Keynes, o Economista da Depressão

John Maynard Keynes (1983-1946) ressurge, na imprensa brasileira, no momento, por escassas e tímidas referências de jornalistas especializados e uma ou outra citação de economistas que freqüentam as colunas dos jornais. A lembrança de Keynes está associad

A suposição de que Keynes exerceu influência nas políticas adotadas durante o New Deal, conjunto de providências coordenadas pela administração de Franklin D.Roosevelt (1982-1945) com o propósito de combater a Grande Depressão dos anos 30, não foi direta, embora reconhecida a relevância das suas recomendações. Na ocasião, Keynes não aprovava totalmente o New Deal primitivo.


 


 


A obra maior de Keynes, The General Theory of Employment, Interest and Money, é de 1936, embora o trabalho do economista não fosse desconhecido, graças à sua extensa colaboração em grandes revistas e publicação de livros que caracterizaram a reconhecida qualidade da sua dedicação acadêmica. Em 1936, a crise global da época se desencadeara há vários anos, e estava distante de oferecer indícios de incipiente recuperação.


 


 


Quem era Keynes e o que o levou a ser conhecido como o maior economista do século 20? Teria ocorrido uma ''revolução Keynesiana'' ? Nada disso. K. não foi socialista, muito menos marxista, ou revolucionário de qualquer natureza. Pelo contrário, manifestou-se crítico severo de Marx e o seu propósito sempre foi o de conservar a essência do capitalismo, a despeito de acreditar que, pelas suas próprias pernas, o capitalismo estaria sujeito a crises permanentes. Joseph Schumpeter observa que, para K., o desenrolar do capital, entregue a si mesmo, culmina em um estado estacionário, ameaçado continuamente pela queda final. Nesse ponto Marx e Keynes estavam de acordo. Divergiam em tudo mais, principalmente em relação à teoria das crises sistêmicas do capital


 


 


 Para R.F.Harrod, o esforço de toda a vida de K. foi compreender o que funciona mal na engrenagem capitalista, o que supõe um grande interesse por esta, e o propósito de continuar preservando-a. Em suma, K. era individualista no seu âmago.


 


 


Keynes, porém, formulou a mais severa critica da economia clássica, sem abandonar os fundamentos do capitalismo. Na GT, p.3, nota 1, caracteriza o seu conceito de Escola Clássica: Os '' economistas clássicos''  foi uma denominação inventada por Marx para referir-se a Ricardo, James Mill e seus predecessores, ou seja, para a teoria que culminou em Ricardo. Acostumei-me, prossegue K, talvez cometendo um solecismo, a incluir na Escola Clássica os continuadores de Ricardo, a saber, aqueles que adotaram e aperfeiçoaram a teoria econômica ricardiana, incluindo, dentre outros, Stuart Mill, Marshall, Edgeworth e o professor Pigou.


 


 


Mais adiante, acrescenta K: '' Pode suceder muito bem que a teoria clássica represente o caminho que nossa economia deveria seguir; porém supor que na realidade o faz é eliminar simploriamente nossas dificuldades. Tal otimismo é causa de que se vejam os economistas como Cândidos, separados deste mundo para cultivar seus jardins, apregoando que tudo se passa no melhor dos mundos possível, sob a condição de que deixemos as coisas em liberdade'' . Duro e definitivo golpe na doutrina do laisser faire, laisser passer et le monde và de lui mêmme.


 


 


Outro postulado dos clássicos é refutado por Keynes na GT. '' Desde os tempos dos clássicos, de Say(J.B.Say, 1767-1832) e Ricardo (David, 1772-1823), os economistas clássicos ensinaram que a oferta cria a sua própria demanda, querendo dizer, dessa forma explícita,  que o total dos custos de produção deve necessariamente gastar-se no seu todo, direta ou indiretamente, comprando produtos'' . Em síntese a Lei de Say, também denominada lei dos mercados, afirma Paul Sweezy, nega que possa ver escassez de demanda em contraste com a produção, ou ainda, toda oferta cria uma procura da mesma magnitude, portanto os mercados são auto-ajustáveis. Este axioma, prossegue Swezzy, constituiu o fio condutor da trama de toda teoria clássica e neoclássica. Para Keynes, os que admitiam esta orientação, não viam obstáculos que pudessem se opor ao pleno emprego,ou seja, a uma utilização máxima da mão-de-obra disponível, diríamos da mais-valia presente no mercado. Keynes, porém, demonstra que a causa do desemprego decorre de que não se gasta imediatamente, ou em curto prazo, a renda corrente em bens de consumo e de inversão, mas em momentos e condições diferentes no tempo e no espaço, desequilibrando por esta e outras condições a harmonia entre oferta e demanda. A enorme discrepância de renda, por sua vez, fomenta a poupança dos muito ricos e a conseqüente queda no consumo. O desenvolvimento destas premissas keynesianas , é um dos nervos da GT, considerada a Magna Carta da economia moderna. As objeções de K. à teoria clássica e neoclássica são aceitas pela maioria dos economistas contemporâneos, grande maioria, podemos afirmar sem titubeios.


 


 


Keynes, no capítulo 24 da GT, no qual as notas finais da filosofia social que decorrem do seu texto maior são explicitadas, refuta a conhecida formulação de que só o crescimento do bolo e a acumulação de rendimentos pelos grandes poupadores (capitalistas, latifundiários, etc.) redundariam em maior distribuição da riqueza para todos. Para ele, este raciocínio é falaz, pois o nosso (de K.) raciocínio leva à conclusão de que, nas condições contemporâneas, o crescimento da riqueza, longe de depender da abstinência dos ricos, como geralmente se supõe, tem mais probabilidade de encontrar nela (abstinência) um empecilho. Fica, nessas condições, eliminada, uma das principais justificações sociais da grande desigualdade de riquezas. K. não descarta a existência de desigualdades de outra natureza, comuns ao capitalismo, nunca, porém, para disparidade tão elevadas como as que existem na atualidade (evidentemente refere-se aos anos trinta quando escreveu a GT). Não é a filosofia social de K. o aspecto que mais nos interessa, mas a maneira como se desvencilha da teoria clássica e a sua percepção dos instrumentos que podem evitar o capitalismo de sucumbir na sua própria rede. Serão estes infalíveis? Afinal Keynes foi batizado como o Economista da Depressão.

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