Manaus: Tragédia anunciada
As urnas do 2º turno se fecharam e foi confirmada a tendência do 1º turno, tanto quanto à pulverização de partidos vencedores, como em relação à reeleição dos Prefeitos de capital.
Publicado 28/10/2008 18:32
Dez diferentes partidos dirigirão as 26 capitais brasileiras, sendo que nenhum deles alcança sequer 25%. E dos 20 prefeitos de capital que disputaram a reeleição nada menos do que 19 (95%) foram reeleitos. Uma maioria de 13 (65%) venceu já no 1º turno; 07 (25%) foram ao 2º turno e se reelegeram índices que oscilou entre 58 a 61%. A exceção ficou por conta do prefeito de Manaus, Serafim Correa (PSB), que foi derrotado por Amazonino Mendes (PTB) por um placar de 57 a 43%. Foi uma tragédia anunciada, especialmente pela direção estadual e municipal do PCdoB que, sistematicamente, demonstrou a eminência desse fiasco.
Tomando como referência apenas as 26 capitais (Brasília não há eleição) não é possível afirmar que há um grande vencedor, embora números estatísticos sempre possam ser interpretados de acordo com as conveniências. Dos 27 partidos existentes no país nada menos do que 10 (37%) elegeram prefeitos em capitais.
PMDB e PT elegeram 12 capitais, seis cada um. O PMDB vai controlar capitais no Centro Oeste, Nordeste, Sudeste, Sul e nenhuma no Norte. O PT fez quase o movimento inverso. Não elegeu ninguém no Sul e no Centro Oeste. Suas seis capitais estão no Norte, Nordeste e Sudeste.
O bloco de direita, outrora todo poderoso, elegeu 05 capitais. PSDB, com 04 capitais distribuídas no Centro Oeste, Nordeste e Sul não tem lá muitas razões para comemorar, assim como seu aliado preferencial PFL, que elegeu apenas uma capital. Mas essa capital é São Paulo e nesse caso o “apenas uma” desequilibra qualquer regra estatística. Tumultua o processo, faz o jogo empatar sem ter começado.
O PSB tinha 04, elegeu 03 capitais no Norte, Nordeste e Sudeste. O PTB elegeu duas capitais do Norte. E o PCdoB passa a figurar entre os Partidos que dirigem capitais, a partir da reeleição de Edivaldo Nogueira em Aracaju. PDT, PV e PP completam o seleto grupo de partidos que obtiveram vitórias em capitais nestas eleições.
Ainda é cedo para definição do novo quadro político. Mas as bases estão postas. A direita terá no governador José Serra seu principal instrumento de disputa eleitoral. A vitória de Aécio Neves em Minas Gerais, porém, pode criar algum empecilho ao roteiro já definido pelo PSDB e PFL para as eleições de 2010.
O campo de sustentação ao governo Lula não tem e nem construiu um nome natural para a sucessão do presidente, embora haja certa abundância de nomes intermediários. E dentro desse campo as forças de esquerda precisam, de uma vez por todas, trabalhar em torno de um projeto unitário com vistas à sucessão do presidente, governadores, senadores e deputados.
No caso particular de Manaus, a vitória de Amazonino – um político ultrapassado e politicamente “cansado” – se deu muito mais em decorrência dos erros da atual administração do que por seus próprios méritos. Se enfrentasse outro candidato no 2º turno a tendência seria a repetição do cenário de 2004, quando ele obteve 43% dos votos e acabou perdendo para Serafim no 2º turno.
Amazonino, como era previsível, explorou a exaustão o fracasso da atual administração, comparou resultados de gestão com ele próprio – reais ou imaginários – e nem precisou explorar temas como a privatização da água em Manaus, que resultou em mais de 500 mil pessoas sem água, embora estejam às margens da maior bacia hidrográfica do mundo. A água foi privatizada por Amazonino em 2001 e confirmada por Serafim em 2006 quando fez a repactuação com a concessionária, embora a empresa não tivesse cumprido qualquer uma das metas definidas no contrato de concessão.
Isso impede que o governo federal repasse recursos público a fundo perdido para resolver o problema, uma vez que a legislação impede o aporte de recursos públicos em empresas privadas. Os recursos que estão sendo utilizados são todos oriundos de empréstimos e serão honrados pela população. Ou seja, o povo se endivida para resolver o problema que a “eficiente” iniciativa privada não deu conta de resolver.
A manutenção da privatização da água quando o contrato previa a denúncia em caso de não cumprimento de metas fez com que Amazonino ficasse a vontade. Sua maior fragilidade, a pauta neoliberal privatista, nem figurou nos programas de TV e muito menos nos raros debates. Nunca foi questionado por Serafim, por exemplo, sobre a privatização do Banco Estadual, do Porto de Manaus e da tentativa de entregar a reserva de gás de Urucu a uma empresa americana falida, cuja ofensiva só não foi materializada porque nós, do PCdoB e do Sindicato dos Petroleiros, conseguimos parar na justiça esse intento.
Sem precisar explicar sua pauta neoliberal, que acaba de ser desmoralizada mundo afora, Amazonino levou o debate para o terreno no qual acreditava levar vantagem: capacidade de gestão, de resultados. O debate de fundo não existiu e Amazonino agradeceu. A tragédia foi tamanha que a privatização da água – 500 mil pessoas sem o líquido, repito – foi apresentada por Amazonino como sendo a solução para o problema da escassez de água. E ficou por isso mesmo.
Mas a dificuldade de Serafim, nesse terreno, ia além da “reprivatização”. Seus principais aliados eram precisamente o PSDB e o PFL (seu vice), que certamente não se sentiriam a vontade vendo suas políticas de fundo serem questionadas publicamente por seu aliado.
E a resultante de tudo isso foi que Amazonino foi ressuscitado. Vai sobrar para o PCdoB a tarefa de enfrentá-lo, como sempre fez, e preparar sua nova derrota. É uma tarefa adicional da qual, honestamente, nós já poderíamos ter nos livrado.