampla e Unidade Popular. Precisamos de uma nova fase, que integre partidos, movimentos sociais, o povo tão sofrido, mas tão potente, criando assim uma solidariedade muito maior que a existente entre nós da esquerda. 

Em parte, essa falta de empatia decorre do papel necessário, mas não cumprido, dos partidos que deveriam ter estado à altura do enfrentamento dos Golpes, em 1964 e em 2016. A não resistência efetiva de quem devia ter liderado é a mãe do desencanto, do desamparo e do nosso legado de divisão. Assim, teremos que decidir se a oportunidade das federações, da Lei Haroldo Lima, servirá ao propósito extremamente nobre de unir patriotas, democratas e a esquerda para salvar o Brasil. Se servir apenas aos interesses de um partido, a derrota nos assombrará como uma maldição que não podemos mais tolerar.

Encruzilhada história e transição diante de nós. Uma quadra ainda mais conturbada, e levando em conta que as pessoas não são eternas. O que deixará, coletivamente, nossa passagem por esta Terra? Cabe pro Lula, cabe para cada um de nós.

Mais que uma federação eleitoral ou resolver nossos deputados(as), precisaremos resgatar o sentido da Frente Brasil Popular em 1989, lançada pelo Partido Comunista; o aprendizado da frustração da Frente Ampla de Goulart/JK/Prestes e Lacerda que, ao final, enterrou a Ditadura, com Tancredo/Sarney. Foi um difícil caminho, que teve de ser palmilhado das diretas até 1988 e que nos legou a Constituição Cidadã, com uma unidade básica que reuniu, à época,  PCB-PCdoB-MR8, a despeito de nossas muitas diferenças, e que soubemos entender e superar. Essa base permitiu os governos Lula e Dilma, mas isso é passado, e o futuro é incerto. Será um acaso estarmos aqui, filhos de Prestes, Amazonas, Arraes, Cláudio Campos, e Lula ter uma nova chance? O que faremos com essa chance e com esses perigos?

Não desaprendamos as lições da história. Amplitude e unidade do povo, nas ruas e nas redes, serão mais que garantia de vitória, serão a nossa única possibilidade de vencer o imperialismo, unindo o país, retomando a economia e as perspectivas do Brasil em perigo. 

Frente Ampla e Unidade Popular, para reverter a destruição de nossa democracia e de nosso país, para retomarmos a vida e o futuro, desviando-nos dos graves perigos e mirando as possibilidades imensas do nosso amado Brasil, esteio para a unidade latino-americana contra o inimigo central, o imperialismo. E, ensinou-nos o Che o cuidado devido, que afasta as ilusões. A luta pela pátria livre é de vida e morte, e ao imperialismo não devemos conceder nem um tantinho assim, nada!

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